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ARTIGO – Tu-du-tu-du-tu-du

A convite da Bayer, conversei hoje com 150 cardiologistas sobre o silêncio. Assim que liguei a câmera, e vi o rostinho de cada uma delas – era um evento dedicado somente às mulheres – lembrei do dia em que ouvi o barulho mais impactante a que tive acesso, pelo menos até agora.

Quando viajei pela primeira vez de avião, era bem novinha ainda, ouvi de minha mãe um dos muitos avisos cuidadosos que damos aos filhos na intenção de antever o futuro. O avião estava prestes a pousar e ela disse:. “Quando a gente encostar no chão, vai fazer muito barulho, mas é assim mesmo, está tudo bem”. Mesmo preparada, quando esse enconstar se deu, tive a nítida sensação de que havíamos explodido com cada pecinha metálica da aeronave e que minha vida curta tinha chegado ao fim. Mas não foi esse o barulho impactante que lembrei mais cedo.

Não foi também o outro encostar que me marcou minha infância no quesito audição. Esse se deu no dia em que minha irmã e eu esperávamos o meu pai no portão de casa e o caminhão que descia a ladeira da Djalma Dutra, a pouquíssimos metros de distância do portão,  não conseguiu frear a tempo, acertando em cheio a moto que cruzava a esquina da avenida Simoa Gomes. A moto do meu pai.

Nem o do grito de horror do nosso pastor alemão, que por algum descuido, caiu na piscina de Garanhuns. E que fez esse mesmo pai mergulhar de pijama e tudo na água gelada em uma madrugada de inverno do agreste meridional para resgatá-lo. Não.

Esse é mais recente. Eu tinha exatos 26 anos. Foi tão espantoso, tão grande, que eu não pude chorar, rir, ou comentar qualquer coisa que fosse até agora. Não cabia. Nem em mim, nem no prédio, nem na avenida Paulista, onde estávamos. Pode ser até que eu tenha dito alguma bobagem no carro, no caminho de volta pra casa. Se disse, nem vale o registro. Devo ter comentado sobre o tempo ou o trânsito. E se fiz, foi só para tentar sacolejar aqui dentro, para tentar acomodar o tamanho do novo. Sei lá. Até hoje, quando a vida aperta, é esse estrondo que me volta à cabeça.

Pelos últimos 14 anos, evitei mencionar, e mencionar para mim mesma, o arrebatamento daquele dia . Tive medo de deixar escapar o susto. Quero ele aqui comigo. Foi preciso um minuto de silêncio diante das 150 cardiologistas que me esperavam para falar exatamente sobre ele, o silêncio, para que eu pudesse me dar notícias precisas do tamanho do barulho que o coração de Lara fez naquela sala de ultrassom. Viva a minha filha que já era grande e se fazia ouvir mesmo antes de nascer.

 

Roberta D’Albuquerque é psicanalista, autora de Quem manda aqui sou eu – Verdades inconfessáveis sobre a maternidade e criadora do portal A Verdade é Que…

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