A afirmação é do diretor-geral do Senai, Rafael Lucchesi. Em entrevista, ele analisa os impactos da quarta revolução industrial, aponta quais são as profissões que devem ganhar com as mudanças e fala sobre o novo formato da Olimpíada do Conhecimento, que ocorre em Brasília, de 5 a 8 de julho
Novas tecnologias, como big data, inteligência artificial e internet das coisas vão transformar os negócios e o mercado de trabalho. A tendência é que atividades repetitivas e insalubres sejam realizadas por máquinas. Por outro lado, profissionais que dominem as novas tecnologias e tenham competências socioemocionais – como saber trabalhar em equipe com criatividade e empreededorismo – devem se posicionar melhor no novo mundo que vai mudar completamente.
A avaliação é do diretor-geral do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), Rafael Lucchesi, nesta entrevista à Agência CNI de Notícias. Ele analisa os impactos da quarta revolução industrial, também chamada de Indústria 4.0; aponta quais são as profissões que devem ganhar com as mudanças e fala sobre o novo formato da Olimpíada do Conhecimento, que ocorre em Brasília, de 5 a 8 de julho.
Em sua 10ª edição, o evento vai apresentar como serão as cidades inteligentes, a educação do futuro e como as novas tecnologias podem promover o uso eficiente de recursos, a redução dos impactos ambientais e a melhoria da qualidade de vida das pessoas.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – O mundo passa pela 4ª revolução industrial. Quais são os impactos dessa transformação?
RAFAEL LUCCHESI – Existe um conjunto de novas tecnologias tranformadoras baseado em novas rotas tecnológicas como big data, internet das coisas, produção integrada e conectada, manufatura avançada, indústria aditiva e inteligência artificial. Há 200 anos temos mudanças no paradigma técnico-econômico, mas eram rotas tecnológicas mais simples – máquina a vapor, motor a combustão interno e motor elétrico e, mais tarde, as mudanças baseadas em microeletrônica e telecomunicações. Tínhamos uma ou duas rotas técnicas e agora temos um conjunto mais complexo. Historicamente, essas transformações propiciam mais conforto e qualidade de vida para população.
Há também uma mudança cultural no estilo de vida das pessoas, no emprego e nas relações de produção. Os próximos dez anos vão ter um forte de impacto em definir empresas e atores econômicos que estarão mais bem posicionados. É claro que países com políticas públicas que estão estimulando fortemente esses novos vetores tecnológicos e reconfigurando a economia mundial vão ter empresas mais bem sucedidas e com repercussão sobre seu território.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – E como o Brasil se posiciona nessa questão?
RAFAEL LUCCHESI – Há uma diferença enorme entre os US$ 500 bilhões por ano que os Estados Unidos têm colocado nesses novos fatores de competitividade para o futuro, a partir de uma agenda de políticas públicas, e os cerca de US$ 15 bilhões a US$ 20 bilhões que o Brasil tem posto. Então, o país ainda precisa fazer uma ação forte na agenda de políticas públicas nesse campo.
Além disso, no século XX, as sociedades avançaram com estabilidade macroeconômica, com relações de trabalho que se modernizaram, com infraestrutura que prosperou e impulsinou a economia. Nós não resolvemos essa agenda e estamos encarando um mundo que se transforma velozmente. Por isso, o Brasil tem um duplo desafio: teremos de ser capazes de solucionar os problemas do século XX que deixamos para trás e resolver simultaneamente os problemas da capacidade inovativa. Evidentemente, todo processo de mudança cria janelas de oportunidades que são importantes.
Está se abrindo novamente um novo período de mudança e as sociedades que vão melhor capturar isso são aquelas com estruturas institucionais mais flexíveis. Os emergentes, normalmente, fazem da sua capacidade adaptativa uma vantagem. O mundo será impositivo, o Brasil não será uma bolha no mundo. O país tem oportunidades, depende de como ele vai se movimentar.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Como o mercado de trabalho deve ser afetado?
RAFAEL LUCCHESI – Primeiro, as novas tecnologias vão redefinir muito as novas cadeias de valor. Deve haver uma miríade de novos negócios possíveis, desde uma geladeira que vai gerenciar as compras de reposição do seu consumo doméstico, passando por veículos de condução autônoma, vias inteligentes, assim como uma série de novas possibilidades que as tecnologias vão prover.
Estudos demonstram que 40% das profissões nos Estados Unidos vão sofrer o impacto das novas tecnologias. A tendência é haver menos relações de trabalho permanentes e mais vínculos temporários, que incorporam um pouco padrões culturais que os jovens que entram hoje no mercado de trabalho já buscam voluntariamente. As pessoas vão ter um processo contínuo de aprendizado ao longo de vida. Vão precisar se requalificar permanentemente para adquirir novas competências. É claro que ainda é cedo, prematuro, afirmar o que vai acontecer, mas são tendências que estão se desenhando.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Quais são as profissões que devem ganhar mais relevância?
RAFAEL LUCCHESI – No geral, deve haver uma substituição forte de atividades de competências repetitivas. A tendência é que as novas tecnologias sejam poupadoras desse tipo de trabalho e criem novas oportunidades para interpretação de dados, criticidade de dados, tomada de decisões mais avançadas a partir de inteligência artificial, que vão propiciar novas formas de ocupação.
Então, profissões mais transversais, que dialogam mais com essas tecnologias devem ser profissões mais valorizadas porque atuam em diversas cadeias e atividades econômicas, por exemplo, o técnico de informática para internet, o técnico em tecnologia da informação para hardware e softwares, o técnico em automação, em mecatrônica, em eletrônica, entre outros.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – As competências socioemocionais, ou softskills, já são necessárias no mercado de trabalho hoje. Por que devem ganhar ainda mais importância?
RAFAEL LUCCHESI – De fato, essas competências sempre foram importantes no mercado de trabalho. As empresas reconhecem no SENAI, por exemplo, uma capacidade, há décadas, de trabalhar com seus alunos as competências socioemocionais. É comum que outras atividades econômicas contratem pessoas formadas pelo SENAI e, quando você pergunta o motivo, as empresas dizem que é porque a formação conta com um conjunto de valores, que podemos chamar de ethos, importantes para os trabalhadores serem mais produtivos. Essas competências são ainda mais importantes porque existe um evolução constante da sociedade do conhecimento.
As estruturas empresariais hoje são menos verticalizadas, são mais horizontais e colaborativas. O processo de interação dentro da célula de produção, das empresas e até mesmo com clientes e fornecedores são cada vez mais importantes para ganhos de produtividade, de eficiência e para o processo de aprendizagem, ou seja, para se identificar oportunidades de inovação e de agregação de valor aos produtos. A conexão dessas competências de relacionamento, trabalho colaborativo, criatividade, interpretação de dados, empreendedorismo com competências de formação, associada a um trabalho em time no qual as pessoas colaboram porque estão comprometidas com o resultado reverte-se em inventividade, criatividade e o ambiente positivo cria uma cultura organizacional mais favorável para a geração de riqueza.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Como o jovem que busca uma profissão e o profissional que já está no mercado de trabalho podem se adequar melhor a este momento?
RAFAEL LUCCHESI – Minha mensagem para a juventude brasileira é convergir para esse movimento que ocorre no mundo inteiro. Uma recomendação seria que as pessoas se informem sobre as novas tecnologias e as novas competências exigidas pelo mercado de trabalho. A educação profissional é uma boa alternativa para essa inserção profissional.
As profissões técnicas são bem remuneradas, evoluem ao longo do tempo e vão permitir uma carreira sólida, estável com a possibilidade de prosseguimento dos estudos, por meio de curso superior já com uma profissão definida, seja nas áreas de graduação tecnológica ou nos cursos de Engenharia. Para quem já está no mercado de trabalho, a requalificação é algo importante porque as tecnologias vão estabelecer novos parâmetros de exigência para os profissionais.
Aqueles que dominam as competências vão ter uma chance muito maior de manter seus vínculos. É também uma estratégia importante para quem, eventualmente nesta crise, perdeu o emprego. O caminho mais rápido para a reinserção no mercado de trabalho é estabelecer conexão com o futuro, ter o domínio dessas novas competências porque as chances de reinserção serão muito maiores. Não é à toa que existe uma enorme valorização da educação profissional no mundo.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Por que a educação profissional tem sido mais valorizada?
RAFAEL LUCCHESI – Há uma tendência no mundo de fortalecer os marcos legais com foco no conceito de competências e habilidades, e a educação profissional propicia às pessoas justamente dominar as competências que são afirmadas no mundo do trabalho. Isso ocorre na Alemanha, na Finlândia, na Europa continental, nos países asiáticos, na América do Norte.
Há uma tendência nos sistemas educacionais do mundo de fortalecer a agenda de educação profissional como um modelo de dupla saída do sistemas educacionais, especialmente no ensino médio. O Brasil também está avançando nessa questão. Foi aprovada a nova lei do ensino médio, que inclui a formação técnica e profissional no currículo regular, e tem o papel de convergir o sistema educacional brasileiro para a experiência dos países mais avançados.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Nesta edição, a Olimpíada do Conhecimento vai mostrar como a tecnologia deve impactar a vida nas cidades e a educação. Por que o evento tem esse novo formato?
RAFAEL LUCCHESI – Na edição passada (em 2016), já houve uma grande mudança na Olimpíada do Conhecimento, com provas mais curtas, maior interação com o público e foi um grande sucesso. Estamos intensificando isso neste ano. Pelas características do calendário eleitoral, estamos fazendo um evento de demonstração e debate sobre as novas tecnologias da Indústria 4.0. As cidades inteligentes abrigam empresas, residências e as mudanças tecnológicas interferem na vida cotidiana de todos nós.
Como há uma grande discussão na sociedade, em um ano de eleição presidencial, fizemos algo mais aberto, mais voltado para o debate na sociedade. O Sistema Indústria quer sensibilizar as autoridades para a importância deste novo momento histórico. O Sesi e o Senai vão estar na Olimpíada como parte afirmativa dessas transformações da sociedade, dialogando com os novos vetores tecnológicos.
Há um conjunto de novas tecnologias que irão transformar o mundo e nós queremos estimular esse debate na sociedade para que haja uma melhor compreensão da importância de o Brasil buscar o protagonismo nessa agenda transformadora, baseada em inovação que vai impactar fortemente na geração de riqueza no futuro.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – De que forma a Olimpíada pode inspirar a família que vai visitar o evento?
RAFAEL LUCCHESI – A família e os jovens que visitarem a Olimpíada vão se defrontrar com um mundo que se transforma por meio de um conjunto de novas tecnologias e que, evidentemente, vai impactar no futuro de cada um deles. Os mais bem sucedidos serão aqueles que fizerem um plano de desenvolvimento indidivual que dialogue melhor com esse futuro que virá rápido, intenso e transformador. Se as pessoas estiverem dialogando melhor com essas novas tendências e moverem o domínio das suas competências individuais com as competências que serão requeridas no futuro, elas certamente vão ser mais bem sucedidas.