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Após decisão do STF, prisão domiciliar pode ser concedida a 10 detentas que estão grávidas ou lactantes no Acre

Não há dados oficiais a respeito, mas estima-se que um terço da população carcerária feminina (hoje composta de mais de 42 mil mulheres) no Brasil se enquadre na categoria de gestantes ou mães de crianças pequenas. Com isso, é possível que cerca de 14 mil detentas sejam autorizadas a ficar em prisão domiciliar. Esse é o retrato em números da decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), na última terça-feira, 20.

No Acre, a população carcerária é estimada em torno de umas 400 detentas, mas cerca de 100 estão no regime provisório e somente algumas delas poderão ter a prisão em regime fechado convertida em regime domiciliar.

De acordo como o Instituto de Administração Penitenciária do Acre (Iapen-AC), em Rio Branco são 5 grávidas e 2 lactantes. Em Tarauacá há uma grávida e uma lactante e em Cruzeiro do Sul existe uma grávida.

Vale ressaltar que a medida só se aplica às detentas que estejam grávidas ou que sejam mães de crianças de até 12 anos. Além disso, elas precisam estar em prisão provisória (ou seja, que não foram condenadas).

Os juízes de primeira instância terão até 60 dias para colocar isso em prática, que valerá também para mães que tiverem crianças com deficiência.

Não poderão deixar a prisão mulheres já condenadas e que cumprem pena; e também aquelas que, mesmo sem condenação, são suspeitas de crimes praticados com violência ou grave ameaça, contra os próprios filhos ou em situações “excepcionalíssimas”, a serem justificadas pelo magistrado que negar o benefício.

A ouvidoria da Secretaria Estadual de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh) acompanhada dos promotores da área criminal da Defensoria Pública Geral do Estado (DPE) começaram a levantar o número de detentas que poderão ser beneficiadas pela decisão da Suprema Corte, que determinou a substituição da prisão preventiva por domiciliar.

Para que a medida seja aplicada, o diretor-presidente do Iapen-AC, Aberson Carvalho, adiantou que a instituição já aguarda a chegada de mais 200 unidades de tornozeleira eletrônica nos próximos dias para serem direcionadas a essa situação e outras demandas do sistema penitenciário.

“Estamos nos articulando nesse sentido e garantimos que vamos atender à solicitação da justiça e assegurando, sobretudo, a eficiência desse trabalho de monitoramento do qual o Estado se orgulha pelos bons resultados”, enfatiza Carvalho.

Quando uma mulher que tem filho é presa

A mulher não perde a guarda dos filhos ao ser presa, mas essa guarda fica suspensa até o julgamento definitivo do processo, suspensão que persiste se houver condenação à pena superior a dois anos.

Foi o que aconteceu com um rapaz que preferiu não se identificar, mas que falou sobre as consequências de perder o contato com a mãe aos nove anos, após ela ser presa por tráfico de drogas, na tentativa de levar entorpecentes para um antigo namorado.

“Me lembro pouca coisa. Mas, pensando hoje, vejo que a prisão dela foi um divisor de águas na minha vida. Tudo mudou depois disso. Do dia para a noite foi como me sentisse órfão. Fui criado pela minha avó materna. Mas, imagino como minha vida teria sido diferente se ela tivesse ficado em casa”, comentou o rapaz que hoje é operador de máquinas pesadas.

“Tive sorte. Muitas crianças nessa situação vão para abrigos públicos”, ressaltou o rapaz.

Levantamento do CNJ

Levantamento recente do Conselho Nacional de Justiça diz que há no Brasil 622 mulheres presas grávidas ou lactantes. O cadastro foi solicitado pela presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, que afirmou em janeiro que não quer que “nenhum brasileirinho nasça dentro de uma penitenciária. Isso não é condição precária, é de absoluta indignidade”.

O Departamento Penitenciário Nacional tem informações a respeito dos filhos de apenas 9% da população carcerária total do Brasil. Nesse universo, 74% das mulheres detidas até 2016 têm ao menos um filho, de idade não determinada.

Nesse universo, outro fator preocupante é a explosão da população carcerária feminina no Brasil: o número de mulheres presas aumentou quase 600% entre 2000 e 2015. Segundo dados oficiais, 80% delas são as responsáveis principais (ou únicas) pelos cuidados com os filhos.

Prejuízo para crianças

Um dos embasamentos utilizados pelos magistrados foi o impacto da prisão de uma mulher que é chefe de família e, muitas vezes, única responsável pela criação dos filhos.

O impacto da prisão repentina de uma mãe é “devastador” para famílias carentes, explicou em entrevista a pesquisadora da Fiocruz, Maria do Carmo Leal. Ela também é coordenadora de uma pesquisa chamada “Nascer nas Prisões”.

Entre 2011 e 2014, a pesquisa da Fiocruz mapeou detentas gestantes ou mães de bebês pequenos em penitenciárias de 24 estados brasileiros.

“A maioria tem entre 20 e 29 anos, é pretas ou parda, de baixa escolaridade e muita vulnerabilidade social. E 62% delas já tinham de dois a quatro filhos”, apontou os estudos.

“Mais da metade delas não tinha companheiros e um terço se declarou chefe de família. A maioria foi presa por delitos menores, como levar drogas para o marido na cadeia, vender pequenas quantidades da droga ou envolver-se em brigas. É a baixa democracia brasileira: prender mães pobres, (impondo-lhes) um castigo desse tamanho”, concluiu

A população carcerária feminina subiu de 5.601 para 37.380 detentas entre 2000 e 2014, um crescimento de 567% em 15 anos.

“O encarceramento feminino obedece a padrões de criminalidade muito distintos, se comparados aos do público masculino. Enquanto 25% dos crimes pelos quais os homens respondem estão relacionados ao tráfico, para as mulheres essa proporção chega a 68%. Por outro lado, o número de crimes de roubo registrados para homens é três vezes maior do que para mulheres”, diz o texto de uma pesquisa sobre o perfil da população carcerária.

 

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