Eu conheci, meio que sem conhecer, a Bruna Borges num desses grupos de apoio às pessoas que sofrem de alguma doença psicossomática. Era minha amiga de Facebook, por assim dizer. Muitas vezes, compartilhávamos as mesmas idéias ou dores em algum desses lugares. Sinto muito em dizer, mas talvez nem me lembrasse de Bruna até ela fazer o que fez. Isso me machuca de forma profunda porque acredito que não pude ajudá-la.
Casos de suicídio me doem, basicamente, porque eu sei o que é viver um período depressivo. Dói porque vi minha mãe chorar por causa disso e, hoje, me dói porque não foi apenas Bruna, mas também aqueles que lhe deram a vida que se foram. Aliás, minha mãe, que em sua sabedoria empírica me ensinou várias coisas, acabou de me pedir calma. Desculpa, mãe, não consigo ter calma agora.
Fico cá com meus botões pensando nos motivos: se os pais imaginavam que iam estar juntos agora, em família; se, por quaisquer razões, se sentiram fracassados de algum modo; se não aguentaram a exposição não apenas da própria morte daquela que foi um dia um bebê em seus braços, mas dessa sociedade do espetáculo, que aplaude uma cena de horror.
Acredito que o sangue também esteja nas mãos das pessoas que, copiosamente, pediam para ver o vídeo ou teciam alguma palavra bíblica de julgamento. Interessante como utilizam Deus para justificar dor de modo tão ingênuo. “Ora, tão jovem e bonita, agora está no inferno. É contra as leis de Deus. Que pena!”. “Mas, vejam, se ela se filmou, era porque queria ser vista: vamos cumprir a vontade dela?”. “Só fale comigo se for pra mandar o link do vídeo, ok?”. Julgamentos. Julgamentos. Julgamentos.
Bruna não apenas se suicidou: terminaram de matar a curta história que ela tinha de um modo cruel, aplaudindo uma tragédia como se fosse um filme do Tarantino. Aplausos à morte.
Se vocês, caros, pensam que estão isentos de ver uma pessoa cometer suicídio, ou se acham que são melhores por não terem depressão, ou, ainda mais, se afirmam no direito de pedir para ver tais cenas, sinto-lhes informar: vocês têm uma culpa no cartório imensa. Não, o sangue não escorre nas mãos de vocês literalmente, mas a exposição exagerada da situação gerou algo muito maior. Façam um favor: sentem e orem, cada um em sua crença. Peçam pela Bruna, peçam pelos seus pais, mas, principalmente, peçam por vocês.
Anne Nascimento é jornalista.
E-mail: annemnascimento@gmail.com