“Quando morre um policial, a sociedade sente o pesar. Do lado deles, um traficante morrer é comum. Cumpriu seu destino”
Dizem que estamos perdendo a guerra contra o narcotráfico e contra as facções criminosas. Em parte é verdade. E nossa perda não se dá quando as nossas taxas indicadoras da violência sobem, nem quando sofremos ataques e retaliações de criminosos e muito menos quando lidamos com estruturas cada vez mais organizadas de grupos criminosos.
Nada disso é sinônimo de fraqueza do lado da sociedade, mas sim são sinais do fortalecimento do inimigo. E não há nada de errado nisso. Em uma guerra, é natural o lado oponente crescer e tentar ficar mais forte. Isso não significa que o nosso lado não possa se engrandecer também. Não significa que não possamos encontrar os meios de nos unir e ficar maiores ainda.
Se o vilão fosse fácil de vencer, não seria guerra. E não se enganem: estamos, sim, em uma guerra contra o crime.
Mas as verdadeiras perdas desta guerra não residem no inimigo. Mas sim está no nosso lado. Estamos perdendo à medida em que mais é mais crianças e adolescentes perdem seu futuro. Quando deixam o sonho de serem doutores, engenheiros, jogadores de futebol e passam a ser aviãozinhos, trombadinhas, traficantes, ladrões, homicidas.
O tráfico seduz, e muito. Imagine para a cabeça de uma criança ouvir dos pais que ela precisa passar mais de 16 anos estudando, e quando sai da faculdade para o mercado de trabalho ainda vai passar por aperreios, humilhações e salários baixos até conseguir a conquista da estabilidade profissional. Daí, quando ela sai de casa, o traficante do bairro diz que ela vai ganhar por semana aquele salário mínimo que ela precisaria de um mês inteiro de trabalho duro para merecer.
É complicado. Mais ainda é que nossas vítimas são a de todos. Quando morre um policial, um agente, a sociedade sente o pesar. Do lado deles, um traficante morrer é comum. Cumpriu seu destino. Chega até a ser uma “oportunidade que se abre no mercado”.
Diante disso, não podemos aceitar a apatia de que a realidade é assim, e pronto. Precisamos tentar mudar isso. Melhor: não podemos desistir de tentar mudar isso. Porque uma coisa é certa: em uma guerra, não há espaço para o lado que entrega os pontos.
* Tiago Martinello é jornalista.
E-mail: sdmartinello@gmail.com