Uma vida dedicada às causas ambientais. Assim podemos definir a produção científica do pesquisador Irving Foster Brown que, no Acre, converteu-se em um defensor engajado da Amazônia. Tanto que recebeu, no dia 20 de janeiro, das mãos do então procurador-geral de Justiça do Acre, Oswaldo D’Albuquerque, e da procuradora de Justiça Patrícia de Amorim Rêgo o reconhecimento na 1ª edição do ‘MP Atitude – Pequenas ações transformam o mundo’.
Morando no Acre há quase 30 anos, ele foi escolhido na categoria ‘Personalidade’ do prêmio do Ministério Público do Acre, iniciativa que se propõe a reconhecer e valorizar práticas dos cidadãos, empresas e organizações governamentais e não governamentais que, de alguma forma, contribuem para a efetivação da cidadania.
Foster nasceu em Nova Iorque, em 1951, e foi criado na zona rural do norte desse estado americano. Filho de uma professora de inglês e de um professor que se tornara reitor de uma universidade local, formou-se em Ciências Ambientais, na Amherst College de Massachusetts. Tem mestrado e doutorado em Geoquímica na conceituada Northwestern University, pela qual pôde desenvolver seus estudos no campus de Chicago.
Já morou nas ilhas Bermudas, onde pesquisou sobre a qualidade da água, e na França. Sua ligação com o Acre deu-se quando, em 1989, aceitou o convite de amigos ligados à Universidade Federal Fluminense para trabalhar no mapeamento da reserva Chico Mendes. Na passagem pelo estado, recebeu o chamado de professores da Universidade Federal do Acre (Ufac) para colaborar no Parque Zoobotânico da instituição.
Referência hoje na pesquisa, ensino e preservação da biodiversidade, o Parque Zoobotânico da Ufac abriga o Setor de Estudos de Uso da Terra e de Mudanças Globais (Setem), pelo qual Foster ajudou na implementação do Programa de Grande Escala Biosfera-Atmosfera (LBA), um experimento de cooperação internacional que, inicialmente, teve apoio da Nasa, empenhado em investigar a interação atmosfera-biosfera de florestas tropicais e seu papel na mudança climática, bem como, as consequências globais.
O cientista é ligado ao Centro de Pesquisa The Woods Hole Research, organização dos EUA que pesquisa as causas e os efeitos das mudanças climáticas ao redor do mundo. O trabalho de Foster no Acre acontece graças a um convênio celebrado entre esse centro de pesquisa e a Ufac.
Ainda na universidade, Foster colaborou no curso de especialização em Florestas Tropicais, na criação do programa de pós-graduação em Ecologia e Manejo de Recursos Naturais e, atualmente, integra também o corpo docente do mestrado em Ciência Florestal, que começou a funcionar em 2016. Sob sua batuta, passaram várias pessoas que se tornaram profissionais de sucesso, entre os quais alunos do doutorado em ciências florestais tropicais, fruto de um convênio firmado em 2013 entre a Ufac e o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa).
Preocupado com as mudanças climáticas em escala global, o cientista vem trabalhando, ultimamente, com colegas do Peru e Bolívia na iniciativa Madre de Dios, Acre e Pando (MAP), uma proposta com nascedouro em uma reunião das universidades da Amazônia Sul-Ocidental, em 1999, que busca construir estratégias para o cuidado da bacia do Rio Acre, levando em conta o fato de ela ser uma bacia trinacional.
Enquanto membro da Comissão Estadual de Gestão de Riscos Ambientais, instituída pelo governo do Acre, em 2008, Foster foi importante na montagem de estações de radioamador para facilitar a comunicação nas situações de risco ocasionadas pelas enchentes de 2014 e 2015. O interesse por esse tipo de serviço nasceu diante das dificuldades de comunicação entre bombeiros que combatiam os incêndios na seca de 2005, oportunidade em que organizou a sala de situação que monitorava uma das maiores estiagens que o Acre enfrentou.
Jogador de basquete na juventude e, agora, jogador do clube acreano de rúgbi, os Sucuris, o pesquisador é casado com a engenheira ambiental Vera Lúcia Reis. Mesmo declarando-se agnóstico, faz questão de mencionar três pessoas que considera os seus ‘guias espirituais’: padre Heitor Turrini, sacerdote italiano que atuou em Sena Madureira com padre Paolino Baldassari na defesa da floresta; o conterrâneo Lou Gold, que também mora no Acre e é adepto da ayahuasca; e o papa Francisco.
Em suas palestras e nos artigos publicados, Foster não perde a oportunidade para falar da carta encíclica Laudato Si’, subscrita e divulgada pelo papa Francisco em 2015, pela qual faz um apelo para a humanidade cuidar da casa comum: a Terra. Entusiasta do documento, no qual diz enxergar uma base científica, o pesquisador o considera uma luz por abordar de forma integrada o ambiental e o social. “A carta avalia a magnitude do problema que estamos enfrentando e aponta as soluções”, analisa.
Aliás, ‘soluções’, no plural, é o que Foster prefere em suas conversas. A palavra ‘futuro’ não costuma faltar no seu repertório. E o repetido vocábulo ‘esperança’ não é um mero substantivo abstrato nem se confunde com ilusão. A ênfase nessas palavras não acontece a esmo. Segundo o cientista, é preciso redirecionar o rumo da humanidade para não comprometer o futuro. Para tanto, ele cita a informação e a tecnologia como ferramentas que podem ser empregadas no combate ao avanço da destruição da natureza. Seu otimismo deve-se à ideia de que as mudanças culturais podem acontecer com o passar do tempo, a exemplo da eleição de um presidente negro nos EUA, algo impensável há alguns anos.
Como legado que deixa aos jovens cientistas, o pesquisador norte-americano gosta de citar o empenho em estabelecer conexões ambientais globais. Mas faz uma ressalva: “Não precisamos só de pesquisa, mas de ação”. Por isso, costuma dividir em três grupos as visões quanto aos problemas enfrentados pela humanidade, em especial a crise ambiental: os céticos que ignoram a realidade, os desesperados que não mais acreditam em soluções e os que acreditam que se pode implementar soluções. O foco da sua atuação, diz ele, está em ajudar as pessoas dos dois primeiros grupos a migrarem para o terceiro. “Incentivo a agir”, sublinha.
A respeito do Acre, Foster avalia que há mais pessoas que acreditam nas soluções e lembra as várias iniciativas para cuidar do meio ambiente ao longo da história do estado — da luta de Chico Mendes aos recentes avanços em desenvolvimento sustentável. “Só precisamos juntar isso e expandir”, observa. Indagado se sente saudades da terra natal, ao que cientista responde em um tom filosófico: “Somos todos migrantes na Terra”. Sobre a Amazônia, ele franze as sobrancelhas e, com o dedo apontando para cima como uma autoridade que é no assunto, alerta: “Se não aprendermos a cuidar da Amazônia, vamos legar sérios problemas aos nossos filhos e netos”. (Jaidesson Peres / Agência de Notícias do MPAC)