Inicialmente, reportamo-nos a Freud que em seu texto “ Inibições, sintomas e ansiedade” (1926) descreve as principais respostas da natureza humana frente a ameaça de perigo, quais sejam, o medo, a angústia e o terror. Nesse sentido, seguindo Freud pode-se compreender o medo como uma resposta individualizada frente a um objeto determinado, a angústia, por sua vez, revela-se como uma resposta ao perigo sem a determinação de um objeto e; o terror caracteriza-se por possuir um objeto evasivo, inesperado e desconhecido.
Assim, a pandemia atual evocada pela eclosão do covid-19 ou novo coronavírus constitui-se na dimensão do terror freudiano que, por sua vez, permite a manifestação de respostas conforme as estruturas clínicas peculiares a cada sujeito.
Exemplificando a resposta histérica frente ao novo coronavírus pode caracterizar-se, de um lado, pela indiferença: “Isto é uma mentira” e, por outro lado, de forma antagônica encontra-se a resposta histérica fundamentada no excesso ou dramatização identificados em atitudes exageradas e, na arte da tentativa de convencimento, os fake news que necessitam serem verificados especialmente pelos órgãos de imprensa devido a multiplicidade de informações que se sobrepõem ininterruptamente e, ao mesmo tempo, sobre a pandemia.
Adicionalmente, ter-se-a a resposta obsessiva que em sua forma maníaca afirma: “ Eu estava certo, agora vocês deverão lavar as mãos todos os dias” e; em sua forma impulsiva declara “ Ninguém pode comigo”.
Não obstante apresenta-se também a resposta paranóica que, por sua vez, afirma “ Eu sempre disse que existia um perigo iminente e, ao extremo, acaba por nomear populações específicas para esta finalidade, ao mesmo tempo, identifica-se também a resposta psicótica, que a partir da constatação da pandemia pode acelerar o processo de desidentificação do psicótico com o mundo.
Nessa mesma interposição de pensamentos encontra-se também a resposta perversa aonde para o perverso o novo coronavírus representa o gozo supremo pois todos estarão sujeitos a um sofrimento universal.
Concluindo, a partir da constatação de que a pandemia evoca respostas individuais de cada sujeito conforme as estruturas clínicas que lhe subjacentes pode-se perguntar qual a capacidade de sofrimento que o ser humano aguenta? ( Lacan. Seminário X. A angústia, 1962). Dessa forma, para tentar responder a questão lacaniana precisamos compreender que o terror freudiano apresenta duas dimensões, quais sejam, a dimensão racional e a dimensão inteligível.
Na dimensão racional far-se-á necessário transformar o terror em medo, isto é, perguntar-se-a o que é o novo coronavírus, como conhecê-lo e como nós protegermos dele, a si mesmo e também ao próximo. Este é o processo desencadeado pela ciência, pelas autoridades governamentais e; sobretudo pelos profissionais de saúde que, se necessário for, são capazes de arriscarem as suas próprias vidas em prol do próximo fundando nestas atitudes a ética da solidariedade que deverá sempre que possível ser reforçada por toda a Sociedade civil organizada e Poder Público. Assim ter-se-a uma expressão: O que é o novo coronavírus? (questão ética e filosófica), como conhecê-lo? (pesquisas científicas) e como nós protegermos (saúde/equipamentos de proteção individual) e governamental (isolamento social e auxílio emergencial).
De outra parte, apresenta-se também a parte inteligível do terror freudiano, o afeto, que, por sua vez demonstra, inicialmente, a fragilidade humana diante de tantas adversidades mas, por outro lado, reafirma a necessidade do ser humano de utilizar a sua criatividade aliada a capacidade de estar sempre se reinventando a cada dificuldade ou sofrimento que se interponha em seu caminho lembrando-se que a ética da solidariedade nos ensina dentre outras situações que não vale a pena viver sozinho, ao contrário, a vida somente tem um sentido se for possível vivermos com os nossos semelhantes e; com quem amamos.
* Raul Larcher de Almeida Miranda é psicólogo, psicanalista e professor universitário. Atendimento psicanalítico virtual: raullarcher@hotmail.com