Recentemente tive um conversa com um colega da UFAC sobre a influência humana nas mudanças climáticas. Ele colocou dúvidas sobre esta influência porque o clima está sempre mundando. Ele tem razão, pois as mudanças climáticas naturais sempre acontecem.
Aliás, os mega El Niños que têm acontecido no passado arrasaram civilizações indígenas na Amazônia e afetaram a história na Europa. Um El Niño forte em 1925-26 deixou a Amazônia com pouquíssima chuva durante um ano. Uma repetição disto agora combinado com fogo oriundo de desmatamento seria um desastre continental.
Mas o meu colega estava querendo dizer que a influência humana não é importante. Gostaria muito de concordar com ele. Afinal meus netos nascidos nos últimos anos teriam a minha idade em torno de 2080 num mundo projetado para ter quase 11 bilhões de pessoas, 3 a 4 bilhões a mais do que temos hoje. Estas pessoas vão precisar alimentação, emprego, energia, segurança, moradia, etc. São desafios enormes e meus netos não precisam do desafio de perturbação do clima. Mas não querer não significa não ter.
O título deste artigo é uma afirmação científica. Na ciência, afirmações precisam de evidências que as apoiam. Para procurar evidências vamos dividir o título em duas partes: (a) se mudanças estão acontecendo e (b) se seres humanos estão envolvidos.
Existem centenas, talvez milhares de artigos documentando não só as mudanças de temperatura e chuvas desde da década 70, mas também os impactos destas mudanças na biosfera. Em termos globais, todos os indicadores mostram uma subida signficativa na temperatura, desde estações meteorológicas na terra firme a medidas na atmosfera via satélites.
A variação de ano a ano da temperatura tem influências do El Niño/La Niña, vulcões, fumaça e radiação solar. Quando essas influências são removidas, o aumento fica mais claro ainda para o periodo de 1978 a 2010, com uma taxa de 0.14 a 0.17 graus C por década. Precisamos lembrar de que a média global de aquecimento incorpora áreas que esquentam mais do que estas taxas, especialmente áreas terrestres no hemisferio norte, e áreas que podem até resfriar.
Em um artigo recente na Revista Science, biólogos encontraram um ou mais estudos que mostram impactos de mudanças climáticas em mais de 80% de 94 processos ecológicos em ecossistemas da Terra. Isso não é uma notícia boa.
Estudos ecológicos como estes são raros na Amazônia, mas existem indicações de que mudanças no clima poderiam ter já impactos ecológicos. No sul da Amazônia, por exemplo, desde 1970 as secas têm sido mais fortes, como as de 2005 e 2010, sendo extremamente severas , inclusive afetando a estrutura das florestas em milhões de hectares na Amazônia Sul-ocidental.
Uma outra fonte de evidências é nas observações de pessoas na Amazônia, especialmente as que vivem nas florestas e utilizam os rios. Em seis workshops sobre mudanças climáticas com comunidades indígenas e rurais desde 2009, antes de falar sobre clima, iniciamos com uma pergunta: alguém notou mudanças no clima?
As respostas foram enfáticas. Todos observaram que o clima tem sido menos previsível; chove quando não deveria e secas ocorrem em períodos não esperados. A maioria considerou que as chuvas, secas e ventos têm sido mais fortes nos últimos anos. Alguns expressaram preocupação sobre o futuro.
Entre acreanos é praxe dizer que antigamente as friagens foram bem mais fortes e prolongadas do que hoje em dia. Observações informais de pessoas são sujeitas a modificações com tempo, mas mesmo assim, a unanimidade que encontramos foi surpreendente.
Em suma, as evidências indicam que as mudanças climáticas estão acontecendo no nível global com impacto nos ecossistemas e na Amazônia também. Resta saber se estas mudanças climáticas têm influência humana ou são simplesmente naturais.
Talvez um dos melhores grupos para responder sobre influência humana seria a Sociedade Meteorológica Americana (SMA). Recentemente o novo administrador da Agencia Norte-Americana de Proteção Ambiental disse que ele tem dúvidas sobre o impacto no clima da liberação de gás carbônico (CO2) por atividades humanas. No dia 13 de março, o diretor executivo de SMA, em nome de mais de 13.000 membros em 100 paises, refutou o administrador, dizendo que sim, CO2 é a causa principal das modificações do clima nas últimas décadas e que este CO2 vem principalmente das atividades humanas, usando diversas linhas de evidências.
A conclusão do diretor executivo não é nada nova. As academias nacionais de ciências do Brasil, China, India, Russia, Japão, Alemanha e Estados Unidos, entre outros, fizeram declarações equivalentes em anos anteriores. Argumentos contrários são apresentados por poucos cientistas que mostram fracas evidências, apesar de ganhar destaque na midia.
Não sei se os pronunciamentos de meteorologistas e dos melhores cientistas do mundo vão convencer o meu colega, mas as evidências indicam que precisamos nos preparar para impactos climáticos mais fortes nos próximos anos e décadas ou conviver com as consequências da nossa passividade.
Foster Brown, Pesquisador do Centro de Pesquisa de Woods Hole, Docente do Curso de Mestrado em Ecologia e Manejo de Recursos Naturais (MEMRN) e do Curso de Mestrado em Ciências Florestais (CiFlor) da Universidade Federal do Acre (UFAC). Cientista do Programa de Grande Escala Biosfera Atmosfera na Amazônia (LBA), do INCT SERVAMB e do Grupo de Gestão de Riscos de Desastres do Parque Zoobotânico (PZ) da UFAC. Membro do Consórcio Madre de Dios e da Comissão Estadual de Gestão de Riscos Ambientais do Acre (CEGdRA). fbrown@uol.com.br