O meia Gustavo Scarpa, hoje no Nottingham Forest, é um amante de skate, esporte que pratica como hobby nas horas vagas de treinos e jogos como atleta de futebol. E seu sonho de entregar uma pista para a região de Hortolândia, São Paulo, acabou sendo um dos pontos que o fez manter seu investimento na Xland, empresa que “sumiu” com R$ 6,3 milhões do ex-Palmeiras.
Enquanto era cliente da Xland, ao qual foi indicado por Willian Bigode e uma empresa de investimentos em seu nome, a WLJC, Scarpa ouviu promessas de que receberia patrocínio para uma pista de skate em doações feitas por meio de renúncias fiscais.
O investimento no projeto seria uma forma de convencer Scarpa a não sacar seus investimentos feitos na Xland, empresa de criptomoedas agora acusada de pirâmide financeira.
Essa informação aparece em áudios e mensagens trocadas pelo atleta com a sócia ou em reuniões com pessoas envolvidas na história. Scarpa briga na Justiça para tentar reaver pelo menos parte dos R$ 6,3 milhões colocados na Xland, por indicação da WLJC, de Willian Bigode. O dinheiro do jogador sumiu, assim como de Mayke, também ex-Palmeiras.
Em agosto do ano passado, quando já desconfiava da Xland, Scarpa participou de uma reunião com o sócio da empresa, Gabriel, e com Camila, sócia de Bigode na WLJC, que marcou a reunião. Aquela foi a primeira vez que ele falou com o dono da firma de criptomoedas. O objetivo do encontro era convencê-lo de que as garantias da Xland eram seguras.
Em determinado momento da reunião, Scarpa mencionou seu apelido no skate. Então, Gabriel apontou que a Xland faz um trabalho institucional e que seria um prazer investir no projeto social da pista. “Já falei que a gente vai e vamos fazer situações periódicas. Mas pode contar com a gente nessa situação, sim. Vamos avançar com vocês e ajudar. Vai ser legal demais pra gente ver esse projeto social sendo realizado”, disse Gabriel.
O dono da Xland ainda disse que “andou a vida inteira de patins”, e foi complementado por Scarpa. “Vai ter patins lá (no projeto) também”. Em seguida, Camila disse que era bom para o jogador conhecer o dono da Xland. O meia, afirmou: “já vou passar a conta do instituto” e a sócia de Bigode emendou: “conversei com o Willian e também vamos ajudar o instituto”. A informação foi comemorada por Scarpa: “ah, moleque!”.
Camila continuou falando sobre renúncia fiscal. “Eu até quero ver com o contador a parte do abatimento fiscal. Pois o que a gente paga de imposto é muito alto. Se tivesse um jeito, ao invés de pagar, seria lindo”. Depois, Scarpa comemorou mais uma vez e falou: “não me iluda!”. A sócia continuou: “entre doar para a Receita Federal e o instituto, prefiro ajudar o instituto”.
“Estou encaminhando a conta do instituto para recebimento da grana”, brincou o meia. Mas a dupla despistou, dizendo que o investimento precisaria ser feito em renúncia fiscal. Camila, então, sugeriu o jogador a começar a reforma sem as doações, esperando elas entrarem. “Em 2, 3 meses tem 200, 300, 400 de cada um. Podemos ajudar o instituto a crescer”. Ela continuou dizendo que precisava entender como a jogada precisaria ser feita.
Posteriormente, o dono da empresa prometeu resolver como solucionar o investimento para ajudar o instituto de Scarpa. “Vou fazer um alinhamento para ver o que podemos ver de impostos para resolver essa situação do skate”, disse.
Camila, sócia da WLJC, reforçou o argumento na sequência. “Perfeito. Vou conversar com o Benegas e antecipei que vamos ajudar, o Willian vai me matar, mas finge que não sabe de nada, por favor (risos). É uma estratégia que estou maquinando aqui nesses 20 dias que estamos conversando mais focados e falei ‘gente, preciso colocar isso em prática de algum jeito’, preciso ajudar”.
“Vai se juntando aí e vamos concretizar isso, beleza?”, questionou Gabriel. “Fechado, ‘prazerzaço'”, respondeu Scarpa. “Valeu, Ca, ‘tamo’ junto”, emendou Scarpa.
Já em conversa posterior por Whatsapp, Camila ainda garantiu mais uma vez a Scarpa que o investimento era seguro, citando o mesmo assunto.
“Eu cuido das suas coisas como se fossem minhas. Jamais indicaria isso se não fosse bom. Jamais falaria que você está garantido e tem um seguro se não tivesse. Só quero que por toda confiança que tem em mim aguarde os documentos para te provar que está tudo bem. Se quiser mudar de seguro, eu converso com o Gabriel e arcamos com a despesa da troca. Mas você jogar fora R$ 1,2 milhão, por desespero. É metade da pista do seu projeto”, afirmou.
Esse valor, no caso, seria o da multa por rompimento com a empresa de criptomoedas. A assessoria de Scarpa confirmou que as doações à pista de skate não foram feitas. O meia também havia tentado levantar verbas para o projeto com outros patrocinadores, não apenas com a Xland.
Gabriel, da Xland, disse que “o evento citado não tem qualquer relação com o objeto do processo e não consegue compreender qual a relevância disso para a solução da lide”. Ele preferiu não comentar.
Procurada, a assessoria de imprensa de Willian e Camila disse que eles não se manifestariam sobre o assunto.
Na última quarta-feira (19), Gustavo Scarpa anexou cerca de 250 páginas de supostas provas contra o atacante Willian Bigode para comprovar o envolvimento do ex-companheiro de Palmeiras no processo que move para tentar reaver os mais de R$ 6 milhões investidos em criptomoedas com a Xland.
Em petição enviada na última terça-feira à 10ª Vara Cível da Justiça de São Paulo, Scarpa anexou áudios e conversas de Whatsapp com Bigode e seus sócios na empresa WLJC e com a Xland. O objetivo é mostrar a relação de consumo e a intermediação feita no negócio.
Entenda o caso
A Xland virou pivô do noticiário esportivo e policial nos últimos dias, por ter feito Scarpa e Mayke irem à Justiça não só contra a empresa, mas também contra o ex-companheiro de Palmeiras Willian Bigode.
Os jogadores dizem que receberam a indicação da Xland por meio da empresa WLJC Consultoria, que tem Willian Bigode como sócio. Mayke diz que investiu R$ 4,5 milhões, e deveria ter um retorno de R$ 3,2 milhões. Scarpa, por sua vez, colocou R$ 6,3 milhões na Xland. Nenhum dos dois, contudo, conseguiu receber as quantias de volta quando tentaram reaver os investimentos.
Eles dizem que tinham uma relação de amizade com Willian. Por isso, depositaram suas confianças no jogador, que posteriormente os indicou à Xland para realizarem os investimentos.
Em nota enviada à reportagem quando a polêmica veio a público, Willian Bigode e a empresa WLJC se disseram vítimas da Xland, tendo realizado investimentos de R$ 17,5 milhões que, mesmo tendo o pedido de resgate sido feito em novembro do ano passado, até hoje não foram devolvidos.
Por sua vez, a Xland nega que tenha dado golpe em seus clientes. A empresa alega que teve recursos congelados em processo de recuperação judicial da corretora criptomoedas FTX nos Estados Unidos.
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