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Pintando cisnes negros de cinza para diminuir os riscos de desastres da rede elétrica nesta parte da Amazônia

Nassim Taleb, um pensador libanês-norteamericano, popularizou o conceito do cisne negro – um evento que parece impossível antes do fato, mas tem impactos importantes. Ele usou a analogia que parece impossível que existam cisnes negros se você só tinha visto cisnes brancos, até provado ao contrário, como uma visita à Austrália poderia revelar. A derrubada das torres gêmeas em Nova York, em 11 de setembro de 2001, e a crise financeira mundial em 2008 são exemplos comuns de cisnes negros, mas temos os nossos cisnes negros nesta parte da Amazônia.

Em 2004, se alguém tivesse falado que a seca do ano seguinte ia levar a incêndios florestais penetrando em mais de 300 mil hectares de florestas no leste do Acre e em dezenas de milhares de hectares de florestas em Pando e Madre de Dios, ele ou ela teria sido considerado um(a) doido(a), mas isto aconteceu.  Em 2012, escrevemos neste jornal um artigo sobre cisnes negros, mas não teríamos ousado de contemplar o isolamento que o Acre sofreu durante dois meses em 2014 com a inundação da BR-364 em Rondônia, nem uma inundação de quase um metro maior do que as de 1997 e 2012, como aconteceu em 2015.

Desde 2005, tivemos pelo menos três cisnes negros – uma da seca e duas de inundações — que afetou seriamente a vida de pessoas na região. Teoricamente, já aprendemos das lições destes eventos e estamos preparados se eventos iguais vierem acontecer. Afinal, estes cisnes já se tornaram brancos porque sofremos com eles em nosso passado recente.

Entre os cisnes negros restantes para a nossa região, há uma possibilidade que vale a pena se preparar: um colapso prolongado do sistema elétrico. Este cisne já é um pouco mais para cinza do que negro porque temos alguns exemplos e estudos que informam sobre as possibilidades de um evento deste.

Por exemplo, no ano passado o furacão Maria passou em cima de Puerto Rico, parte dos EUA com três milhões de habitantes.  O sistema elétrico de Puerto Rico tinha falhas antes do furacão e, consequentemente, grandes vulnerabilidades, mas também a resposta foi falha. Meses passaram até a grande maioria dos residentes de Puerto Rico ter energia elétrica da rede. O custo foi não só financeiro, mas também em vidas.  Uma estimativa das fatalidades associadas ao impacto do furacão chegou a mais de 4.000.   Muitos casos foram de doentes ou de idosos que precisavam de eletricidade para manter equipamentos funcionando como ventiladores e bombas.

Uma resposta fácil para este exemplo é que não temos furacões aqui, mas a maior parte dos problemas na restauração de energia foi ligada a problemas logísticos e financeiros, fatores que são comuns depois de desastres, independente da causa.

Obviamente, a sociedade moderna tem incorporado o uso contínuo de eletricidade de redes como um sinequa non para funcionar.  É difícil lembrar que poucas décadas atrás, eletricidade foi um luxo e perceber que ainda existem acreanos que vivem sem eletricidade em casa. Aliás, para jovens ligados a videogames e mídia social a ideia de não ter energia elétrica disponível é impensável, como um cisne negro.

Mas, vamos clarear este cisne. Existem pelo menos três fatores que podem levar a um apagão prolongado na região.   O primeiro é ciberataques, seja por chantagem para ganhar dinheiro, seja por razões ideológicas. Já aconteceu algo na Ucrânia em 2015; parece ser difícil, mas não impossível.

O segundo envolve tempestades solares que podem afetar até países perto do equador, causando falhas prolongadas nas redes de energia.  A Terra recebeu o impacto de uma tempestade chamada Evento Carrington em 1859. Uma tempestade solar semelhante teria acertado a Terra em 2012 se tivesse adiantado nove dias. Uma repetição deste evento poderia causar apagões prolongados na maioria dos países. Este cisne é bastante cinza e preocupante porque um cientista estimou a chance de 12% de um evento destes em dez anos, uma alta probabilidade por um evento desta magnitude.

O terceiro evento é regional quando alguém decidir que seria bom derrubar algumas torres, seja como protesto, seja por motivos criminais. Mais recentemente foi ventilado que fações criminosas estavam pensando nesta possibilidade durante a eleição.

Estes cisnes negros, agora cinzas, tem individualmente probabilidades baixas, mas conjuntamente aumenta a chance de podermos ter um apagão prolongado, talvez não comprido como em algumas áreas em Puerto Rico no ano passado, mas também não passageiro.

Podemos nos preparar para um desastre deste fazendo simulados, planos de contingência e orientação do público. Por exemplo, no domingo passado, um grupo de radioamadores ligado a RENER (Rede Nacional de Emergência de Radioamadores), em Rio Branco, testou o uso de rádios portáteis para comunicar entre vários pontos da cidade durante um apagão prolongado. Estes pontos foram selecionados como prioritários pela Defesa Civil Municipal.

Cisnes negros e cinzas de eventos extremos de clima já promoveram desastres em 2005, 2014 e 2015 e vão continuar a fazê-lo no futuro próximo. É hora de nos preparar para estes eventos e para outros de maior intensidade, a fim de que possamos diminuir seus impactos. Se não fizermos, quem vai pagar o pato/cisne somos nós mesmos.

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Foster Brown é pesquisador do Centro de Pesquisa de Woods Hole, Docente da Pós-graduação e pesquisador do Parque Zoobotânico da Universidade Federal do Acre.  Coordenador do Projeto MAP-Resiliência

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