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Gente presente

Duas coisas eu sei fazer com excelência, e digo sem um único milímetro de falsa modéstia e, menos ainda, de síndrome da impostora. Eu sou boa de fazer gente e de presentear. Bem, o povo que eu fiz, vocês conhecem, quanto ao presentear funciona quase como uma caçada, uma aventura. Para ilustrar, em maio – veja bem, maio – uma pessoa muito querida me falou da busca que tem feito por um livro. É difícil, está fora de catálogo, sempre olho nos sebos e toda aquela conversa que chega a fazer cócegas no ouvido de uma presenteadeira. Aí pronto, estou procurando desde então. Adivinha, achei. Chegou em casa essa semana, o aniversário da dona do livro é em novembro. E não tem problema nenhum. Parte importante de saber presentear é saber esperar. E se o destinatário achar a própria cópia em agosto, setembro, outubro? Ué, eu falei, é como caçar, envolve riscos.

Ter esse bichinho instalado no couro não está exatamente ligado a ser ou não generoso. Tem a ver com se sentir sabedor do desejo do outro. Quase fofo de tão ingênuo. Sobre o povo que eu fiz, as minhas meninas, vão as duas pelo mesmo caminho e eu me orgulho. Nesse dia das mães, por exemplo, no mesmo maio, elas capricharam. Entre várias lembrancinhas – no sentido mais doce e no mais  literal da palavra -, me trouxeram um vinho. É possível que este tenha sido lembrado por Henri, o pai. Tomamos juntos esse vinho no natal, ele era o responsável pelas bebidas, fiz muitos elogios, já na má intenção. Colou.

Eu gostei tanto do presente que o escondi de mim mesma à espera da ocasião certa. Esqueci dele até ontem, quando fui visitar uma amiga que não via desde antes da pandemia. Saí de casa atrasada,  já estava no elevador quando tive o estalo. Voltei e achei o vinho. Combinamos de última hora, ela assou tomates, fez uma coalhada, pôs chocolate e pão na mesa, acendeu as luzes do terraço. Minha amiga perdeu a mãe. Eu queria abraçá-la, ouvir dela como se sente, como se sentiu, dizer da admiração que sempre nutri por sua mãe a quem vi poucas vezes, dizer o quão bonita considero a sua maternidade, ver sua filha, que ela também fez bem-feitíssima.

Hoje, quando escrevi para agradecer a noite, quando lembrei da noite, fiquei comovida. Fui para escutar e acolher e fiz como desejei. Mas, na minha ingenuidade, não pesquei o desejo dela. Teve escuta e acolhimento pra mim também, de muito. Teve ataque de riso e de choro, teve troca de segredos (eita!), teve amor. E tem mais, embora o sábado tenha sido de calmaria e calor, o cordão de bandeirinhas de dona Elusa não parou de balançar nenhum minuto. Estar com os nossos é a coisa mais bonita do mundo, o tipo de aventura que me interessa. Lu, obrigada pelo presente.

 

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