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Peixes exóticos do Acre tem tudo para ser medalha de ouro nas Olimpíadas

Cadeia produtiva do peixe se firmou no Acre nos últimos 6 anos e agora se prepara para servir o mundo

O Brasil receberá, pela primeira vez na sua história, as Olimpíadas. E enquanto o país se prepara para a organização do maior evento poliesportivo do mundo, o Acre produz para atender a uma missão olímpica única em toda a sua história: oferecer peixe de qualidade para alimentar os atletas. O pedido inicial é de 3,5 mil toneladas, mas se o peixe exótico da Amazônia conquistar medalha de ouro no gosto dos 10.500 esportistas de 205 países participantes nos jogos, o pedido poderá ser de até 15 mil toneladas.

O cardápio dos atletas vai ter atum, salmão, tilápia, mas só os peixes acreanos de água doce, como o pirarucu e o tambaqui, é que vão representar nativamente o Brasil. E a grande expectativa é que se tiver boa aceitação e desempenho no fornecimento de um produto de qualidade para o evento, o peixe poderá ser requisitado em edições posteriores dos jogos olímpicos. Será o peixe do Acre, em qualquer lugar do mundo.

O grande responsável por este desafio olímpico é a Peixes da Amazônia S.A., um empreendimento que partiu da iniciativa público/privado/comunitária, implantado num modelo de políticas governamentais de incentivo à Piscicultura no Estado dos últimos 6 anos. Em outras palavras, trata-se de uma responsabilidade de todas as partes envolvidas na recente, moderna e consolidada cadeia produtiva do peixe no Acre.

No começo, foi difícil acreditar que o peixe poderia transformar a economia de um Estado tão explorado em décadas passadas por pélas de borracha e pastos bovinos. Hoje, o cenário é diferente. A promessa virou realidade. O peixe de água doce conquistou valor na mesa do acreano e mostrou que o Brasil pode ajudar a concretizar a tendência mundial de que, em 2025, o consumo de pescados no mundo será de 20% da carne consumida.

A Peixes da Amazônia S.A. ficou no centro desta ascendência da piscicultura acreana, dando as condições para uma alternativa de produto industrial completa, pensada desde quando o animal é um alevino, até sua criação adequada e a efetiva produção em escala. Hoje, o empreendimento já produz 180 toneladas de peixes regionais por mês, gerando 165 empregos diretos e fomentando a atividade produtiva de centenas de produtores.

O diretor-presidente da empresa, Fábio Vaz, conta que a linha de progresso da Peixes da Amazônia vem com a seta pra cima, conforme as oportunidades de negócio vão batendo à sua porta. “Crescemos de forma conservadora. Muita gente pensa que vivemos de investimentos públicos, mas não. As vendas é que nos alavancam. Por isso, os passos devem ser bem planejados, pois o momento econômico não permite aventuras”.

Outra vertente deste desenvolvimento da empresa é que o abastecimento do mercado interno não pode ser agressivo. O consumidor acreano tem o costume de comprar peixe fresquinho. E essa demanda é atendida pelos produtores que ainda aderem a um modelo manual e histórico de pesca por subsistência, não industrializada. Um segmento que a Peixes da Amazônia não quer macular, por isso, investe para crescer nos congelados.

Fábio conta que o contato para o Acre virar uma opção de fornecedor das Olímpiadas passou por muitos caminhos. O primeiro deles foi pela WWF, com projeto de finan-ciar a produção de pirarucu em lagos. A qualidade do peixe local e a regularidade na entrega também foram determinantes. Compromissos de negócios que ficaram evidentes nos contratos importantes, como o do Grupo Pão de Açúcar, e que pesaram na escolha.

‘Pescando’ novos negócios e oportunidades
Os planos de expansão e negócios futuros da Peixes da Amazônia S.A. não param só pelas Olimpíadas. Fábio conta que muitas oportunidades estão aparecendo. O contrato com o Grupo Pão de Açúcar levou o peixe acreano para o mercado do Sudeste, Centro-Oeste e agora no Sul e em Minas Gerais a linha de varejo tem perspectivas de crescer em supermercados regionais de grande porte.

O estado que mais aderiu o peixe amazônico foi São Paulo. Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Fortaleza, Ceará, Pernambuco e Bahia também confiam no pescado acreano. Esse estopim de exportação para os estados chamou a atenção do Wallmart e Carrefour.

Mas é na linha de distribuição para franquias que a Peixes da Amazônia chega ao país inteiro. E com destaque. No Vivenda do Camarão, inclusive, foi elaborado um cardápio especial de culinária internacional. Adivinha qual é o prato da culinária brasileira? Sim, o peixe exótico da Amazônia. Já há contatos com a Coco Bamboo, Pablo Ruan e, mais recente, a Substância e a Sassá Sushi (um delivery de São Paulo) ficaram interessados.

“Desde setembro para cá, nunca diminuíram os pedidos”, comemora Fábia Vaz. E um destes pedidos pode ser fechado também com uma das maiores franquias no Brasil: o Outback, rede de Steakhouse criada na Flórida/EUA, com a proposta de levar ao mundo a culinária australiana. Fábio conta que a questão do cardápio já teria sido fechada com o Outback, mas ainda falta acertar detalhes quanto ao volume e aos preços.

Das exportações para fora do país, o diretor-presidente Fábio Vaz e o diretor de gestão e finanças, Ricardo Montenegro, contam que a Peixes da Amazônia tem solicitações para o Peru (país fronteiriço com o Acre), onde duas cargas de testes da ração já foram enviadas e aprovadas. Há também cogitações de instalar uma loja de pescados do Acre em Puerto Maldonado. “Estamos também na iminência da primeira exportação de peixe fresco”.

Em Lima, outro grande centro consumidor da América do Sul, fez contatos com tendas de grandes supermercados e deve usar uma estratégia semelhante ao que foi feito no Brasil, usando como âncora para a sua distribuição o forte mercado paulista.

Outro país vizinho, a Bolívia, também tem empreendimentos de olho, com negociações constantes com a Peixes da Amazônia S.A. “As possibilidades são muitas, devido à qualidade do nosso peixe. Mas temos que nos esforçar para fechar um preço atrativo, para chegarmos a um denominador comum”, finalizou Montenegro.

Outra grande expectativa futura da Peixes da Amazônia é criar no empreendimento um segmento da sua produção própria. A proposta seria ter uma grande fazenda de tanques que gerassem no máximo 20% da capacidade de produção da Peixes. Assim, mesmo na época do inverno, quando a margem de ganho tende a ser menor, a produtividade nunca cairia e se voltaria para o mercado externo.

Do quintal de casa para os grandes centros do país: a história do produtor que viu a indústria surgir no Acre

O produtor Sansão de Sena assistiu ano após ano os avanços na área da piscicultura no Acre

Sansão Nogueira de Sena, morador do município de Mâncio Lima, dedicou 18 anos de sua vida à piscicultura. Ao recordar do início dessa jornada, ele destaca as dificuldades em um tempo em que não havia incentivo ao ramo. Faltava de tudo na região.

Indústria era um termo remetido apenas às grandes cidades. Não se falava em produção em massa e organização. Quem tinha vontade e garra apenas fazia as coisas acontecerem com as próprias mãos.

“Quando nós começamos, o nosso Estado não tinha estrutura para essa atividade. A gente fazia as nossas estruturas cavando pequenos tanques com ferramentas manuais como enxadecos e pá, por exemplo. Usávamos a carroça de boi para fazer aterros nas barragens nos pequenos córregos. Tudo era muito mais dificultoso”, recorda.

Ainda assim, criar peixe já era uma atividade muito importante para a parte da população ribeirinha. Por ser um prato típico da região, muitas pessoas começavam a investir timidamente na criação de peixes, mas sem qualquer perspectiva de tornar aquele um negócio rentável. Funcionava mais como uma forma de subsistência.

Os peixes eram criados em pequenos açudes e alimentados com frutas, mandioca e resto de alimentos. Isso, porque não existia ração para peixe no Acre até então. “A gente apanhou muito nessa época. Muitos desistiram, devido às dificuldades. Contudo, sempre tinham aqueles que continuavam acreditando”, relata.

Atualmente, Sansão é presidente da Central de Cooperativas Acre Peixes. Morou a vida inteira na região do Juruá, interior do Acre. Ele reconhece que o mercado exige um produto de qualidade e isso começa desde o alevino (filhote de peixe), seguido de uma boa alimentação para o animal até a água de qualidade onde o produto é mantido.

Aceitação do produto
Sansão comemora a aceitação do produto na feira Apas, em São Paulo, no dia 4 de maio. Trata-se de um evento completo dedicado aos negócios em supermercados. Havia mais de 136 países com representante no local e as três espécies produzidas pela Peixes da Amazônia, pirarucu, pintado e tambaqui, tiveram 100% de aprovação. “É muito bom você ser um produtor e ver como as pessoas estão recebendo esse produto lá”.

O stand Peixes da Amazônia S.A., na Apas, foi um dos mais visitados, afirma Sansão. Para ele, isso dá segurança ao produtor, pois mostra o espaço que ele possui no mercado. “São novos tempos”.

Pelos tanques é onde começa o processo industrial do Frigorífico de Processamento dos peixes


O peixe do Acre para o mundo

A comercialização dos peixes produzidos no Acre durante as Olimpíadas 2016, no Rio de Janeiro, anima a categoria, declara Sansão. Além disso, aumenta a responsabilidade do produtor. “Não podemos deixar faltar peixe”.

As Olimpíadas darão a todos os envolvidos nesse projeto de produção de peixes a oportunidade de mostrar ao mundo a potência que a Amazônia tem para a culinária.

A Central de Cooperativas Acre Peixes, da qual Sansão é presidente, têm seis cooperativas cadastradas, o que condiz a, aproximadamente, 380 cooperados. Existem outras cooperativas que querem se integrar à central, ele aponta. “Alguns produtores, que não fazem parte de cooperativas, negociam diretamente com a Peixes da Amazônia. O projeto é novo, tem apenas seis anos, e daqui para a frente é que ele vai se consolidar”.

Para se manter no mercado é preciso perseverança 

Diretor-presidente da Peixes da Amazônia S.A., Fábio Vaz e o diretor de gestão e finanças, Ricardo Montenegro

Hoje, o pequeno e o médio produtor expandiram os objetivos. O que antes se resumia à criação de peixes apenas para subsistência cresceu para uma visão empresarial. Muitos já buscam se especializar marcando um novo momento para a história de um Estado que até então não conhecia a força da indústria, aponta Sansão.

“Há muitos desafios ainda. Quando partimos para a disputa de mercado, a gente tem que se virar nos trinta para se manter nele. A gente sabe que o país passa por dificuldades, mas, o nosso produto tem diferencial no mercado, isso é um ponto forte. As espécies produzidas são nobres, como o tambaqui, o pirarucu e o pintado”.

Complexo de Piscicultura é a linha que separa o antes e o agora

Sansão afirma que o sucesso dos peixes na feira Apas deu mais segurança aos produtores. (Foto: Rayele Oliveira)

A história contada por Sansão Nogueira mostra o que separava a cadeia produtiva do peixe de décadas atrás com o momento atual: alevinos de qualidade, ração específica para o peixe, o frigorífico para a industrialização de congelados e, sobretudo, a garantia de que a produção seria vendida. O grande empreendimento responsável por preencher esta lacuna de produção foi o Complexo de Piscicultura Peixes da Amazônia S.A.

Com um investimento milionário, o complexo alocou em um mesmo endereço (km 30 da BR-364, perto de Rio Branco) uma fábrica de ração; um centro laboratorial de produção de alevinos (que hoje já produz em torno de 1,2 milhão de alevinos por mês) e um frigorífico de processamento de pescados. Os três componentes supriram as carências e remodelaram a cadeia da piscicultura local, somadas com garantias e incentivos aos produtores.

“Aqui não tinha, por exemplo, alevino de pintado e nem de pirarucu. Isso tudo é muito recente, de seis anos pra cá. Com uma fábrica de ração de qualidade, com centro de produção de alevinos e o frigorífico, a parte da indústria se completou”.

Em outras palavras, o Acre ganhou de uma só vez tudo o que lhe faltava para dar um salto moderado e responsável na cultura da criação de peixes. E, da mesma forma com que um corredor praticamente voa em uma prova sem obstáculos, a cadeia produtiva do peixe atingiu um nível de crescimento jamais visto na história do Estado.

Para Sansão, hoje o foco é voltado à cadeia produtiva, ou seja, aos que estão na beira dos açudes e dos tanques. “O foco está voltado para quem vai produzir, que é para poder trazer o produto, para manter o frigorífico funcionando”, acrescentou.

Assim como outros produtores, Sansão assinou contrato com a Peixes da Amazônia S.A.. Com isso, ele e todos os demais produtores têm a garantia de que terão seus peixes comprados pela empresa. E possuem vantagens no preço da ração e do alevino. O produtor deve seguir as exigências padrão da indústria e é isso que garante a qualidade dos peixes da Amazônia. Toda a atividade é fiscalizada.

Mais de 700 piscicultores estão envolvidos indiretamente com a produção da Peixes da Amazônia S.A. O empreendimento tem 78 fornecedores e gera 165 empregos diretos.

De importador para exportador de ração
O jargão ‘você é o que você come’ nem sempre consegue se aplicar ao homem. Mas, para os peixes, a expressão é certeira. Inicialmente, os produtores acreanos alimentavam seus alevinos e peixes com quaisquer restos de comida e com frutas. Os peixes levavam anos para crescer. Sansão Nogueira recorda que alguns demoravam até 5 anos para atingir a fase adulta. Ainda por cima, ao serem abatidos, tinha uma alta concentração de gordura na sua carne, o que reduzia o aproveitamento comercial.

Era preciso alimentá-los com ração apropriada. Mas Sansão lembra bem que tudo era complicado para os piscicultores acreanos naqueles tempos (mais de 15 anos atrás). Em 2003, os produtores decidiram montar a sua primeira associação. Passaram a articular a logística de comprar a ração de Porto Velho/RO. Além disso, os alevinos (filhotes de peixe) eram adquiridos em Manaus, no Amazonas. Tais planos foram concretizados só anos depois. Hoje, o Acre tem sua própria fábrica de ração. E é dela que eles compram.

“Quando você cria o peixe sem ração, para formar o tambaqui, por exemplo, a demora é de uns cinco anos. Trabalhar com a ração balanceada, própria para aquele peixe, dá um retorno mais rápido, um ano ou oito meses, dependendo da espécie”, explica.

Por ironia, o diretor de gestão e finanças da Peixes da Amazônia, Ricardo Montenegro, adianta que um dos planos futuros é exportar a ração para o estado vizinho, que está interessado na alta qualidade da ração produzida aqui. No próximo Agrishow de Rondônia, inclusive, a Peixes da Amazônia vai fazer um experimento de venda lá.

Novos caminhos
Em 2003 surgiram as primeiras associações de piscicultores e cooperativas. A categoria começou a se organizar para comprar lotes, ração de Porto Velho e alevino de Manaus em conjunto.

“Alevino era uma dificuldade. Aqui não tinha alevino de pintado e nem de pirarucu. Isso tudo é muito recente, de seis anos pra cá”, destaca.

Sansão afirma que “com uma fábrica de ração de qualidade, com centro de produção de alevinos e o frigorífico, a parte da indústria se completou”. Para ele, hoje, o foco é voltado à cadeia produtiva, ou seja, aos que estão na beira dos açudes e dos tanques. “O foco está voltado para quem vai produzir, que é para poder trazer o produto, para manter o frigorífico funcionando”.

Assim como outros produtores, Sansão assinou contrato com a Peixes da Amazônia S.A.. Com isso, ele e todos os demais produtores têm a garantia de que terão os seus peixes comprados pela empresa. Além disso, possuem vantagens no preço da ração e do alevino.

O produtor deve seguir as exigências padrão da indústria e é isso que garante a qualidade dos peixes da Amazônia. Toda a atividade é fiscalizada.

Recentemente, foi assinado um convênio com o Banco do Brasil (BB Convir, Convênio de Integração Rural) no valor de R$ 15 milhões para a cadeia produtiva do peixe. Só que para ser rentável e fazer jus ao convênio, é preciso ter qualidade e retorno na produção. Para tanto, a Peixes da Amazônia S.A. indica o produtor que siga todos os padrões de qualidade à risca. Isso dá ao produtor a garantia de que sua produção vai ser comprada.

Ou seja, o custo de produção é todo financiado pelo banco e a Peixes da Amazônia é quem compra o peixe. No fim das contas, o pequeno produtor não precisa lidar com cifras e números. Tem que se preocupar só em produzir seguindo com qualidade.

 

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