Na rota dos incêndios florestais no Brasil, o Acre aparece entre os 10 estados que mais queimaram em 2019. O Acre ocupa o 8º lugar no ranking, com 2.533 focos de calor registrados este ano. Com esse cenário desolador, o governador Gladson Cameli (PP) resolveu decretar estado de emergência ambiental ontem, 23. A medida visa criar mecanismo eficazes de combate às queimadas e agilizar o envio de recursos pelo Governo Federal, por meio de um plano de respostas.
Em entrevista coletiva no Palácio Rio Branco, Gladson Cameli falou da preocupação com o avanço desenfreado das queimadas. O governador rebateu críticas a ele e sua política do agronegócio. Para Cameli, há um equívoco quando se fala em implantar o novo modelo de desenvolvimento no Estado.
“De forma alguma, e alguns já ouviram, de quererem misturar a política do governo do agronegócio como se fosse a favor do desmatamento. Primeiro que quem quiser entrar nesse assunto, pode entrar que eu não vou perder o meu tempo com isso. O que importa é a minha consciência e o que está bem claro no meu plano de governo. Defendo, determinei e vou determinar, perante a vocês, que todas as autoridades competentes do Estado usem todos os mecanismos para coibir qualquer tipo de irregularidade. Eu não compactuo com isso. Defendo o que está no novo Código Florestal Brasileiro”, disse Gladson Cameli.
Consciente do tamanho do problema, o governador disse que o momento não é de encontrar culpados. Mas sim buscar soluções. Cameli afirmou que o problema das queimadas na Amazônia é crônico. Ele teme que em 2020 a mesma “novela” seja reprisada. Para isso, ele pretende discutir, em uma possível vinda do presidente Jair Bolsonaro ao Acre, essa agenda.
“E aqui venho com muita tranquilidade. Não vim aqui para dizer se tem culpado, não é o estado vizinho, não é o país vizinho. Se lá atrás eles ficavam falando isso é porque queriam. Eu não vou ficar fazendo isso. Gosto de enfrentar os problemas olhando para ele, e para resolver. É uma situação que todo ano acontece. Ano que vem pode observar que essa novela vai se repetir de novo, esse capítulo, e nós vamos estar à frente para evitar o que tiver de evitar”, disse o líder do Poder Executivo acreano.
Gladson acrescentou que recebeu, na última quinta-feira, 22, uma ligação do ministro-chefe da Casa Civil, da presidência da República, Ônyx Lorenzoni. Gladson externou ao ministro a situação e disse que o decreto de emergência ambiental tem o caráter de se antecipar aos fatos e colocar fim às especulações quanto à atuação do Estado no combate às queimadas na região.
“Recebi uma ligação do chefe da Casa Civil da Presidência da República, o Onyx, externando essa situação. O presidente da República convocou os governadores para que possamos ir a Brasília na terça-feira. Ele [Bolsonaro] também está decretando emergência nacional. Eu disse, presidente, aqui eu já tinha pedido a equipe para que a gente faça logo isso agora, para evitar qualquer tipo de politicagem”, descreveu Cameli.
Esta semana, sem citar nomes, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) criticou a inércia de governadores da Amazônia no combate ao desmatamento. Bolsonaro salientou que muitos sabiam o que era preciso ser feito, mas não fizeram. Embora tenha uma boa relação com Bolsonaro, o decreto de Cameli é uma resposta ao posicionamento do presidente.
Ajuda de longe
Gladson Cameli não descartou receber ajuda da Argentina para combater os incêndios na Amazônia acreana. Uma aeronave equipada para esse tipo de situação, da Força Aérea Argentina, poderá atuar, se necessário.
“Daqui a pouco, vou autorizar o Ribamar a mandar um ofício para o governo da Argentina que já se colocou à disposição para o que for necessário. Se não for, mas vamos pedir logo, que eles mandem um avião que joga água, o que for, para que a gente possa não deixar e nem criar qualquer desculpa sobre isso. A determinação é enfrentar de frente”, disse ele.
Agronegócio e Meio Ambiente
Ao falar especificamente neste aspecto, Gladson Cameli disse que “não tem nada demais” a relação agronegócio e sustentabilidade, sendo que as duas podem andar juntas no caminho do desenvolvimento. Cameli reafirmou que é favorável ao uso, apenas, de áreas já desmatadas e muitas delas em processo de degradação, que podem ser utilizadas para o agronegócio, sendo desnecessária a expansão da fronteira agrícola.
“Essa confusão quem cria são os politiqueiros, os que gostam de criar confusão. Por que não tem nada demais. O que tem? É um governo que quer gerar empregos e aquecer a economia. O que temos aqui, com toda uma infraestrutura, com terra boa, chove, faz sol, tem de tudo. E os ambientalistas, essas pessoas…”, disse Gladson ao suscitar que há uma discussão ambiental sem o devido aprofundamento.
Crise com a França
O discurso do presidente francês, Emmanuel Macron, sobre os incêndios na Amazônia e um eventual boicote econômico ao Brasil também repercutiram na coletiva. Alinhado com o pensamento de Bolsonaro, Gladson foi duro com o líder francês ao dizer que Macron interfere na soberania do Brasil.
“O presidente da França não tem que estar se metendo aqui. Aqui somos nós. Aqui no meu Estado, pelo menos. Aqui quem cuida somos nós. Ele tem que cuidar dos problemas dele”, completa o governador acreano.
Recentemente, a União Europeia (UE) assinou acordo como Mercosul. Pode parecer distante a crise entre o Palácio do Planalto e o governo francês, o qual é ligado à UE, mas o Acre pode sofrer, por exemplo, com a exportação da farinha de Cruzeiro do Sul, arrolada entre os 10 produtos brasileiros beneficiados pelo acordo entre os países do Mercosul e a União Europeia.
Outro ponto é a Finlândia, que já propõe ao grupo de países europeus o boicote à compra de carne bovina do Brasil. O que implica, também, o Acre, que conta com mais de 2 milhões de bovinos. A alta demanda reprimida de carne no país poderá despencar o preço do boi por aqui.
Ações previstas no decreto
De acordo com o secretário de Meio Ambiente, Israel Milani, uma sala de situação ligada diretamente ao gabinete do governador será criada para monitorar os casos de incêndios florestais que se acentuam na região de Tarauacá, Envira, Vale do Juruá, e na Reserva Extrativista Chico Mendes.
“Será ligada diretamente ao gabinete do governador para que consigamos ter ações claras e efetivas para combater esses crimes ambientais, tanto no perímetro urbano, quanto nos incêndios florestais”, disse o secretário de Meio Ambiente do Acre.