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Escola em tempo integral já é uma realidade no Acre

“As pessoas vão nos olhar esperando que dê certo ou que dê errado”, afirma diretora de escola

A diretora da Ejord afirma que apoio dado por egressos que vieram de Pernambuco fez a diferença

Na Escola José Ribamar Batista, localizada no Aeroporto Velho, o ano letivo já foi iniciado. Durante toda esta semana, os alunos receberam o acolhimento passado pela equipe da escola e por seis alunos egressos do sistema de tempo integral, que vieram de Pernambuco para a troca de experiências no Acre.

De acordo com a diretora da Ejorb, Sirlene Luz, o apoio dado pelos egressos de Pernambuco fez a diferença nessa primeira semana. “Eles trabalharam com os meninos como vai ser a vida dentro de uma escola o dia inteiro, além de noções de respeito”.
Sirlene explica que a escola de tempo integral vai intensificar os conhecimentos que os alunos já tinham. “Eles conti-nuam tendo a base nacional comum, que são as treze disciplinas que o ensino médio tinha, mas agora eles passam também a ter a parte diversificada”.
Projeto de vida, estudo orientado, práticas laboratoriais e disciplinas eletivas fazem parte da rotina escolar dos mais de 500 alunos matriculados na Ejorb e nas demais escolas em tempo integral.

“Nessa primeira semana, eles foram acolhidos para que entendam que agora é um formato diferente, mas que se sintam bem e que gostem de estar aqui”, aponta a diretora.
A Ejorb conta com seis turmas de 1º ano e seis turmas de 2º em tempo integral. Os alunos do 3º ano do ensino médio foram remanejados para outras escolas.

A diretora Sirlene Luz revela que a Ejorb foi a primeira das escolas com o novo sistema a bater a meta de matriculados e isso foi surpreendente. As vagas foram preenchidas na semana seguinte ao anúncio da mudança. “Nós achávamos que a escola em tempo integral assustaria os jovens e no nosso caso não foi. Tivemos lista de espera para as duas séries e não conseguimos matricular todos os interessados. Praticamente todas as turmas estão com mais de quarenta alunos e ainda têm mais querendo vir. Isso foi uma surpresa, apesar de saber que a nossa escola já gozava de um respeito muito grande da comunidade pelo trabalho desenvolvido nos últimos anos. No entanto, pensávamos que o fato de ser agora uma escola em tempo integral iria espantar os meninos, mas aconteceu o inverso”.

Uma nova rotina escolar

O clima na escola era de descontração durante a primeira semana do novo sistema

Com violão nas mãos, três alunos cantavam alegremente no horário do intervalo. Uma roda se fechou ao redor deles e outros colegas ajudavam na cantoria. Mais à frente, meninas desenhavam em cartazes e nas demais mesas, adolescentes conversavam alegremente.
O clima de descontração é comum na Ejorb, afirma a diretora. O local sempre foi acolhedor para os alunos. Contudo, agora, é visível que os jovens estão realmente se sentindo em casa, afinal, passam a ter mais tempo ali. “Eles tocam, dançam, cantam, deitam no chão, como se estivessem em casa. Toda hora tem um coraçãozinho, um beijinho para a equipe. É um carinho que sentimos. Eles se veem cuidados e zelados aqui”.

A Ejorb já possuía algumas características de escola em tempo integral, mesmo sem querer. Os próprios alunos faziam dela um ambiente fami-liar nos anos anteriores. Depois das aulas, muitos acabavam ficando pelo local. Além disso, a estrutura, apesar de ainda pequena, é dotada de espaços importantes para as novas atividades.
A dificuldade do novo sistema, segundo Sirlene, está na questão da burocracia. “É muito documento nesse primeiro momento, o planejamento com os professores é mais intenso, pois eles estão aqui o dia todo. É muito cansativo. Desde janeiro a equipe da escola não parou ainda apenas para estar pronta pra eles”.

Sirlene conta ainda que a Ejorb nunca tinha passado por uma reforma desde a sua fundação, em 2004. A estrutura física se manteve preservada por todos esses anos e, somente agora, recebeu um melhoramento para poder comportar o novo sistema de tempo integral para os estudantes.
As salas foram climatizadas e os banheiros passaram por alterações. Foram acrescentados chuveiros e vestiários para os jovens que ficam ali o dia todo. Contudo, a reforma completa ainda não foi concluída.

Nesse novo modelo, os estudantes entram em sala de aula às 7h30. Às 9h10 eles fazem o desjejum. O almoço é servido das 12h às 13h20. Os jovens param para o lanche da tarde às 15h. Já as aulas encerram às 17h. “Nós pensamos em uma escola diferente, portanto as aulas são mescladas. Português, matemática, física, química, biologia e inglês tiveram aumento na carga horária. Mas eles também têm mesclado essas disciplinas com aulas laboratoriais, eletivas, estudo orientado, para não sobrecarregar a cabeça deles. É a realidade deles que tem de ser vista, é o projeto de vida deles que tem de ser trabalhado”.

A diretora sabe que esse é um dos maiores desafios da sua vida profissional. A Ejorb e outras seis escolas são pioneiras no Acre em trazer o modelo de tempo integral. “A palavra que posso usar para definir isso aqui é sobrevivência. Sobrevivência porque precisamos manter o projeto acontecendo. E temos convicção de que vamos fazer isso. É um ano de muitas definições, mas a escola está abraçando inteiramente esse projeto. Vai ser fácil? Não. Se escola integral com crianças já é complicada, imagina com adolescentes”.

Sobre a expectativa dos acreanos em relação ao projeto, ela entende que essa será a mais importante chance de mostrar que o novo modelo é o melhor para os estudantes. “Nós somos vitrine e ser vitrine é assustador. As pessoas vão nos olhar esperando que dê certo ou que dê errado. De certa forma é isso. Mas as nossas expectativas são as melhores e estamos acreditando no projeto”.

Com o novo sistema implantado em seis escolas em Rio Branco, os alunos entram às 7h30 e saem às 17h

Jovens sonham com futuro promissor

Alunos dizem que novo horário de estudo vai ajudar a conquistar os objetivos

A jovem Marcielle Rocha Barbosa, de 15 anos de idade, estuda o 2º ano na Ejorb, mas já tem os olhos lá no futuro. Com planos de se formar em Direito e ser juíza um dia, ela acredita que a experiência em uma escola em tempo integral irá ajudá-la a conquistar seus objetivos.
A jovem revela que permanecer na Ejorb após a mudança do sistema foi uma escolha dela, e não da família. “Minha mãe até queria me tirar, mas eu quis ficar pela oportunidade única”.

Contente com a mudança, Marcielle conta que dessa forma o seu tempo está mais voltado para os estudos. Suas tardes, antes, não rendiam muito. “Eu dormia, ajudava nos afazeres de casa e fazia alguma atividade da escola. A gente estava acostumado com aquela velha rotina de acordar de manhã e só passar meio período na escola e depois ir para casa. Agora temos mais tempo na escola, para adquirir conhecimento, habilidades e capacidade. Essa é uma oportunidade que nem todo aluno tem”.

Ismael Vítor Alves da Mota, 16, também está no 2º ano na Ejorb. Após a primeira semana de acolhimento, afirma ter feito a escolha certa em estudar ali. Como aluno, ele aproveita a nova carga horária da escola para se preparar para o Enem. “Desde os 10 anos de idade eu já sabia o que queria ser. Quero ser advogado ou promotor de Justiça. Eu gosto de debater e falar sobre as leis. Gosto de ajudar as pessoas”.

Após a primeira semana de experiência com o novo sistema, Ismael afirma estar sendo preparado para a vida. “Os estudantes de Pernambuco estiveram aqui para nos ajudar. Eles já estudaram em uma escola como essa e nos falaram dos quatro pilares da escola em tempo integral que é: ser, conviver, aprender e conhecer. Falamos sobre projeto de vida e nossos sonhos”.

Para que o projeto dê certo é preciso, principalmente, que todos os alunos mantenham o respeito uns com os outros, afinal, eles irão passar, ao longo do ano, várias horas ao lado dos colegas da escola. “Eu me sinto muito privilegiado. A Ejorb manteve todos os antigos alunos e professores. Mesmo antes do sistema em tempo integral, todos aqui viviam em comunhão. Todos se conheciam e todo mundo conversava. É uma escola onde você não vê discriminação. Aqui todo mundo é irmão, unido”.

De Pernambuco ao Acre

Dustan aponta que escola em tempo integral mudou sua vida

A primeira semana de acolhimento na Ejorb, uma das sete escolas que passaram a adotar o tempo integral este ano, contou com a colaboração de seis egressos do sistema vindos de Pernambuco.
Esses jovens trouxeram ao Acre um pouco da experiência que tiveram nos anos que estudaram por tempo integral. O intercâmbio de conhecimento motivou os alunos durante os primeiros dias do ano letivo.

Por meio do Instituto de Co-responsabilidade pela Educação (ICE), responsável por ditar a metodologia da escola em tempo integral, o professor de Educação Física Dustan Luiz, 24, que é um jovem protagonista e egresso desse projeto, veio ao Acre propagar conhecimentos.

Estudante da primeira escola a adotar o sistema em Belo Jardim, no Agreste de Pernambuco, em 2007, Dustan fala sobre o receio da sociedade em aceitar o projeto. “Eu fiz parte da primeira escola da minha cidade e tinha todo esse preconceito da sociedade, esse medo da mudança”.

Hoje, quando olha para o passado, Dustan entende o quanto seus passos foram guiados pelas experiências que adquiriu na escola. “Eu era um garoto que não queria saber de estudos, sem perspectiva. Só queria estar na rua jogando bola. Minha mãe me obrigou a estudar nessa escola. A escola em tempo integral mudou a minha vida e o que sou. Hoje fico me perguntando se minha mãe não tivesse acreditado nesse projeto”.

Procura por vagas ainda não acabou

A diretora da Ejorb, Sirlene Luz, explica que as vagas foram preenchidas em menos de uma semana após abertas. A região conta com muitos jovens e, surpreendentemente, boa parte se interessou pelo novo sistema, ainda que não conhecesse.
Passado o período de matrículas, ainda têm muitos pais e jovens em busca de vaga na Ejorb. Nesses casos, a diretora indica uma das outras sete escolas em tempo integral, em Rio Branco.

O recepcionista Ademison Silva, 35, é um dos pais que está enfrentando dificuldades para conseguir matricular o filho Talisson Vieira, de 15 anos. “Ele optou por essa escola, mas no momento não está tendo vagas. Nessa próxima semana podem surgir. A diretora disse que deve informar no mural. Nós estamos com expectativa aqui”.

Ademison afirma apoiar a decisão do filho em estudar em uma escola em tempo integral. “Nessa escola o aluno vai se acostumando com a rotina de trabalho. O jovem estudando e fazendo atividades de manhã e de tarde, ele já vai tendo uma noção do que vai querer no futuro”.
O jovem Talisson Vieira não se deixou abater pela notícia da falta da vagas. Ele acredita que vai conseguir ser aluno na Escola José Ribamar Batista. “Eu estudo de manhã e à tarde não tenho nada para fazer. Por isso, eu prefiro ficar o dia inteiro na escola estudando. Depois do ensino médio eu penso em me formar em Engenharia Civil e aqui acho que terei mais preparo”.

A Gazeta do Acre: