Na noite passada, Sofi teve insônia. Trouxe a notícia por volta das 3h. E, embora eu dormisse profundamente quando ela entrou no quarto, me enterneci com a imagem de minha menina de quase 13, minha menina que anda tão apartada nesse último ano, confiando a mim seu desejo frustrado de se entregar ao sono. Nós, que estamos sempre nos opostos quando o assunto são suas madrugadas de games, seu avançar na noite de vídeo chamadas com os amigos, não precisamos dizer muito. Puxei o lençol, num convite para que deitasse comigo, lhe dei a mão e lhe inventei um sonho. Rimos e dormimos.
No noite anterior, foi a Lola quem não dormiu. Me acordou também exatamente às 3h. Não cogitou a possibilidade de deitar-se em minha cama, mas me chamou para a dela. Reclamou do calor – e fazia 16 graus em São Paulo -, reclamou do professor de arte e da dobradinha da aula de segunda, reclamou, reclamou, reclamou, me pediu pra apagar a luz e pegou no sono.
Fazia, ao menos, uns 5 anos que nenhuma das duas me procurava no meio da noite. Ao menos uns 5 anos em que estar acordada até altas horas não era, para elas, um problema. Foi simbólico que tenha acontecido justo neste fim de semana. Completamos nele um ano na casa nova. Esta mudança contém uma série de significados para a nossa família e se deu a partir de uma pequena revolução que não diz respeito a elas.
Como lidar com as mudanças que, embora não tenham sido buscadas por nós, nos acometem? Essa é uma pergunta cheia de ramificações para a psicanálise. É possível questionar o “não tenham sido buscadas por nós”, é possível questionar o “como” e o “nos acometem”. Daqui, escolho colocar na mesa o infinitivo do verbo. E responderia – mesmo que o lugar do analista esteja mais para a pergunta do que para a resposta – lidar lidando.
O gerúndio é a saída possível. As mudanças se impõem, e no último ano, estamos diante da clareza desta imposição. As nossas e as do mundo. Dispostos ou não, mudamos. E porque mudamos, já não dormimos da mesma forma, perdemos o sono, mas somos capazes de recuperá-lo. Seja no vir para perto, seja no chamar para perto, seja no reclamar ou no dar risada, desde que tentando, confiando, experimentando, vivendo, acordando. Boa semana, queridos.
Roberta D´Albuquerque é psicanalista, autora de Quem manda aqui sou eu e escreve semanalmente para A Gazeta do Acre e outros 17 veículos no Brasil, Estados Unidos e Canadá.