No Acre, as fronteiras do Brasil com o Peru e a Bolívia estão fechadas há meses. A medida foi determinada pelo Governo Federal para evitar o aumento da contaminação do novo coronavírus.
Com isso, a ponte que fica na divisa do município de Assis Brasil, no Acre, com Iñapari, região de Madre de Dios, tornou-se um alojamento a céu aberto de dezenas de pessoas de migrantes que tentam entrar ou deixar o Brasil.
A situação, segundo Aurinete Brasil, assessora da Cáritas e da Pastoral do Migrante, que pertencem à Diocese de Rio Branco, estava alarmante. No começo desta semana, em entrevista À GAZETA, ela revelou a preocupação com o fato de crianças estarem no local.
“Entre essas pessoas há crianças, que estão, inclusive, com insolação. É uma situação desumana, porque não contam com alimentação da parte do Peru. Já na parte do Brasil, na fronteira, nossas equipes da Cáritas e da assistência social de Assis Brasil, levam comida para os migrantes que estão ali. Contudo, os que ficaram no lado peruano não comem, não bebem água. Eles só têm água quando a equipe leva para os que estão do lado do Brasil, pois todos recebem alguma fração do pão partilhado”, declara Aurinete.
Deportação
No início da noite de quinta-feira, 6, a Justiça Federal mandou suspender, em caráter de urgência, a deportação do grupo de imigrantes que havia entrado sem regularização migratória em território brasileiro. O grupo composto por 12 venezuelanos, cinco colombianos e um cubano chegou a pé no Acre no último dia 4. A suspensão da deportação foi um pedido da Defensoria Pública da União (DPU).
A liberação
Após requerimento da Defensoria Pública da União (DPU) ao Ministério da Justiça, foi autorizado o ingresso no Brasil, por questões humanitárias, dos 14 migrantes venezuelanos detidos na fronteira entre Peru e Brasil, nas cidades de Assis Brasil (AC) e Iñapari, Peru.
O requerimento foi realizado em 31 de julho, ratificado em 3 de agosto e deferido no último dia 6. Assim, os venezuelanos, dentre eles mulheres e crianças e um casal que estava na ponte havia quase três meses, foram autorizados a entrar no país, juntamente aos outros 18 que já estavam no território brasileiro, mas cuja deportação fora suspensa judicialmente.
Atuaram no caso os defensores públicos federais Matheus Nascimento, João Chaves e Gustavo Zortea, membros do Grupo de Trabalho Migrações, Apatridia e Refúgio da DPU, que também trabalham na articulação institucional junto à Secretaria-Geral de Articulação Institucional da DPU e ao Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).
O grupo beneficiado com a decisão judicial comemorou com balões brancos. Na noite desta sexta-feira, 7, já não havia mais ninguém na ponte.
Vale destacar que a medida foi em caráter excepcional. Sendo assim, as fronteiras continuam fechadas, em razão à pandemia do novo coronavírus.
Surto migratório
O Acre já viveu um surto migratório em 2015, com a chegada dos haitianos, devido a uma situação de catástrofe ambiental no país de origem. Segundo Aurinete Brasil, passaram pelo estado mais de 50 mil migrantes na época. Ela teme que o episódio volte a se repetir. “A migração em um estado de fronteira não vai se extinguir. Por isso, é preciso de uma política pública, que já está sendo encaminhada pelo Estado e pelo Município. Isso será um divisor de águas, pois é inadmissível um estado de fronteira ainda não ter políticas públicas organizadas para migração e refúgio. Vai chegar o momento que vamos extrapolar os atendimentos, pois nós da Cáritas sobrevivemos de projetos e doações. Já estou pensando no pós-pandemia. Isso pode se agravar para nós que somos um Estado e municípios pequenos. Não vamos esperar repetir o que aconteceu em 2015”.
Xenofobia preocupa
O defensor público federal Matheus Nascimento, que participa do Grupo de Trabalho da Defensoria Pública da União (DPU) sobre Migrações, Apatridia e Refúgio, prevê que pode haver um fluxo maior no Brasil de migrantes que estavam no Peru, pois este país está a cada dia com regras mais rígidas de migração.
“Pessoas que estavam no Peru, principalmente venezuelanos e cubanos, enfrentam a política migratória do Peru, que tem ficado mais rígida. Tem acontecido uma xenofobia maior, e eles acabam tendo que ser forçados a sair do país e tentar entrar aqui no Brasil para ficar ou ir para outro país. Essas pessoas estão ficando ali na ponte que fica entre Assis Brasil e Iñapari”, relata. (BRENNA AMÂNCIO / Da Redação A GAZETA)