Tati foi uma das minhas primeiras amigas aqui em São Paulo. Grudamos desde o primeiro dia. E grudamos bem grudadinhas mesmo, de fazer tudo junto de segunda a segunda. Agora, estamos a mais de 13 mil km de distância, separadas entre a manhã e a noite.
Conversamos ontem, às 7h, por vídeo, claro. Eu pus despertador, embora nem precisasse. Tenho acordado cedíssimo esses dias. Antes de levantar, dei aquela micro olhadinha no celular e…
“São Paulo tem congestionamento de corredores em ciclovia e aglomeração em praças.”
“Praia da zona sul do Rio fica lotada em dia de restrição contra Covid-19.”
“Brasil atinge a maior média de mortes de toda a pandemia.”
Minha gente, já comecei a chamada cansada. Aí aquela coisa, né? Todo muito cheio de história dura pra contar – que fase. Desligamos quase às 10h, entre renovadas pelo acolhimento e impactadas pelos rumos da vida. Eu tomei um café, já meio torta, e liguei pra minha mãe que anima até boneco de cera com as melhores saídas, fofocas e gracinhas. Anda afiadíssima dona Ana Maria.
E aí que ela não atendeu. Mandei mensagem, nem chegou. Mais meia hora e, de novo, silêncio. Lá para uma da tarde começou a bater a agonia. Liguei pra minha irmã, nada. Para a minha tia, nada também. Foi batendo um desespero, um desespero. Acionei uma prima que mora na mesma rua e segui no vazio.
Estava pronta a cena na minha cabeça: algo grande tinha acontecido, e tinha acontecido a todos. Meu Recife, de repente, ficou ainda mais distante do que a Austrália de Tati. Joguei o nome do prédio no google, nenhum telefone. Achei o da portaria do prédio vizinho e tive a cara de pau de pedir para o porteiro ir no prédio da minha mãe. O senhor poderia, por favor, pedir para interfonarem para a Ana Maria do Maria Dulce, ela mora no 502, eu tô em São Paulo, tô desesperada. Deus proteja o senhor e a sua família grandemente. Fiquei católica em um segundo. E não é que Wellington, o porteiro, foi. Gente, que delicadeza.
A minha mãe? Tá ótima. Telefone descarregado, ficou horrorizada com a minha agonia. É muita tensão, não é? Muito absurdo pra administrar. Estamos por um fio. Eu mando meu abraço para vocês todos, para Tati e para Wellington. Longe ou perto, família, amigos ou desconhecidos, a gente tá precisando se proteger mesmo. Boa semana, queridos.
(*) Roberta D’Albuquerque é psicanalista, autora de Quem manda aqui sou eu – Verdades inconfessáveis sobre a maternidade e criadora do portal A Verdade é Que…