6. Resultados científicos recentes e a seca do ano de 2016
A geração de dados e novos conhecimentos científicos estão acelerando a um ponto que é quase impossível ficar atualizado. Uma oportunidade de saber um pouco dos avanços nas ciências de mudanças climáticas é a reunião da União Geofísica Americana (American Geophysical Union, AGU) que ocorre anualmente em San Francisco, nos EUA. No mês passado, a AGU reuniu mais de 24.000 pesquisadores que apresentaram 23.000 trabalhos durante cinco dias. Mais da metade das seções tinha algo relevante a mudanças climáticas.
Nós participamos de uma sessão sobre eventos climáticos extremos na Amazônia, que teve nove trabalhos apresentados. Aqui fazemos um resumo destes trabalhos e de uma visita à Floresta Estadual Demonstrativa de Boggs Mountain, que sofreu um dos impactos da seca prolongada na Califórnia – um incêndio florestal que queimou mais de mil casas e causou a evacuação de 16.000 pessoas.
Os mais preocupantes dos trabalhos apresentados foram os do Dr. Sassan Saatchi e colegas Liang Xu e Yan Yang. Usando dados de satélites Dr. Saatchi mostrou que as temperaturas das copas das árvores tem subido nos últimos 15 anos na Amazônia ocidental, com picos de temperatura durante as secas de 2005 e 2010. No mesmo tempo a quantidade de água nas copas, ou seja, nas folhas tem baixado. Em um outro estudo deste grupo, medidas feitas por lasers satelitais da altura da floresta na Amazônia ocidental tinha mostraram uma redução de 2004 a 2007, implicando uma redução da biomassa e carbono nas florestas, associada a seca de 2005.
José Marengo, pesquisador do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) de São Paulo, notou que as secas e inundações na Amazônia tem sido com uma frequência mais alta nas últimas duas décadas. George Santos abordou as lições dos últimos desastres para a Defesa Civil na região trinacional de Madre de Dios-Peru, Acre-Brasil e Pando-Bolivia.
Ele apresentou também o poster da vice-governadora Nazareth Araújo que discutiu as implicações de eventos climáticos extremos no desenvolvimento do Acre. Foster Brown fez sugestões de como priorizar meios de adaptação na bacia trinacional do Rio Acre.
Em soma, os trabalhos reforçaram que a) a estresse térmica da região está aumentando nos últimos 15 anos, b) as florestas estão ficando com mais estresse hídrico e perdendo biomassa, c) os eventos extremos estão aumentando em frequencia e severidade, e d) os impactos destes eventos estão afetando o desenvolvimento da região.
As florestas da California estão sofrendo uma das piores secas na história do estado, mas também um ataque de besouros que aumentou a mortalidade das árvores. O fogo tem acompanhado esta seca prolongada. CalFire, uma agência estadual da California, organizou uma visita para conhecermos o impacto do ‘Valley Fire’ que aconteceu no dia 12 de setembro de 2015 perto da cidade de Middletown. Em 12 horas o fogo andou 20 km, destruindo 1200 casas e afetando as florestas.
Na floresta estadual demonstrativa de Boggs Mountain, a mortalidade das árvores foi quase cem porcento, como se pode ver na foto. Andamos na floresta, passando centenas de árvores em pé com copas que atingiam vinte metros ou mais – todas mortas e sem canto de pássaro para quebrar o silêncio. Andamos num cemitério de árvores, pensando em como algo equivalente poderia acontecer no Acre.
Na verdade estamos acumulando condições que podem propiciar um evento deste. Primeiro, as florestas do Acre tem muita biomassa, ou seja, lenha para queimar. O que impede o fogo de alastrar na floresta é a umidade da litera no chão e na madeira. Mas como observamos em 2005 e 2010, uma seca prolongada pode reduzir a umidade suficiente para fogo andar no chão. Com um aumento de temperatura, o processo de secagem, chamada evapotranspiração, acelera. Os dados do Dr. Saatchi e outros indicam que o potencial de secagem está acelerando, algo que alguns amigos seringueiros tem observado nas florestas do Acre nos últimos anos.
Naturalmente, como em 1925-26, 1997-98 e outros anos de El Niño ou de anomalias de temperatura do Oceano Atlântico (2005 e 2010), as temperaturas na região podem se elevarem e secas se prolongarem. A situação atual do El Niño de 2015-16 acoplado com as experiências de 2005 e 2010 leva a preocupação que possamos entrar num período propício para incêndios, seja de pastagens, áreas agrícolas e sistemas agroflorestais, seja de florestas primárias.
Nesta situação, seria prudente analisar o que podemos fazer agora e agir consequentemente nos próximos meses para reduzir os impactos de uma seca intensificada por altas temperaturas. Este ano não podemos controlar o clima, mas podemos pensar em como reduzir as chances da seca levando a incêndios como os que aconteceram em 2005 e 2010.
Ninguém tem bola de cristal para saber com certeza o que será o futuro. Mas isto não impede de nós buscar para meios de reduzir o risco de desastres.
*Foster Brown, pesquisador do Centro de Pesquisa de Woods Hole, Docente do Curso de Mestrado em Ecologia e Manejo de Recursos Naturais (MEMRN) da Universidade Federal do Acre (UFAC). Cientista do Programa de Grande Escala Biosfera Atmosfera na Amazônia (LBA), do INCT SERVAMB e do Grupo de Gestão de Riscos de Desastres do Parque Zoobotânico (PZ) da UFAC. Membro do Consórcio Madre de Dios e da Comissão Estadual de Gestão de Riscos Ambientais do Acre (CEGdRA).
* George Luiz Pereira Santos, Coronel do Corpo de Bombeiros do Acre, Coordenador Municipal de Defesa Civil de Rio Branco, especialista em Defesa Civil.