Desde o governo de Michel Temer a reforma da Previdência tem gerado polêmica. Agora, a equipe econômica do governo de Jair Bolsonaro tenta reavaliar o cronograma e a estratégia para apresentar e aprovar a proposta. O projeto pode ser votado ainda em março.
Apesar de o texto com as mudanças ainda não ser conhecido, a reforma prevê, entre outros pontos, mudar regras para a concessão de aposentadorias de trabalhadores da iniciativa privada, servidores públicos e militares.
Para entender o que, de fato, pode mudar com a reforma da previdência, o A GAZETA conversou com o advogado especialista em direito tributário, Wagner Alvares. Ele é presidente da Comissão de Direito Previdenciário da OAB-AC e milita pela causa há dez anos.
Primeiro é preciso compreender o motivo pelo qual a reforma da Previdência é necessária. O déficit da Previdência (INSS e servidores públicos) saltou de R$ 77 bilhões em 2008 para R$ 197 bilhões ano passado.
Além disso, segundo o advogado, a expectativa de vida dos brasileiros aumentou e, com isso, o rombo tende a crescer. “O que o governo busca é diminuir esse déficit, que ano passado foi de R$197 bilhões, para desvincular o que é previdência do que é assistência”.
A primeira mudança é fixar uma idade mínima para aposentadorias, com equiparação entre homens e mulheres.
“Hoje, mulheres se aposentam com 60 anos e 30 anos de contribuição, e homens com 65 de idade e 35 de contribuição. A proposta do governo é criar um pedágio onde haverá uma evolução da idade mínima e do tempo de contribuição, em que perfaçam para 40 anos de contribuição para homens e mulheres, e 65 anos de idade para homens e mulheres para aposentadoria integral”.
Sobre o benefício por incapacidade, o especialista esclarece que a proposta do governo é de quem comprovar a condição de miserabilidade e tiver 55 anos ou mais, terá assegurado uma renda mínima de R$ 500.
“Se for 65 anos, receberão R$ 750. Mais de 70 anos e 10 anos de contribuição vai receber um pagamento extra de R$ 150, podendo chegar até R$ 900. Mas nenhum benefício previdenciário pode ser inferior ao salário mínimo, conforme determina a constituição, exceto o benefício de auxílio acidente”.
O projeto prevê ainda que as idades mínimas para concessão dos benefícios previdenciários sejam ajustadas quando houver aumento na expectativa de sobrevida da população brasileira.
Transição
O governo pretende propor um período intermediário em que as regras vão subindo progressivamente até que tudo seja unificado. O período de transição seria de 12 anos, segundo a equipe do governo.
O objetivo é que fosse fixada uma idade inicial, mais baixa, e que ela fosse subindo progressivamente até chegar no teto fixado.
Existe alternativa?
Muitos especialistas afirmam que a reforma da Previdência não é o caminho para tirar o país do buraco. Por outro lado, muitos defendem a mudança como a única solução para equilibrar as contas do governo.
Alvares defende que a medida não é a única solução e diz que uma alternativa para o governo seria separar o caixa da assistência do caixa da previdência social.
“A meu ver, em razão do aumento da expectativa de vida, o governo tende a aumentar o período de contribuição. Só que tem que ser justo para todas as categorias, se não, algumas sairão prejudicadas, inclusive os políticos. Porque os políticos, no futuro, vão receber um benefício previdenciário, pensão ou aposentadoria. Então, a regra tem que ser geral para todos. Se não, a proposta de reforma fica desproporcional”.
O advogado destaca ainda a necessidade de fazer um levantamento do que é déficit da previdência, separando do que é assistência.
“Tem que fazer os ajustes para não perder o trabalhador, o contribuinte. Não sei se a reforma em si seria a melhor coisa, mas teria que haver essa adequação da maneira de contribuir. Tem que buscar o equilíbrio, algo justo entre o que o trabalhar faz para com o INNS mediante as contribuições, e depois, o que vai ser recebido”.
Segundo Alvares, se alguém tem que arcar com os prejuízos do rombo no caixa da Previdência, que seja o governo. “Se tiver que ser pago, se tiver alguém que de um modo geral tenha que ser penalizado, que seja o governo, afinal, nós pagamos uma das maiores cargas tributárias do mundo”.
A proposta de reforma da Previdência ainda deve gerar muita polêmica e manifestos em todo o Brasil. Por isso, Alves afirma que a população deve cobrar dos políticos posicionamentos que beneficiem a todos.
“A sociedade tem que ficar atenta e cobrar dos nossos representantes de um modo geral. Com certeza, a OAB, a comissão de direito previdenciário, o IBDP, vão convocar a população, fazer audiências públicas para estarmos discutindo. E para que os nossos representantes, os três senadores e oito deputados federais, votem pensando na população e não no governo federal”.
Mito ou verdade?
O jornal A GAZETA selecionou algumas especulações que circulam na internet em relação à reforma da Previdência. Assim, especialista em direito previdenciário, Wagner Alvares falou sobre o que é mito e o que é verdade.
A GAZETA – A reforma vai atingir somente servidores marajás?
Wagner Alvares – Não. Ela atingirá a todos, principalmente a classe mais baixa.
A GAZETA – A reforma iguala a aposentadoria dos servidores públicos a dos demais trabalhadores?
W.A – Não. Ela equipara em alguns pontos e outros não, haja vista que os servidores públicos têm a previdência complementar, e os servidores da iniciativa privada não.
A GAZETA – A reforma não atingirá direitos dos trabalhadores?
W.A – Com a nova versão, apresentada pelo governo temer, que se pretende criar a carteira verde e amarela, a reforma poderá atingir direito dos trabalhadores.
A GAZETA – Sem a reforma o país vai quebrar?
W.A – Se não quebrar, poderá passar por momentos difíceis ao longo dos anos, daqui a uma década ou duas. Hoje, a maior parte do déficit do governo federal vem com os pagamentos dos benefícios previdenciários. Então, poderá quebrar sim.
A GAZETA – A reforma trata todos igualmente?
W.A – Com a proposta que está sendo apresentada pelo governo Bolsonaro, em que se pretende incluir políticos, militares e todas as demais categorias, poderá sim atingir todas as categorias.
A GAZETA – Não há alternativa a reforma para evitar o rombo nos cofres?
W.A – Uma alternativa seria desvincular o que é assistência do que é previdência. Essa poderia sim, ser uma alternativa.
A GAZETA – Haverá regras de transição?
W.A – Sim, haverá regras de transição em que as pessoas pagarão um pedágio por estarem saindo de uma regra mais benéfica e passando para uma regra mais dura.
A GAZETA – Os servidores públicos contribuem pouco?
W.A – Não, os servidores contribuem como os outros. O que muda é que antes, o servidor público aposentava integralmente. Agora, desde 2013, para aposentar acima do teto tem que pagar previdência complementar.
A GAZETA – Sem reforma haverá dinheiro para saúde e educação?
W.A – O país é muito rico, nós pagamos muitos impostos. Dizer que sem a reforma não haverá dinheiro para saúde ou educação é algo muito sério. Haverá sim, porém, em valores menores do que poderiam ser disponibilizados. Mas não, é uma palavra muito pesada nesse sentido.