Saí da cama puxada pelos cabelos hoje cedo. O gato acordou disposto, ainda eram 5h30 da manhã. Ele e o irmão estão conosco há um pouco mais de um mês, mas parece que sempre estiveram aqui. Este, o puxador de cabelos, e o outro, o destruidor de rolos de papel higiênico são os filhotes mais fofos que já vi na vida. Somam 4 meses, uma candura.
Foi no mês do nascimento dos gatinhos que comecei a entender quão barulhento é esse apartamento. Desde então me pego aumentando o volume do spotify perturbada pelo trânsito da avenida que, por vezes, parece estar dentro de casa.
O que chamou primeiro a minha atenção foram as motocicletas. Como soam mais agressivos os motores de 2021. Cheguei a cogitar uma alteração mecânica, até encontrar a conclusão óbvia de que não se trata de mecânica alguma, e sim da intensidade de circulação. Mas não são só elas que me fazem ter o desejo de silenciar o externo.
Comecei a atender, assim meio maldormida, às 8h. A sessão foi interrompida mais de uma vez, não pelo barulho de minha casa, mas por sirenes de ambulância que passavam por perto da casa de meu analisando. E que por 3 vezes (em 50 minutos) impossibilitaram a escuta.
Iniciei a contagem depois que desligamos, já foram 9, são 12h10. Nove ambulâncias. Assim como os gatinhos parecem ter sempre estado aqui, o barulho do trânsito parece fazer parte de São Paulo. Que medo que sinto dessa facilidade com que naturalizamos tudo. Não é trânsito, é gente indo buscar o que nós (para garantir alguma proteção) preferimos receber em casa. Alguém que se arrisca por um outro. É o contato com ao menos 12 pessoas sendo transportadas com urgência (Pra onde, já que os hospitais estão todos lotados?) na metade de um único dia.
Não dá para fechar a janela e fingir que está tudo bem. Não dá para aumentar a música. Silenciemos. Ouvir faz-se urgente.
(*) Roberta D’Albuquerque é psicanalista, autora de Quem manda aqui sou eu – Verdades inconfessáveis sobre a maternidade e criadora do portal A Verdade é Que…