Meu amigo Mário Lima é muito, muito inteligente.
E a inteligência é algo admirável. Como ficar indiferente diante da cognição apurada de um semelhante que tem toda a clareza num espaço onde, tantas vezes, a gente tropeça?
De modo que o menino Mário, agora um senhor, era o melhor aluno da sala. Sobretudo em matemática. Contou-me, e eu acredito porque o conheço, que fazias as provas rindo, não sentia dificuldade alguma. Até que na adolescência… Sobreveio a vaidade.
Porque humildade é atributo que está longe de combinar com a juventude. Então meu amigo, percebendo seu desempenho bem superior ao dos colegas, tornou-se arrogante. De rapaz tímido que era, passou a esnobar a galera. Acintosamente. E se achou também no direito de cometer infrações à disciplina, como se o seu boletim – uma bela coleção de notas dez – lhe garantisse um salvo-conduto em caso de desobediência às normas da escola.
Os professores foram atentando para os excessos do rapaz. O coordenador também. E o diretor também. E daqui pra frente quem me narrou a história foi o próprio diretor, que mais tarde se tornou amigo do Mário.
“Silêncio sepulcral na sala de aula. A classe parecia chocada diante do que a avaliação pedia”
Contou-me que, a certa altura dos fatos, cansado da impertinência do aluno, chamou o professor de matemática e expôs o seu plano:
– Quero que você faça uma prova bem difícil. O mais difícil que conseguir. Precisamos dar uma lição nesse moço, mostrar-lhe que as coisas não são bem assim. Quem ele pensa que é para ter esse comportamento insolente?
O professor concordou e se lançou à missão, pesquisou na literatura específica, trocou ideias com colegas, trabalhou com afinco nas questões e enfim elaborou a tal prova dificílima, encomendada para baixar a bola do Mário Lima.
Aplicou. Silêncio sepulcral na sala de aula. A classe parecia chocada diante do que a avaliação pedia. Mário estava absorto e escrevia com lentidão.
No dia seguinte, o diretor perguntou ao professor sobre a prova.
– Corrigiu?
– Corrigi.
– E aí? Ele conseguiu tirar dez?
– Não.
– Ah, muito bem! Agora ele aprende. Quanto tirou?
– Nove e meio.
Onides Bonaccorsi Queiroz é jornalista, escritora e autora do blog verbodeligacao.wordpress.com
E-mail: onides.queiroz@gmail.com