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Ser professor: um compromisso ético

Ao longo de minha formação, além de estudar Língua Portuguesa, empenhei-me em aprender um pouco de Arte, Literatura, Linguística, Psicanálise, História, Psicologia, Filosofia, na busca de entender como funcionam os processos mentais que fazem com que uma pessoa tenha “mais facilidade” que outra para aprender, para se comunicar, para produzir, para se expressar, para – realmente – se sentir parte de um grupo e, assim, poder dar sua contribuição à sociedade.

Na minha caminhada, como professora, tenho presenciado coisas boas e ruins, convivência em ambientes saudáveis e doentios, com gente decente e outras nem tanto. Vi, de perto, os danos incalculáveis que uma pessoa despreparada e com deficiências de caráter pode causar ao ambiente educativo. Convivi com professores extremamente humanos e profissionais, mas também vi inúmeros miseráveis maculando o sagrado espaço do magistério. Gentes que poderiam, até, após intenso tratamento, exercer outros ofícios, mas nunca a missão sagrada de professor. É muito cômodo, quando se é professor, fingir para si mesmo que certos sintomas, apresentados por alguns alunos, sejam apenas manifestações de rebeldia, de indolência, preguiça, pouca inteligência ou falta de interesse. É certo, infelizmente, que um número significativo de professores se distancia de tais problemas por falta de conhecimento de como lidar com os alunos.  Todavia, é importante refletir que se não somos psicólogos, precisamos, ao menos, aprender a reconhecer esses sintomas para encaminhar o estudante a profissionais que possam atendê-los, auxiliá-los e tratá-los adequadamente.  Se assim não se  faz, o amanhã assistirá a proliferação de casas de detenção, hospitais psiquiátricos, casas de recuperação etc.

Não é difícil notar que ser professor não é fácil, ainda para aqueles que fazem desse ofício mais que ensinar conteúdos e formas adequadas de agir. Pois o mundo de hoje necessita mais de humanidade do que de conteúdos teóricos. Por isso a escola, seja ela do ensino fundamental ou superior, deve ter em primeiro plano a pessoa humana, que lida com a outra, depois a formação profissional dos agentes educacionais e, ainda, conhecimento do profissional que está treinando, preparando para  a vida. Assim, antes dos conteúdos pedagógicos, deve lapidar a pessoa humana, incutindo-lhe ensinamentos basilares à vida social, tais como respeito, harmonia, integridade, amor. Logicamente, a conscientização de que não se deve mentir, roubar, matar, levantar falso-testemunho, atraiçoar, faria diminuir, sensivelmente, as misérias humanas e, num futuro mais próximo, poderíamos sonhar em ter no magistério somente aquelas pessoas que pudessem realmente ensinar na leitura e compreensão do mundo e, em especial, ser exemplo de conduta aos alunos. Seria uma forma segura de construir um mundo melhor, pois seja como seja, o PROFESSOR É O EDUCADOR DO MUNDO!

Agora, se o sistema educacional brasileiro insiste em treinar pessoas para se tornarem débeis obedientes, então ensinem conteúdos descontextualizados e regras de comportamento ao gosto desta ou aquela moral – que é sempre relativa a um ou outro grupo de interesses ideológicos. Porém, se querem formar cidadãos, é preciso mais que apostilas e regras de conduta. É preciso constituir um espaço democrático no qual todos tenham efetivamente as mesmas responsabilidades, os mesmo incentivos, as mesmas punições ou sanções, quando necessário. Formar cidadãos é mais que inserir o educando na sociedade, é muni-lo de condições de intervir consciente e positivamente nos rumos da história.  E, nessa direção, a  boa leitura é trilha segura. Não somente a leitura das letras e sim, especialmente, a leitura da vida, do outro, das pessoas, das coisas do mundo.

Serão esses pensamentos utópicos? Acredito que não. É perfeitamente possível realizá-los na prática escolar. Indaga-se, então, quem quer cidadãos conscientes? Não é melhor ter escravos que fazem tudo certinho, conforme foram mandados? E é melhor para quem? Para mim, tenho certeza que não, pois essa indecência, essa mentira, essa falta de humanidade me envergonha, me angustia diariamente. Sou professora não por que quero que os estudantes pensem e repitam o que penso, mas porque desejo que aprendam que podem pensar e decidir os rumos de suas próprias vidas. Sou professora, não por que gosto de falar e ser ouvida, mas porque quero ouvir e questionar, e ensinar a questionar cada vez mais, cada vez mais profundamente. Não estou para ditar regras, mas para refletir sobre o nosso papel na vida social, com objetivos claros e razões simples. Sou professora porque ensinando aprendo: aprendo que não sei tudo, aprendo que ainda tenho muito a aprender, aprendo que preciso me aperfeiçoar, que preciso fazer melhor da próxima vez.

Como professora de Língua Portuguesa, sistematicamente, ouço a mesma pergunta: para que serve a  Gramática? E sempre respondo: não serve para comprar carros, jóias, casas, roupas caras; não serve para conseguir um emprego que te pague R$ 10.000,00 por mês; serve apenas para que a pessoa aprenda a não aceitar suas misérias, pois se cada um se tornar consciente de tudo que nos cerca, se aprender a ler o mundo, a vida, as pessoas, saberá investigar o que é legítimo e o que é ilegítimo e, assim sabendo, poderá tomar decisões responsáveis, mesmo que não sejam as mais acertadas. Mas, se assim fizer, não poderá usar a desculpa de que as tomou por ter sido enganado, por ignorar o que era correto. Então, a responsabilidade é de cada um. Para muitos – aqueles arrogantes que só acertam – isso se chama fraqueza, para mim isso se chama Ética. Mas quem quer ser ético? É mais fácil ser moral. A moral é móvel, muda conforme o contexto e conforme os interesses de cada indivíduo ou grupo. A Ética deseja ser perene, pois parte de princípios que buscam a universalidade e que, portanto, são desejáveis para TODOS. E nós, professores, devemos primar, sempre, pela ÉTICA.


 LIÇÕES DE GRAMÁTICA

Ao escrever, ou mesmo na expressão oral, deve o falante tomar cuidado na elaboração de determinadas sentenças que podem expô-lo à situação vexatória. Por vezes, o encontro da sílaba de uma palavra com outra forma uma nova palavra de sentido ridículo  ou até mesmo obsceno. A isso se chama Cacofonia, um vício de linguagem de natureza fonética, que vem do grego cacos = mau, feio, defeituoso + fonos =  som, voz. São exemplos que comumente escutamos ou lemos:

Tirei da boca dela. (cadela)

É mulher que se disputa. (se diz puta)

Vou-me já (vou mijar)

Como as concebo (como com sebo)

Essa é uma faca cara. (caca)

demais (fede mais)

Flávio Conceição pediu a bola e Cafu deu! (fudeu)

Eu mandaria um químico meu. (me comeu)

A cerca dela elétrica (cadela elétrica)

Confunde as senhas do banco (dê as senhas)

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Luísa Galvão Lessa Karlberg – Pós-Doutora em Lexicologia e lexicografia pela Université de Montreal, Canadá; Doutora em Língua Portuguesa pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. Professora e Pesquisadora Sênior da CAPES/UFAC.

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