Cresce no mundo corporativo hoje, levados pela geração Z e pela exigência de trabalhos que respeitem a saúde mental dos funcionários, um fenômeno chamado quiet quitting, um termo que a priori parece acolhedor e caloroso, mas que muitas das vezes é um misto de pedido de socorro e libertação do funcionário celetista.
Mas afinal, o que é quiet quitting? Se formos traduzir ao pé da letra, o termo significa “desistência silenciosa” ou “demissão silenciosa”, mas, ao contrário do que parece, quem está aderindo a esse novo fenômeno não tem a menor intenção de pedir as contas. Isso porque o conceito vai além do fato de se estar ou não feliz no emprego, e de se demitir do cargo.
O quiet quitting implica dizer que o profissional tomou a decisão de limitar suas tarefas às estritamente necessárias dentro da descrição de seu trabalho, evitando longas jornadas e sobrecarga. Essa “virada de chave” visa estabelecer limites claros entre vida profissional e pessoal. Assim, tais pessoas cumprem com suas obrigações profissionais, mas não “vivem para trabalhar”. Eles reservam tempo para o lazer e a família e, quando chegam em casa, deixam o trabalho para trás.
Parece engraçado que as pessoas tenham que aderir a estes movimentos para estabelecer limites entre a vida pessoal e profissional, mas de fato é o que vem acontecendo. A pandemia, ao passo que flexibilizou a localização geografia do trabalho, tornou o empregado refém do seu trabalho justamente por não estar “nas vistas” da empresa. Sem controle, os empregadores sentem a necessidade de cobrar os trabalhos e metas estipulados quase que 24/7 por dia, deixando os empregados em prol da liberdade de localização, sem feriados e sem distinção do que é ou não é fim de semana. O horário comercial parece ter se estendido até o momento de o funcionário fechar seus olhos para dormir. Isto tudo é claro, sem nenhum tipo de acréscimo salarial.
Desta maneira, a única forma de protesto válido que o trabalhador encontra é passar a praticar o quiet quitting: trabalhar apenas pelo horário que foi contratado, se desligando totalmente de suas funções após o horário estabelecido.
Interessante que, o que deveria ser respeitado pela empresa sem nenhuma objeção, passa a se tornar um ataque direto a empresa, e aquele trabalhador que se atém as suas obrigações, passa a ser o inimigo pessoal do crescimento do negócio, pois, se estabelece limites para sua própria saúde, não está dando o seu melhor, logo merece ser demitido.
Fato é que o excesso de produtividade provoca no funcionário emoções exatamente opostas ao que deseja a empresa, o que faz com que o funcionário ou adoeça, ou coloque um basta na situação estipulando limites provocando demissões em massa, não por falta de produtividade, mas sim, descarte de profissionais que, por estarem psicologicamente doentes em virtude alta demanda da empresa, passam a praticar o quiet quitting ensejando no bom e velho: “ele pediu para sair com este comportamento.”.
Se estamos falando de uma cultura que espera entregas além, desempenhos excepcionais como regra, enquanto sobram exigências e demandas que extrapolam o limite em que o profissional conseguirá executar com qualidade, essa cultura deve ser questionada, pois é parte do que tem causado ou agravado diversos problemas de saúde mental como ansiedade, pânico ou depressão.
Ao mesmo tempo em que vivemos em uma sociedade de alto desempenho, atribuição de valor à pessoa vinculada a sua capacidade produtiva, muitas vezes ainda faltam aos gestores práticas básicas como uma comunicação assertiva, humana e honesta, a empatia de se colocar no lugar do funcionário ou identificar e distribuir sobrecargas. Um funcionário pode até aguentar entregar atividades excepcionais no curto prazo, mas a longo prazo, o resultado é o que estamos assistindo: o esgotamento emocional dos trabalhadores e grande rotatividade nas empresas.