Uma série de mensagens divulgadas pelo site The Intercept Brasil mostra que o ex-juiz federal Sergio Moro, hoje ministro da Justiça do governo Bolsonaro, orientou o procurador do Ministério Público Federal Deltan Dallagnol no âmbito da operação Lava Jato. Os diálogos no aplicativo Telegram foram obtidos, segundo o site, por um hacker que compartilhou o material de forma anônima.
Se em um primeiro momento o fato de as mensagens entre os dois terem sido acessadas por um hacker afaste Moro e Dallagnol de maiores consequências disciplinares, já que os diálogos não teriam valor de prova, a relação entre juiz e acusador coloca sob risco de nulidade as decisões proferidas pelo magistrado na operação, conforme avaliam especialistas ouvidos por VEJA.
Na legislação brasileira, é o Código de Processo Penal que dita as regras das ações criminais e trata diretamente desta hipótese. Em seu artigo 254, a norma diz que o juiz deve declarar-se suspeito ou pode ser recusado pelos envolvidos no processo “se tiver aconselhado qualquer das partes” — defesa ou acusação. Mais adiante, o artigo 564 do CPP aponta os casos em que ocorrerá a nulidade, entre eles “por incompetência, suspeição ou suborno do juiz”.
Art. 254. O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes:
I – se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles;
II – se ele, seu cônjuge, ascendente ou descendente, estiver respondendo a processo por fato análogo, sobre cujo caráter criminoso haja controvérsia;
III – se ele, seu cônjuge, ou parente, consangüíneo, ou afim, até o terceiro grau, inclusive, sustentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado por qualquer das partes;
IV – se tiver aconselhado qualquer das partes;
V – se for credor ou devedor, tutor ou curador, de qualquer das partes;
Vl – se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo.
Em um dos trechos divulgados, o então juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, onde correm os processos da Lava Jato, queixa-se da apresentação de recursos que poderiam atrasar a execução de pena de um acusado e fez sugestões no cronograma de fases da operação.
Em outra conversa, Moro indica uma pessoa “aparentemente disposta” a falar sobre imóveis relacionados ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado pelo então juiz na operação Lava Jato. Um dos subscrtitores da denúncia do MPF sobre o tríplex no Guarujá que levou o petista para a cadeia foi Dallagnol.
Os procuradores do MPF e o ex-juiz Sergio Moro manifestaram por meio de nota. Embora não neguem o teor das mensagens divulgadas, todos destacam a origem ilegal dos vazamentos. “Não se sabe exatamente ainda a extensão da invasão, mas se sabe que foram obtidas cópias de mensagens e arquivos trocados em relações privadas e de trabalho”, diz a nota subscrita pelos procuradores da Lava Jato.
Moro também afirmou que o conteúdo foi retirado do contexto. “Não se vislumbra qualquer anormalidade ou direcionamento da atuação enquanto magistrado, apesar de terem sido retiradas de contexto e do sensacionalismo das matérias, que ignoram o gigantesco esquema de corrupção revelado pela Operação Lava Jato.”
Os advogados Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Martins, advogados de Lula, afirmam que as conversas divulgadas demonstram “uma atuação combinada entre os procuradores e o ex-juiz Sérgio Moro com o objetivo pré-estabelecido e com clara motivação política, de processar, condenar e retirar a liberdade do ex-presidente”. (Leonardo Lellis / MSN)