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Presença

Era meu aniversário. Com decoração, flores, bolo confeitado. De tão bem produzida, a festa tinha um pátio, vizinho ao pátio onde o palco estava sendo montado, somente para o estacionamento. Não para os carros dos convidados, mas para os trailers. Como aqueles do cinema, camarins para tomadas externas, sabe? O meu não era o único, mas o maior deles. Com maquiador, cabeleireiro e arara de roupas. De lá, eu assistia aos muitos produtores com aqueles fones no ouvido a organizar o que chegava e saía. Caminhões, caminhões e caminhões.

Uma batida na porta. Eu estou pronta, há muitas pessoas à minha volta. Gritamos quase que como nos preparando para começar um grande show. Pode entrar. É uma produtora, toda de preto, suada, chorando nervosa. Ela pede desculpas, soluça, atropela a fala com fungados e tosses.  “Não veio ninguém. Tá todo mundo no link.Esqueci de avisar que era presencial”. Acordei.

Semana passada, resolvi que neste mês eu voltaria a atender no consultório. Foi na quinta-feira. Até dificuldade pra dormir, tive (é raríssimo). Na sexta, escrevi pra cada um de meus analisantes, os que moram aqui em São Paulo, contando sobre a novidade. Daí já me dei conta de que mais da metade deles não mora em São Paulo – quase todos, nem no Brasil – e, portanto, muitos não voltarão ao consultório. Dos que estão aqui, nenhum, nenhunzinho, demonstrou interesse em voltar.

Era sábado e eu cheguei à conclusão óbvia de que já não fazia sentido manter a sala lá, o condomínio, a luz, a internet, a faxina. Comentei com as meninas e a tristeza foi geral. Em minha casa, tenho um quarto pequeno vazio para onde poderiam ir alguns móveis e de lá, numa versão consultoriozinho, eu atenderia virtualmente, como tenho feito de meu quarto. No domingo, tirei as medidas do quartinho e fui ao consultório(zão) para listar o que estava lá, o que viria pra cá, o que teria que ir embora.  Quando abri a porta da sala, tive um aperto no peito, um “calma, ‘peraí’”. Essa retomada está em seu início, cada um a seu tempo. O que agora é, pode não ser depois, está somente. A questão é de tempo verbal.

Hoje, quando acordei do sonho, ri da produção, quase literal, de meu inconsciente. Uma festa montada fisicamente para muitos que vão a ela de maneira virtual. Esse híbrido, tão falado nos últimos meses. Talvez a presença nunca tenha estado tão posta quanto agora. Há de estar presente para dizer de si, seja no escolher como se vai à própria análise, seja no bancar sozinho um espaço que lhe faça sentido, um ficar que lhe faça sentido. O consultório fica. Pelo menos por agora. Boa semana, queridos.

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