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À moda antiga

“É difícil viver em um mundo onde podemos ser muitas coisas, mas às vezes não queremos ser nada”

 

Escrever este tipo de texto saudosista me deixa com aquela sensação de que estou ficando velho, talvez até ultrapassado. Mas não tem jeito. Às vezes lembrar do passado é um sentimento tão forte e persistente que não dá pra evitar de falar e pensar nele.
O que irrompe em minhas lembranças agora são dias talvez não mais ‘fáceis’, acho que essa não seria a palavra ideal para a circunstância, mas sim ‘menos complicados’. Tempos em que era possível falar e debater abertamente sobre as coisas da vida, fatos, acontecimentos, tabus e contradições do cotidiano com as pessoas dando certo valor às nossas opiniões.
Lembro de um tempo em que nos sentíamos livres para dizer, em alto e bom som, e só por dizer mesmo, que o “céu é bom e o inferno ruim”, sem automaticamente sermos tachados de ‘crente’, ‘fanático’, ‘perseguidor de ateus’, ‘conservador’… anti isso ou pró aquilo.
Uma frase era apenas uma frase, sem maiores sentidos implícitos. Apenas falávamos às coisas diretamente para outras pessoas, sem arrodeios e sem nos preocuparmos com a atenção de inúmeras outras, em um instante que logo se perdia para o próximo mais interessante. Além disso, nossas palavras eram mais nossas do que mundo, e elas não ganhavam uma repercussão de inúmeros comentários, visualizações, curtidas ou compartilhamentos.
Pior é quando usam a menor das besteiras que divagamos para forçadas associações com política. Do tipo “falou no inferno, lá é vermelho, então, é ‘petista’, ´comunista’, ‘lulista”; ou do tipo “frisou o céu em primeiro lugar, o céu é azul, ah, então o cara é ‘’MDBista’, ‘golpista’, ‘contra o Brasil’). Mais tenso ainda é quando jogam para as associações para o campo dos ‘istas’. Algo como: “vish, falou de céu e inferno, é religioso, deve ser ‘homofóbico’; ou, então, deve pensar que Deus é homem, é ‘machista’; por pensar em gênero para Deus, é ‘feminista’; deve pensar em Jesus como um homem branco, é ‘racista’… e por aí seguem infinitas associações.
É difícil viver em um mundo onde podemos ser muitas coisas, mas às vezes não queremos ser nada. Nada mesmo, além de alguém comum, com filosofias clichês e simplórias sobre a vida, sem querer ofender ou apoiar ninguém ou nenhum grupo de pessoas.
Por essas e outras, eu sinto saudades de outrora, quando tudo era inocente, mais direto e privativo. As opiniões, das mais tolas às pesadas, não ganhavam superexposição desnecessária, nem delimitavam o conceito que os outros teriam de você pelo resto da sua vida. E podem me taxar de ‘arcaico’, ‘conservador’ ou ‘antiquado’ por isso. No fim das contas, enquanto esse desabafo não estiver no Face, reduzido em poucos caracteres, eu estou são e salvo.

Fabiano Azevedo: