Jean Paul SARTRE (1905-1980) e Michel FOUCAULT (1926-1984) são reconhecidamente os últimos dois pensadores da história da humanidade. Hoje temos bons pesquisadores e estudiosos, mas pensadores mesmo, os últimos foram esses dois. Outro dia parei para ouvir e ver, no vídeo, uma das poucas entrevistas dada pelo SARTRE. Ele que participou da 2ª guerra mundial, diz nessa entrevista que a juventude européia da época, especialmente a da França, INCORPOROU a violência, ou melhor, aceitou no seu espírito, na sua interioridade, o horror advindo daquela guerra.
Sete décadas depois, por tudo que temos presenciado nestes dias, para não dizer nas últimas horas, e por tudo o que já vivemos de mal, neste mundo, notadamente no campo da violência, parece que o mundo atual INCORPOROU duma tal maneira, a violência cotidiana. Incorporou ao seu mundo interior as desgraças exteriores. Assim sendo, morrem as esperanças, das quais falei na virada do ano velho, de que com o alvorecer deste NOVO ano, os homens assumissem atitudes mais civilizadas, no que concerne aos direitos humanos.
O novo ano, nem começou “de fato” e a violência já se apresenta em suas formas mais insidiosas, mais cínicas, num grau de refinamento que provavelmente supera em muito os períodos mais cruéis da história da humanidade. Genocídios e torturas “cientificamente” organizados; perseguições de todos os matizes, depurações raciais e “limpezas étnicas”; êxodo forçado de populações inteiras e grupos sociais indefesos; terrorismo em formas inumanas; segregação e/ou exclusão econômica, racial e religiosa, rebeliões generalizadas nos presídios públicos do País, enfim!
Essa situação calamitosa e esse comportamento individual e coletivo, traduzem nada mais, nada menos, do que o simples e cruel desejo de destruir o outro. O “outro” de Lévinas ou o “ama ao teu próximo como a ti mesmo” de Jesus Cristo, deu lugar ao “EU” violento, violentador e violentado.
O que se pode constatar, é que a violência tornou-se um fato massivo nas sociedades hodiernas, uma situação irreversível, a ponto de constituir um verdadeiro desafio para a consciência moral do nosso tempo. A multiplicação da violência se apresenta como um contra-senso no momento em que nossa compreensão dos fenômenos naturais e sociais está mais aguçada; em que o avanço do saber cientifico e das conquistas da razão atingiram patamares extraordinários; em que a consciência do valor e do respeito à vida pareciam afirmar-se definitivamente de modo indiscutível.
Destarte, o fenômeno da violência sai do campo das teorias das ciências humanas para alcançar e preocupar o humilde cidadão que, de conhecimento, só possui o sensitivo. É clamor para todo lado! Há uma eterna preocupação com os altos índices de violência no lar; no transito; nos campos de futebol; nos plenários legislativos, com seus eternos bate-bocas; nos eventos de entretenimento; na escola e, pasmem, no seio das polícias instituídas para agir em defesa do cidadão. Só a desfaçatez de algumas autoridades pode esconder o desânimo em que estamos afogados. Exemplo crasso disso é a impotência dos governos, com raríssimas exceções, Estaduais e Federal diante dos constantes assassinatos entre policiais e a bandidagem, que já virou rotina.
Se não bastasse ao cidadão o convívio com toda essa brutalidade, tem, além disso, que se moldar à ferocidade: do determinismo legal de certos governos, que vivem a favorecer uns poucos em detrimento de muitos; do partido político demagogo; da lei do mais forte contra o mais fraco; do sistema financeiro que leva o homem a ser explorador do próprio homem; dos arruinados sistemas de saúde, educacional e carcerário.
Confesso mais uma vez, deste espaço, a minha descrença e o meu pessimismo quando o assunto é debelar a violência. Estou no patamar da desilusão, e não estou só: há miríades, dezenas de milhares de brasileiros desiludidos. É uma situação endêmica, um câncer progressivo e degenerativo, que nos afeta a todos. Parece ser um caminho sem volta, diria o próprio Sartre!
Francisco Assis dos Santos, Pesquisador Bibliográfico em Humanidades
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