A Academia Acreana de Letras, iniciada por Amanajós de Araújo, em 1937, hoje com 82 anos, ganha seiva neste próximo 22 de março do corrente ano, dia em que tomam assento em suas cadeiras vacantes, quatro próceres da cultura regional: Prof.ª Dr. Telmo Camilo Vieira, Prof. Dr. Claudio Mota Porfiro, Prof.ª Dr.ª Rosana Cavalcante dos Santos, Prof.ª Me. Cecília Ugalde. Esse ingresso ao sodalício maior do Acre carrega imensa responsabilidade, que é somar esforços aos poucos acadêmicos residentes no Acre e, ainda, aqueles que dedicam seu tempo à literatura, ao idioma pátrio, aos livros, à pesquisa, à cultura regional.
Foi um ato de extrema coragem e ousadia, naquele ano de 1937, fundar, no Acre, uma Academia de Letras. As dificuldades eram gigantes. E, hoje, mesmo com a intervenção dos anos, eles não nos separam das dificuldades do passado. Foi fundada sem sede e permanece há 82 anos sem sede. Temos todo acervo histórico, de 82 anos, armazenado em sacos plásticos, atirados ao chão, numa sala no segundo Distrito de Rio Branco, num gesto de pouco apreço e respeito à cultura, às letras, à história, à tradição, ao patrimônio cultural do Estado do Acre. Uma ação suicida para liquidar a Academia Acreana de Letras, então desalojada da antiga Casa da Cultura, na Rua Pernambuco. É uma história tão triste que nossas lágrimas não foram capazes de sensibilizar nenhuma autoridade política do Acre, e os nossos gritos se perderam na mudez de quem tinha o poder de ouvir e agir.
A Academia Acreana de Letras, em tempos de remotos, foi palaciana, conforme figura sua placa, corroída numa parede, no Palácio Rio Branco. Mas afora esse resquício histórico, nunca recebeu incentivo dos Governos, muito embora seja uma casa que concentra o maior número de escritores e poetas do Estado do Acre. Aqui há grandes cientistas (em número menor do que a Ufac, aqui temos 36 imortais, e a Ufac possui mais de 500 docentes), historiadores, escritores, poetas, novelistas, romancistas, contistas, enfim, uma plêiade que produz muito, faz história, literatura, memória e culto ao idioma pátrio, num trabalho peregrino que deixa marcas profundas para as gerações futuras.
E, embora os anos não nos isolem de seus fundadores e tão pouco das dificuldades daquele ano de 1937, hoje temos uma renovação no quadro de imortalidade, com a chegada de quatro novos talentos das letras. Assim, talvez, talvez mais do que dantes, é forçoso proclamar que as quimeras e as ilusões do passado, as dificuldades do presente, nunca nos afastarão de sua matriz singular: o culto ao idioma pátrio. Mais que nunca, na origem e no destino, estamos enlaçados ao pacto que nos força a ouvir o coração da população acreana, representada por todos nós, a clamar por apoio às letras, o respeito aos escritores, aos poetas, aos cientistas, aos professores, aos educadores.
Nós escrevemos, fazemos a memória cultural da região. Afinal, a língua é a alegria dos seres humanos. Nesta Casa repousa a poesia do desejo, a melancolia dos gritos premidos, o advento das estações, a exaltação do fino mistério soprado, quem sabe, pelo próprio Deus. Falar, escrever, pensar, alcançar as fendas onde a metáfora pousa solitária, circunscreve-nos ao picadeiro dos imortais, ao galeão dos condenados, aos salões galardoados, às terras onde se trava a batalha do verbo e das exegeses. Sob o estímulo desta tradição, a Academia Acreana de Letras sempre se rendeu às turbulências da arte, às tentações do pensamento, à insubordinação criadora. Instaurou em seu cotidiano o ritual da cerimônia, quis conciliar o que emana do sagrado e do profano, amenizar as discrepâncias, rejeitar os expurgos arbitrários, tornar o convívio fonte de concórdia.
Uma tradição que nos ensinou a conviver com os impasses da história, a resistir aos tormentos da modernidade fátua. A ousar falar do futuro. Obstinada em realçar que a glória da instituição, repousando em tantas vitórias individuais, favorece o fervor coletivo.
Como filhos da pátria de língua portuguesa, de um idioma composto por sobras latinas, gregas, asiáticas, africanas, espalhadas em quatro continentes, que possui feição arqueológica, fica o desejo de estudar/aprender/ensinar. Os inventos verbais desta língua, que peregrina pela Península Ibérica, pela África, pela Ásia, pela nossa América, trazem a chancela natural da transgressão. Arrasta, consigo, a luxúria, mesmo quando confrontada às experiências radicais, místicas, vizinhas do abismo de Deus.
Nesse universo, somos os guardiões do idioma pátrio que traduz a vida nesta região do Acre. E, aqui, na Academia Acreana de Letras, não desejamos cotizar dracmas [como fizeram os antepassados, em Atenas] para erigir um templo. Entendemos ser este um dever do Estado Brasileiro, que deveria cultuar a literatura e o idioma de feição nacional e, assim, abrigar, com dignidade, o sodalício acreano.
Damos afetuosas boas vindas aos notáveis Acadêmicos que se incorporam a esta Congregação, para consolidar e continuar, nesta Magna Instituição, o cultivo do saber puro, dinâmico, atual e evolutivo, junto à sociedade, inserida no contexto universal, com o compromisso de servir e trabalhar para o bem da CULTURA e do CULTO AO IDIOMA PÁTRIO. Estes dois atributos que, se bem exercitados, trazem grandes benefícios para a humanidade.
Para finalizar, num sopro de esperança e júbilo, a Academia Acreana de Letras recebe, neste 22 de março de 2019, em seu quadro de imortalidade, quatro novos talentos que irão compor o quadro de 40 imortais. E, nesta recepção aos que chegam, lembramos que na AAL repousa a poesia do desejo, a melancolia dos gritos premidos, o advento das estações, a exaltação do fino mistério soprado, quem sabe, pelo próprio Deus.
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Prof.ª Dr.ª Luísa Galvão Lessa Karlberg
Pós-Doutorado em Lexicologia e Lexicografia – Université de Montréal – Canadá
Doutorado em Letras Vernáculas – UFRJ
Mestrado em Letras – UFF
Coordenadora Pós-Graduação, Campus Floresta – UFAC
Presidente da Academia Acreana de Letras – AAL
Membro da Intertional Writers and Artist Association – IWA
Embaixadora Internacional da Poesia – CCA