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O amor no século XXI

O relacionamento entre as pessoas, sob o prisma amoroso, torna-se cada dia mais frágil neste século XXI. A dinâmica capitalista intensifica a sujeição dos indivíduos aos meios midiáticos, tais como e-mails, WhatsApp, SMS, Facebook, dentre outros. Vive-se no tempo que os sociólogos chamam de amor líquido, considerando que as relações de afetividade, hoje, são facilmente descartáveis. Assim, o verso do poeta brasileiro Vinícius de Moraes, “Que seja eterno enquanto dure”, encaixa-se perfeitamente ao que se vive neste século XXI.

Hoje o amor banalizou-se, isso porque as pessoas amam tudo. Amam os livros, as comidas, as letras, os textos, os cachorros, os gatos, o céu estrelado, o sol brilhante, a chuva, o presente que se ganha, os cabelos escovados, as unhas quando estão crescidas. Ama-se o corpo, caso ele esteja nos padrões da moda, ama-se os feriados, a praia, o mar, as montanhas, os rios e córregos, a cerveja bem gelada, o vinho tinto, a roupa que a pessoa usa no final de semana, enfim, ama-se quase tudo que agrada no momento.

Neste século XXI, fala-se em amor com grande facilidade. Banaliza-se a palavra. Esfriou o sentimento outrora sublimado. Tudo agora é passível de amar. E pronunciam-se os fonemas sem medo de reação. Afinal, ama-se até seres inanimados: o telefone, as músicas, o tapete da sala, o carro novo, o sapato da moda. Ama-se a cor da pele, dos olhos, dos cabelos. Ama-se um filme, uma reportagem, um programa de TV. Ama-se até o apresentador desse programa, o protagonista do filme e o jornalista que escreveu a reportagem.

Ama-se tudo e ama-se muito, exageradamente, enlouquecidamente. Amanhã outras coisas são amadas. Amam-se cheiros, gostos, paladar, atitudes. Mas esquece-se de amar as pessoas. Estão a pronunciar o “eu te amo” com a facilidade do “bom dia”, porque todos sabem: o amanhã é incerto. Então, sorte de quem ama a moda antiga, daqueles que ainda se apaixonam e esperam o momento mais oportuno – não sem ansiedade ou nervosismo – para dizer que ama. Sorte daqueles que conseguem fugir um pouco da efemeridade do amor do século XXI, dessa capacidade ofensiva de amar tudo e nada ao mesmo tempo; de se declarar a alguém no sábado e morrer de amores por outra pessoa no domingo. Essa é a realidade deste século XXI.

Não se ama mais como antigamente. Não se declara mais amor. É mais importante mostrar que está com o outro do que fazê-lo sentir sua presença. É mais importante nomear aquele relacionamento do que realmente manter uma relação afetiva, amorosa e sincera com o outro. É mais importante ter alguém do que simplesmente ser feliz. Vejo muitos casais de mãos dadas por fachada. Juntos por convenção. Namorados por um “relacionamento sério” no Facebook.

O amor do século XXI é palpável. Ou pelo menos é assim que ele é tratado. Não mais se sente, mas tem-se o amor em mãos, na maior das utopias. Vive-se um amor incrédulo e deixa-se para trás um amor inédito. Substitui-se o “para sempre” por mais uma noite. O mundo se alimenta de um sentimento que nomearam de amor. Mas o Amor já existe e em nada se parece com o que se vive hoje. Deixa-se para trás o beijo na testa, o aperto de mãos, um afago carinhoso, como boa noite, bom dia, boa tarde. Hoje, ama-se pela palavra e não mais pelo coração. As pessoas confundem a felicidade pela alegria.

De tudo que se vive, sabe-se que amar é uma coisa, gostar é outra. Gostar é uma coisa, apreciar é outra. Apreciar é uma coisa, simpatizar é outra. Portanto, é importante gostar e amar as pessoas. Amar uns aos outros para a harmonia no mundo. E mais: revelar amor. Revelar o amor sempre que for verdadeiro, sincero. Não declarar por agrado, por interesse, por aparência, por posição social, econômica, menos, ainda, por impulso. Amar não é brincadeira, é um caso sério. É simples, transparece na gratidão e no olhar. Mas não é vendido no Atacadão de 1,99. Não se encontra nas prateleiras dos supermercados. Não há código de barras. Não há etiquetas. Não se ama pelo valor, mas pelo que não se compra, não se vende e não se rotula.

Finaliza-se a reflexão com fragmentos do poema de Venícius de Moraes, Para Viver um Grande Amor: “Para viver um grande amor, preciso é muita concentração e muito siso, muita seriedade e pouco riso — para viver um grande amor. Para viver um grande amor, mister é ser um homem de uma só mulher; pois ser de muitas, poxa! é de colher… — não tem nenhum valor. Para viver um grande amor, primeiro é preciso sagrar-se cavalheiro e ser de sua dama por inteiro — seja lá como for. Há que fazer do corpo uma morada onde clausure-se a mulher amada e postar-se de fora com uma espada — para viver um grande amor”.

DICAS DE GRAMÁTICA

MENOS ou MENOS, Professora?
– A forma correta de escrita da palavra é menos. A palavra menas está errada, não existe. Sempre que quisermos referir alguém ou alguma coisa em menor número, em menor quantidade, numa posição inferior, devemos utilizar a palavra menos. É uma palavra uniforme e invariável, ou seja, não há flexão da mesma em gênero (masculino e feminino) e em número (singular e plural). É correto dizer: menos pão, menos livros, menos água, menos cadeiras, o menos, a menos.

Luísa Galvão Lessa Karlberg – É Pós-Doutora em Lexicologia e Lexicografia pela Université de Montreal, Canadá; Doutora em Língua Portuguesa pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ; Presidente da Academia Acreana de Letras; Membro da Academia Brasileira de Filologia; Membro perene da IWA; Professora aposentada da UFAC; Embaixadora da Poesia pela Casa Casimiro de Abreu; Pesquisadora DCR – CNPq/FAPAC; Poeta, Escritora
Luísa Karlberg lessaluisa@yahoo.com.br

A Gazeta do Acre: