Estava no final da fila de uma badalada e exclusiva boate de Búzios ciente que não entraríamos quando ela chegou deslumbrante num carrão que nem sei a marca. Reparei o corpo torneado, o sorriso e principalmente os olhos rápidos vistoriando tudo, mesmo com dois guarda costas. Também estava acompanhada de um belo estrangeiro. Não pediu, ordenou que avisassem que ela ia entrar, quase a meu lado. Fingi demência, acho que ela gostou e perguntou de onde nos conhecíamos. Disse que havia trabalhado na Globo do Acre, mas a conhecia muito da TV, Gloria Maria deu uma grande gargalhada, “do Acre? ” Vamos entrar!
Disse que estava com cinco pessoas. Sem problemas, devo ter um camarote aí dentro. Respondeu minha Deusa Master do jornalismo.
Gloria Maria representa: poder, inteligência, segurança, caráter, personalidade, identidade, possibilidades, viagens, vigor, humor, dança, música, boa bebida e flerte. Assim a guardei em meu coração e mente.
“Inveja de você? Inveja eu tenho é da Glória Maria que já carimbou todas as páginas de não sei quantos passaportes”. Adoro esse meme! E, realmente, na cabeça da maioria dos brasileiros Gloria Maria é a pessoa que foi a mais lugares. Na beira do vulcão, nas cataratas, no cume da montanha, qualquer canto do mundo. Ela esteve lá e conversou com as pessoas. A impressão que ela me passava é de ter uma coragem sem limites. Topar qualquer pauta. Tipo como o Tom Cruise é para o cinema, só que na ficção, ela era de verdade para o telejornalismo.
Glória Maria não parecia ter medo de nada. Nem de lugares inóspitos, nem de mega celebridades. Poucas pessoas são assim, capazes de enfrentar tudo. Dizer “eu faço” para o que a maioria tremeria nas bases. Talvez o fato de ter sido por muito tempo a única jornalista preta em destaque na televisão tenha relação com esse destemor que ela precisou forjar.
Ela sofreu racismo no Brasil e em vários lugares que visitou como repórter. Foi a primeira pessoa a fazer uma denúncia de racismo depois de criada a lei Afonso Arinos, a primeira de combate à discriminação racial no país. Em 1970, em um hotel de luxo, no Rio, o gerente pediu que ela entrasse pelos fundos (supondo que fosse faxineira). Ela disse que iria se hospedar e ouviu que negros não poderiam se hospedar ali.
O gerente denunciado pagou uma multa mínima e deixou o Brasil. Mas a atitude de Glória Maria foi um marco de reação ao racismo.
Com coragem, Glória Maria abraçou de repente a maternidade. De repente porque ela mesma afirmava que nunca havia pensado em ser mãe até ser arrebatada pelo amor pelas filhas ao fazer um trabalho voluntário em um abrigo em Salvador. Com coragem porque adotou sozinha e duas crianças de uma vez. Laura e Maria atualmente tem 14 e 15 anos. A mãe vai fazer falta, mas elas terão muito do que lembrar.
Glória Maria, inspiração para nós Mulheres repórteres de TV! A morte de amigas, (exagero. Não chegamos a tanto), sempre nos desestabiliza, nos deixa tristes, apesar de eu acreditar que seja uma passagem como o nascimento. Mas como perder Glória Maria na TV, não é?
O entusiasmo, a voz, o jeito “vou entrando”, ela sempre me inspirou. Fazia tudo de uma forma simples, conversando de boa, não me lembro de outra que fizesse isso como ela. Com elegância, ela sempre falava o que queria, do jeito que queria e ainda dava uma risada para arrematar. Glória Maria rompeu barreiras numa época que ser repórter de TV MULHER e NEGRA era quase impossível. E ela foi com tudo, fez absolutamente tudo na televisão, foi a primeira a entrar ao vivo no Jornal Nacional e inaugurou a era da alta definição da televisão brasileira. Mostrou mais de 100 países em suas reportagens e protagonizou momentos históricos.
Quem não lembra de alguma passagem da Glória em alguma reportagem pelo mundo? Eu lembro dela entre duas montanhas, se equilibrando em um cabo. Eu pensava: meu Deus, ela vai cair, mas ela sempre conseguia tudo. Uma super MULHER, grande pioneira.
Cconsagradissima jornalista brasileira Glória Maria, participou dos programas Fantástico e Globo Repórter, da TV Globo, além de ter sido repórter da emissora, morreu aos 73 anos, no Hospital Copa Star, no Rio de Janeiro. Diagnosticada com câncer de pulmão há quatro anos, que teve um tratamento bem sucedido, porém enfrentava metástases recentes do tumor no cérebro.
Uma de suas falas marcantes: “Sou uma pessoa que quero estar bem comigo. Sabe por quê? Eu vou morrer. Ninguém vai morrer por mim. Quem vai me julgar hoje, não vai se deitar no caixão no meu lugar. A vida é minha! ”
Foi simpática, generosa, simples e eu apenas, fingi costume. Muito obrigada por sua contribuição como mulher ao jornalismo brasileiro e por enfrentar o racismo de peito aberto. Você é uma GIGANTE que jamais será esquecida.
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