Na tarde desta segunda-feira, 7, organizações indígenas do Acre protocolaram no Ministério Público Federal uma representação contra a Medida Provisória (MP) nº 870, assinada no primeiro dia de governo do presidente da república Jair Bolsonaro. Entre outros graves encaminhamentos, a medida transfere a demarcação de Terras Indígenas (TIs) da Fundação Nacional do Índio (Funai) para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. O documento foi entregue à procuradora da república Luciana de Miguel Cardoso Bogo e faz parte do movimento nacional proposto pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). Em menos de sete dias após sua assinatura, diversas organizações indígenas e indigenistas no Brasil manifestaram repúdio à MP.
No Acre, a representação incluiu os embates que podem surgir do Decreto nº 9.667, que exclui a Funai do processo de licenciamento ambiental de empreendimentos quem impactam os povos e terras indígenas e outros desdobramentos da MP nº 870, que também institui novas formas de supervisão e monitoramento das atividades das organizações da sociedade civil, controle que não é atribuição da Presidência da República e ataca o direito constitucional à liberdade de associação, representação, organização e atuação dos cidadãos.
Assinaram a ação judicial Francisca Oliveira Yawanawa da Organização dos Professores Indígenas do Acre (Opiac) e da Organização do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre (Amaaiac), Francisco Piyãko da Organização dos Povos Indígenas do Juruá (Opirj), Letícia Luzia Yawanawa da Organização das Mulheres Indígenas do Acre, Sul do Amazonas e Noroeste de Rondônia (Sitoakure) e Antônio Apurinã, liderança indígena. No documento, os indígenas lembraram que a “reestruturação” apresentada pelo presidente Jair Bolsonaro não é nova: “é sinônimo do retorno a uma prática colonial integracionista e genocida, totalmente ao contrário do paradigma estabelecido pela Constituição Federal de 1988 e por diversos tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário”. “Esse preconceito sempre existiu, mas com muita luta fizemos alguns avanços e não vamos retroceder. Nós sabemos o que somos, sabemos o que queremos e temos que ser ouvidos”, disse a coordenadora da Opiac Francisca Yawanawá, durante a reunião no MPF.
O representante dos indígenas do Juruá, Francisco Piyãko, pediu maior atenção ao MPF à questões indígenas. “A Funai esta sendo esvaziada e desmantelada, estão acabando com uma política que já tinha amparo da lei e que foi uma conquista dos povos indígenas. Nosso território não pode ser visto erroneamente como uma ameaça. Nós temos nossas estratégias para continuar nas nossas terras, formas de uso dos nossos recursos, não temos qualidade de vida à partir do dinheiro”, disse.
A procuradora Luciana Bogo explicou aos representantes que antes mesmo da posse do novo presidente da República, procuradores que atuam na defesa dos direitos dos indígenas de todo país estudam formas de contestar na Justiça a política de retrocesso de Bolsonaro. “Vários direitos estão sendo violados e essa é uma preocupação de todos que estão lidando com essa matéria. Foi montada uma equipe em Brasília e vamos fazer uma atuação coordenada”, explicou, assegurando que a representação será enviada para a 6ª Câmara do MPF, responsável pela defesa dos grupos tradicionais.
Leis – A ação judicial protocolada pelos indígenas do Acre pede para suspender o Art. 21, inciso XIV e seu parágrafo 2º, inciso I, da Medida Provisória n. 870, de 1º de janeiro de 2019, referente a atribuição do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, no que tange a identificação, delimitação e registro de terra tradicionalmente ocupada, pela afronta ao Art. 6º, da Convenção nº 169 sobre povos indígenas e tribais da Organização Internacional do Trabalho – OIT, promulgada pelo Decreto nº 5.051, de 19 de abril de 2004; bem como pela afronta do Art. 1º do Decreto n. 1.775/96, Art. 19 da Lei n. 6.001/73 e Arts. 1º e 4º do Decreto n. 9.010/2017. (Assessoria de Comunicação da CPI – Acre)