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Já experimentou acreditar mais em você?

À medida que o tempo passava, uma porção de assuntos ia se acumulando no meu imaginário, mas nenhum deles enraizou e deu frutos. Por isso, tomei liberdade de compartilhar com o ilustre leitor deste nobre jornal uma descoberta pessoal transformadora, pelo menos para mim!
Peço licença para contar meu causo, mas antes gostaria de propor um exercício preparatório. Afinal, você está disposto a embarcar numa aventura. Tome um gole de água, se lhe convier, ou entorne a xícara de café, pois a caminhada até o alto da serra é trabalhosa. Inspire pelo nariz e expire pela boca! Sinta o cheiro da flor (pra dentro) e apague a vela (pra fora). De novo, por favor!
Pronto?
Sem mais delongas, sigamos aos fatos.
Estava eu no Parque Nacional da Serra do Divisor, o lugar mais lindo que já tive o privilégio de conhecer. De repente bateu aquela vontade danada de apreciar o nascer do sol. Meio ambiente, floresta, aventura… “urru!”. Será?
A unidade de conservação fica em Mâncio Lima (AC), o município mais ocidental do Brasil. Lá o dia amanhece por volta das 6h10 e escurece mais tarde também, dando uma leve sensação de ser mais cumprido, de que temos mais tempo de vida.
Não sei se você sabe, mas as horas no mato correm na contramão dos frenéticos ponteiros urbanos. Na floresta, em um único dia, tudo é possível – e se não for, pode-se adiar para o próximo, ninguém vai morrer por isso! Emergência é artigo luxo e sossego, companheiro de viagem.
Pois bem, ocorre que eu não queria ver qualquer nascer do sol. A ideia era reverenciar o rei do Universo no lugar mais deslumbrante possível. Sou ousada, reconheço! Tracei um plano e, para que ele desse certo, precisaria subir a serra até o Mirante – local de observação comunitário construído a 510 metros de altitude. Haja fôlego!
Às quatro da manhã o despertador tocou. Tava frio! O assobio do vento não me encorajava a sair da cama, mas, apesar da preguiça, levantei para os ritos matinais. Degustei um quebra-jejum reforçado, daqueles que todo acreano do pé rachado aprecia: mandioca cozida, tapioca, ovo caipira, banana frita e mingau.
Alguns minutinhos de barco depois e lá estávamos, subindo a serra, afoitos. Nos primeiros dez minutos de caminhada, já me sentia ofegante. O frio deu espaço ao calor, gerado pelo sangue quente que corria nas veias. O organismo retribuía com doses de adrenalina.
O percurso até o mirante é muito íngreme. Nossa Senhora! Um quilômetro de floresta densa, escura e subidas infindáveis. A última ladeira é ainda mais cruel: extensa e inclinada. Foram longos 40 minutos de caminhada. Por uns instantes achei que não fosse conseguir. O guia, vendo meu desespero e persistência, deu-me a mão e ajudou na subida.
Ao me deparar com o posto de observação, agradeci a Deus e caí no chão de cansaço. Mas não havia tempo para descanso, o dia já clareava anunciando o espetáculo solar. E foi exatamente isso que vi: um show de cores em tons de vermelho, amarelo, laranja e tantas outras que sou incapaz de descrever. Lembrei Adriana Calcanhotto: “Eu ando pelo mundo prestando atenção em cores que não sei o nome. Cores de Almodóvar, Cores de Frida Kahlo. Cores!”.
De repente, em meio àquela pintura celeste, ele surge radiante, imponente, majestoso, deixando o desgaste físico no véu do esquecimento. Nada mais importava, pois nossos corpos quentes vibravam hipnotizados.
Tente imaginar a cena: o sol se abrindo entre a floresta, iluminando e nos aquecendo completamente. As sombras dando espaço à luz. O despertar dos pássaros. O canto. A vida se ressignificando naquele momento.
Fiquei inerte por alguns instantes, com os olhos vidrados numa bola de fogo que aos poucos se posicionava sob nossas cabeças. Como algo tão comum poderia ser ao mesmo tempo extraordinário? Enquanto sorria feito uma criança, o espírito vibrava na frequência cósmica da gratidão.
Renovada, entendi o recado e fotografei a cena na memória da alma, garantindo um clique no acervo do coração para lembrar que é assim que a vida é. Bem disse Cora Coralina: “Mesmo quando tudo parece desabar, cabe a mim decidir entre rir ou chorar, ir ou ficar, desistir ou lutar; porque descobri, no caminho incerto da vida, que o mais importante é o decidir.”
Eu podia ter desistido no meio caminho, mas insisti em ver o sol nascer. Já experimentou acreditar mais em você? Tente! Você não faz ideia do que é capaz!

 

Maria Meirelles é
jornalista e feminista

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