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Uma pitada de hipocrisia

“Em nome do bom convívio na sociedade, fingimos que não reconhecemos a hipocrisia no próximo”

Um dos maiores defeitos do ser humano consiste na hipocrisia de dizer uma coisa e fazer outra (totalmente distinta). Ditamos regras para os outros e sabemos que nem mesmo nós vamos cumpri-las.Como diz La Rochefoucauld, “hipocrisia, essa homenagem do vício à virtude, é mais humana do que parece. E tão mais frequente quanto supomos ou desejaríamos”.
A tendência é “impugná-la” com todas as forças (morais), porém, somos todos tão acostumados a ela que nem a percebemos e, vira e mexe, nos pegamos seduzidos por seus encantos. E num piscar de olhos, estamos julgando as pessoas por não viveremde acordo com nossos conceitos, estes dos quais também não vivemos.
O “grande mistério” da hipocrisia é que por trás de um hipócrita não existe apenas uma pessoa moralmente falsa, existe um mentiroso. O hipócrita, por exemplo, sente-se normalmente como um semideus, superior aos demais. E a prova disso é a sua hipocrisia, que permite a ele cometer os mesmos erros que condena nos outros. É um covarde, pois se esconde dentro de suas contradições para atacar aqueles que iguais a ele.
Mas, na medida em que julga, se vê também envolto a uma redoma de medomediante ao risco de ser desmascarado. Há quem diga que é por isso que, muitas vezes, se tornam radicais. Não porque são fervorosos defensores de seus princípios (que não os têm, sabemos, por trás da máscara da hipocrisia). Mas é que o fervor no hipócrita serve como uma cortina de fumaça para escondê-lo de tudo e todos e para ameaçar e desestimular permanentemente qualquer um que tente identificá-lo.
Mas, em nome do bom convívio na sociedade, fingimos que não reconhecemos a hipocrisia no próximo e os deixamos “triunfar”. Mundinho difícil de ser vivido, hein. Como bem frisa Ivan Maciel Andrade, “bom mesmo era como acontecia nos clássicos antigos e fascinantes filmes de faroeste, em que os mocinhos ficavam de um lado e os bandidos do outro. A hipocrisia? Ficava de fora da tela e da narrativa”.

* Marcela Jansen é jornalista.
E-mail: marcelajansen@hotmail.com

Fabiano Azevedo: