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Acre, a alternativa certa para concursos públicos

 

Lei estadual torna obrigatório a inclusão de questões de conhecimentos regionais do Estado na realização de concurso público local. (Arte: A GAZETA)

Diante da prova de um concurso público, todo mundo sabe que uma alternativa, apenas uma, poder fazer toda a diferença. Pode definir o sucesso ou o fracasso do seu rendimento. E cada acerto é um passo a mais na dianteira de inúmeros concorrentes. Se a questão do concurso for sobre o Acre, melhor ainda. Significa mais chances de alguém nascido ou criado no Estado acertar, e mais chances do candidato de outros lugares errarem.

Para nivelar mais as chances em concursos públicos locais entre candidatos acreanos e os de fora, a Assembleia Legislativa do Acre aprovou a Lei Ordinária estadual no 3.283, já sancionada pelo governador Tião Viana em 18 de agosto de 2017. Tal lei “torna obrigatória a inclusão de questões de conhecimentos regionais do Estado na realização de concurso público”, sendo estas questões de “conhecimentos específicos da realidade étnica, social, geográfica, cultural, política e econômica”, estabelecidas à sua quantidade a critério da comissão organizadora do certame, mas observando a proporcionalidade entre elas (Art.1).

Na sequência, o Art. 2 da lei estadual deixa bem clara a penalidade para o concurso público em desacordo com ela: “Será nula a etapa do concurso ou o concurso que contrariar qualquer dispositivo constante desta lei, quando insanável a irregularidade” (§ 1o). “Quando sanável a irregularidade constante no edital, a entidade demandante e a entidade realizadora do concurso terão o prazo de setenta e duas horas para publicar as alterações necessárias” (§ 2°).

Autor da lei, o deputado estadual Eber Machado (PSDC) afirma que a grande preocupação por trás da medida foi com o próprio povo do Acre. De acordo com ele, muitos acreanos perdem oportunidades nos concursos públicos da terra por causa da concorrência de concurseiros que vêm de estados maiores e mais ricos. E o pior: ao passo que o Acre não dificulta a vida destes candidatos com questões regionais, a reciprocidade em muitos destes estados não é a mesma. Por isso, o parlamentar se reuniu com grupos de concurseiros e elaborou a lei estadual 3.283.

“Em outros estados existia essa cobrança, da história da sua própria cultura, dos conhecimentos gerais, da sua geografia, o fator econômico e das etnias. Tudo isso sendo cobrado no concurso público. E aqui no nosso Estado não era cobrado. Vimos que essa é uma forma de valorizarmos mais os nossos acreanos, dar uma possibilidade a mais para eles. Muitas pessoas que criticam e me chamam de bairrista. Eu respondo que tenho que defender o povo do meu Estado. Não é justo o nosso Estado realizar concursos e outros, sem qualquer dificuldade para eles, acabarem levando vantagem sobre os nossos jovens”, comentou o deputado.

Deputado Eber Machado (PSDC) diz que a lei não é bairrista, e sim uma medida para colocar os acreanos em pé de igualdade com concurseiros de fora do Estado. (Foto: Acervo Agência Aleac)

A respeito da devida aplicação da lei, para que ela não seja só mais um dispositivo legal vazio, ineficaz, Eber Machado conta que haverá fiscalização da sua parte enquanto parlamentar e também pressão sobre os órgãos competentes para que façam o mesmo. “Essa questão, inclusive, já foi pauta de reunião com o governador. Nós vamos acompanhar de perto. Iremos analisar os editais de cada concurso e se não identificarmos as exigências da Lei entraremos com uma ação”, advertiu Eber Machado.

Cursinhos preparatórios aprovam e já trabalham regionalização nas aulas

As escolas preparatórias do Enem e de concursos da cidade já adotam há algum tempo em sua grade de ensino, de forma complementar, a regionalização. Elas aprovam o dispositivo da lei estadual, e avaliam que tal medida não causará prejuízo à efetividade seletiva de concursos públicos, muito menos irá gerar desigualdade entre os candidatos. O conceito sobre a inclusão de questões sobre o Acre em concursos públicos locais é que isso vai equiparar condições inegavelmente existentes entre os sistemas de ensino do Acre em relação ao de alguns outros lugares.

“Não afeta. Não vejo um lado negativo nessa questão. Muito pelo contrário. Trata-se de um conhecimento a mais que os concursos locais terão que exigir. É muito importante que esse candidato que vai ser aprovado no certame, que vai se tornar um profissional no Acre, tenha, sim, um conhecimento maior da nossa região. Isso certamente o tornará mais preparado”, comentou o proprietário do Curso Aprovação, Gilberto José Soares Hadad.

Gilberto José Hadad, do Curso Aprovação, destaca que novo dispositivo será bom por ser uma exigência a mais em concursos (Foto: Reprodução Facebook / Página do Curso Aprovação)

Gilberto também analisa que a lei pode reparar um equívoco de muitos concursos públicos em insistir excessivamente, dentre o seu rol de questões, em assuntos e temáticas relacionados à área de Direito. Isso acaba por favorecer mais alunos deste curso, e incentiva jovens a cada vez mais optar por seguir uma carreira na área. “As realizadoras de concursos vão poder substituir algumas questões de Direito, que muitas vezes são até dispensáveis em alguns conteúdos para a profissão da vaga disputada no certame. E vão colocar no seu lugar essas perguntas sobre o Acre, nossa história, geografia, situação política/econômica”, completou Gilberto.

Como exemplo, o proprietário do Aprovação cita o requerimento de sua autoria ao Conselho Universitário da Ufac na qual ele pede um bônus dentre as vagas no curso de Medicina para os estudantes acreanos. Pelo Enem, a concorrência de Medicina na Ufac é sempre a maior para as notas de corte, e a maioria dos aprovados são estudantes de fora do Estado. Com o bônus de vagas, mais acreanos ficariam garantidos de serem aprovados na oferta do referido curso.

Por sua vez, o professor Sidney Dias Oliveira, do Colégio Vencedor, frisa que a lei estadual vai inibir a participação de candidatos de outros estados em concursos daqui. E isso vai ajudar os acreanos, mas não lhe conferindo vantagem, mas sim motivando-os nos estudos para aprofundar seus conhecimentos sobre o Estado. Além disso, para Sidney, tal dispositivo reduzirá as disparidades existentes entre o sistema de ensino do Acre, que recentemente descobriu o modelo integral, por exemplo, com o ensino de grandes cidades pelo país afora já consolidado de décadas na preparação de estudantes para a feitura de concursos públicos.

Professor Sidney “Vencedor” diz que a lei vai inibir a participação de candidatos de outros estados em concursos daqui (Foto: Reprodução Facebook)

 

“O candidato do Acre, quem cresceu aqui a vida inteira e se identifica com à terra, já vai ter uma noção mais ampla sobre as questões de atualidade e de geografia local. Quem vem de fora vai ter que começar do zero, e, ainda assim, vai aprender muito na teoria o que o acreano já sabe de prática. Não vejo isso como prejuízo à igualdade e eficiência em concursos públicos, até porque a maior exigência legal é que ele seja elaborado em português. Quem direciona os conteúdos nele são as realizadoras, com base na área de atuação dos cargos. Portanto, se for condizente com a área, pode tudo. E nada é mais condizente do que saber sobre o Acre, para ocupar uma vaga a ser desempenhada aqui”, comentou o professor Sidney Vencedor.

Tanto o professor Sidney Vencedor, como Gilberto Hadad frisam que ambas as instituições já trabalham com preparativos para questões sobre o Acre nos seus cursinhos. E acreditam que, a partir da vigência desta lei estadual e da maior divulgação e alcance dos efeitos dela nos concursos locais, a demanda dos concurseiros por assuntos ligados ao Acre só tende a crescer.

Um bom incentivo para conhecer melhor a sua terra

A estudante de Direito Clécia Karen destaca a importância e o valor do conhecimento local. (FOTO: CEDIDA)

É consenso entre concurseiros e estudantes que a lei estadual é benéfica, não só para colocá-los em pé de igualdade com os candidatos de fora, como também para garantir que o Acre não perca o protagonismo na preparação de quem pretende conquistar uma vaga aqui. Afinal de contas, para os acreanos, a norma os incentiva a se aprofundarem mais no conhecimento sobre a sua terra natal. Para quem vem de fora, vai ter que passar pelo bom desafio de saber um pouco mais sobre as terras de Galvez e Chico Mendes.

A estudante de Direito Clécia Karen Fonseca partilha dessa opinião. Para ela, o foco da lei 3.283 foi muito acertado ao instigar o concurseiro, principalmente os que moram e vivem no Acre, a conhecerem com mais propriedade as especificidades daqui.

“O Acre, é rico em diversidades culturais, fauna, flora e muitas outras características. Todavia, apesar de ter uma história fantástica de lutas e conquistas, muitos que aqui nasceram e residem ignoram essa história. Não dão valor. Nosso Estado possui um grande legado que foi firmado em nosso expressivo e belíssimo hino acreano”, ponderou.

A acadêmica credita esse desprestígio à falta de incentivos nos estudos sobre a realidade local. Por isso, ela destaca que a lei é de extrema importância para mudar este cenário e fazer este gosto pelo Acre servir como um disseminador de nossa cultura.

Clécia Karen reforça, ainda, que a norma trará mais segurança ao concurseiro acreano e que, pelo efeito prático, encontrará seu caminho para não cair no desuso. “Já existem concursos locais que cobram questões voltadas ao Acre, porém, a lei reforçará ainda mais essa temática, sendo algo obrigatório nos editais, e não apenas opcional. Há também quem diga que este tipo de norma não terá sentido prático ou que é criado para agradar uma classe de pessoas. Nesse caso, eu defendo que a lei não foi criada para tão somente agradar concurseiros, mas sim para salientar a importância e o valor do conhecimento local”.

Quem conhece o local onde vive zela melhor por ele

É indiscutível que o cuidado por algum local depende da identidade que você cria nele. Não há lugar como o nosso lar. E ninguém zela melhor por nossa casa do que nós mesmos. Isso não quer dizer que estrangeiros não possam vir e abraçar o Acre como seu novo lar. Muito pelo contrário. Quer dizer apenas que o Acre está pronto para bem acolher todo aquele que tiver a contrapartida de ao menos se esforçar para dessa terra conhecer.

A servidora pública Gilmara Moreira Daniel estudou bastante para fazer os últimos dois concursos públicos das polícias Civil e Militar. Ela conta que, de agosto para cá, desde que a lei aprovada na Aleac passou a vigorar, não houve nenhum concurso estadual. Há a previsão dela inserida no concurso público do Corpo de Bombeiros do Acre.

“Espero que a história do Estado seja cobrada nos concursos, perante a Lei, e que faça com que os concurseiros acreanos conheçam mais da própria história. Não desmerecendo os concurseiros de outros estados, que muitas vezes ocupam vagas bem posicionadas, mas é notório que quando se é um acreano concursado tem-se um desejo maior de ver o Estado crescer, com menos violência, com uma educação e saúde de qualidade. É o desejo de ver o Acre bem”, comentou a servidora pública.

A única lamentação de Gilmara sobre a lei é que ela só abrange concursos estaduais, não se estendendo aos federais.

SGA diz que próximos concursos acreanos adotarão a nova lei

O responsável pelo setor de recrutamento e seleção da SGA (Secretaria de Gestão Administrativa do Estado), Cleylton Araújo, confirmou que, por estar em vigor, a lei já está catalogada como parte do regramento legal a ser aplicado nos próximos concursos públicos acreanos.

O deparatmento da SGA detalha que toda legislação estadual relativa aos concursos públicos estaduais são encaminhadas à empresa organizadora de concursos, que se compromete mediante termo contratual a cumprir e obedecer ao estabelecido nos diplomas legais, sob pena de ser submetida às penalidades previstas ou ter o referido contrato cancelado.

Até o momento, no entanto, a secretaria reitera a informação da concurseira Gilmara Moreira, de que nenhum concurso público foi realizado sob a vigência da nova norma.

Sobre impressões acerca da lei, Cleylton Araújo pondera que todo e qualquer servidor, seja acreano ou de outro Estado, passa, necessariamente, a ter que buscar conhecimentos sobre a realidade étnica, social, geográfica, cultural, política e econômica do Acre.

Gilmara Moreira reforça benefícios da norma estadual, e frisa que ela seria melhor ainda se abrangessa concursos federais com vagas para o Acre. (FOTO: CEDIDA)

 

 

 

 

 

 

 

A Gazeta do Acre: