Um estudo feito pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público Estadual do Acre (MP/AC), aponta que os 166 criminosos presos durante a Operação Fim da Linha, em 2016, representam 353 passagens pelo presídio.
Do total, 123 criminosos haviam ingressado mais de uma vez no sistema prisional, sendo que 33 tiveram mais de quatro passagens. Alguns destes chegaram a passar nove vezes pela unidade prisional. Outros 12 chegaram a ser presos quatro vezes em apenas um ano.
Para o promotor de Justiça do Gaeco, Bernardo Albano, os números mostram a ineficácia do sistema penal, sobretudo em relação ao enfrentamento as organizações criminosas que atuam no estado.
“Esse foi um sistema criado nos moldes do código de 1940 para uma realidade completamente distinta. Essa realidade se modificou de tal forma que não temos proporcionalidade entre pena e execução dessa pena”.
Albano explica que o grande problema do sistema é não conseguir manter o criminoso preso. “O sistema funciona na identificação. Se consegue muitas vezes identificar, se consegue prender, mas não se consegue manter essa pessoa na prisão. De modo que ela se sinta dissuadida no cometimento de crimes”.
A pena pelo crime de organização criminosa, por exemplo, varia de 3 a 8 anos de prisão em regime fechado. Porém, com 1/6 da pena aplicada o detento progride de regime, como explica o promotor.
“Mesmo que ele [criminoso] pegue a pena máxima, que é de 8 anos de cadeia, vai cumprir apenas 1/6. Como é que o sistema funciona de forma eficaz se eu tenho que prender a mesma pessoa várias vezes no mesmo ano? Isso traz o colapso do sistema. Nenhuma polícia consegue prender o mesmo criminoso de forma múltipla. Isso demonstra que o sistema é ineficiente de dissuadir a prática de ilícitos”.
Conforme o último levantamento divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a taxa de reincidência entre os presidiários brasileiro gira em torno de 70%. Sete em cada dez presidiários brasileiros voltam à cadeia, afirmam juristas.
Albano acredita que o primeiro passo para avançar no combate a criminalidade é fomentar políticas públicas de forma multidisciplinar.
“São projetos que visem quebrar a referência nos bairros de maior vulnerabilidade. Hoje, se você chegar no bairro Taquari, o jovem do bairro tem como referência o criminoso, que tem moto, que tem dinheiro. A referencia é ele. Esse é um eixo de trabalho e soluções a médio e longo prazo”, diz o promotor ao acrescentar que também é preciso modificar a atual legislação.
Facções criminosas
De acordo com o promotor, a chegada das primeiras organizações criminosas no Acre, vindas principalmente do Sudeste, ocorreu em 2012.
“A partir da chegada dos primeiros núcleos de PCC e, apesar dos esforços realizados, essas organizações se alastraram por vários motivos. A posição estratégica do Acre, o Peru com situações graves em localidades próximas das nossas fronteiras, a Bolívia com acréscimo de institucionalizar a plantação de cocaína. Isso tudo nos coloca numa situação extremamente vulnerável. Com a declaração de guerra a nível nacional entre as duas maiores facções criminosas do Brasil, PCC e Comando Vermelho, nos trouxe uma situação de intenso conflito”.
O alto número de homicídios reflete a guerra entre facções criminosas que ocorre no estado. Em agosto deste ano, o Monitor da Violência, apontou o Acre como o terceiro estado com maior taxa de mortes violentas do Brasil, com um índice de 4.16 crimes violentos por 100 mil habitantes.
Apesar disso, o último levantamento divulgado pela Secretaria de Segurança Pública, mostra que o número de homicídios reduziu 10,33%. Em 2017, de 1º de janeiro a 20 de novembro, foram registrados 445 assassinatos. Já no mesmo período deste ano, o quantitativo caiu para 359.
Em Rio Branco, foram 75 casos a menos, se comparados os períodos de 1º de janeiro a 20 de novembro de 2017 e 2018 – o que representa uma queda de 26,79% nos homicídios.
Ainda segundo Albano, é preciso intensificar as ações de combate à violência e trabalhar com um sistema de integração de inteligência a nível estadual, federal e internacional.
“Temos que conversar com nossos vizinhos. Essa criminalidade organizada repercute não só No Brasil, mas também nos países vizinhos. Temos criminosos brasileiros que causam insegurança nos vizinhos, da mesma forma que temos criminosos peruanos e bolivianos que nos trazem insegurança. Precisamos melhorar o relacionamento a nível de inteligência, articulação policial e de segurança com os nossos vizinhos”.
Investimento em Segurança
Segundo o Governo do Acre, nos últimos anos, a Polícia Militar tem recebido uma série de investimentos com dezenas de novos veículos, armamento e coletes balísticos, além da criação da Companhia Rondas de Ações Intensivas e Ostensivas (Raio), que fortalece as operações com o grupamento em motos. O Estado aplicou só em 2017 cerca de R$ 500 milhões na Segurança Pública.
Recentemente, a Segurança Pública ganhou ainda mais um reforço: a criação do Grupamento de Rondas Ostensivas Motorizadas (Rotam), da PM. Agora, o Rotam se une à Companhia Raio, trabalhando no policiamento motorizado, o que confere às ações maior agilidade e eficiência no trabalho diário de policiamento.
Já a Polícia Civil intensificou o calendário de operação de cumprimento de mandados judiciais em todo o Acre e criou a Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), um grupo altamente preparado para pronto emprego em ações de risco.
“Mesmo que ele [criminoso] pegue a pena máxima, que é de 8 anos de cadeia, vai cumprir apenas 1/6. Como é que o sistema funciona de forma eficaz se eu tenho que prender a mesma pessoa várias vezes no mesmo ano?”, questionou o promotor de Justiça do Gaeco, Bernardo Albano.