Luiz aprendeu a andar de bicicleta essa semana. Minha amiga Yana, a mãe do ciclista, foi generosa o suficiente para me mandar o vídeo da primeira volta completa. Do alto de seus sete anos recém-feitos, o menino, tão comprido quanto doce, ria para o girar dos pneus. Foi a imagem mais bonita do meu feriado. Mandei pra ela uma música que ouvíamos as meninas e eu, quando elas, mais ou menos da idade dele, aprendiam a dar suas voltas no skate. O refrão diz assim: cai, levanta, vai de novo, cai, levanta, vai de novo, cai, levanta, vai de novo, cai, levanta, até conseguir. Soube agora há pouco, antes de sair pra buscar minha Sofi, já adolescente, na casa de um amigo, que ele caiu grandão. E que foi o cai, levanta da música que deu também uma levantadinha na moral pra próxima tentativa.
No táxi a caminho da Sofi, logo depois do primeiro “oi”, ouvi o de sempre “você não é daqui é?”. O motorista também não era. “Sou do interior do Rio Grande do Norte, uma cidade que se chama Passa e Fica”, me disse. “Acabei de deixar meu filho e um amigo que também é de Recife na rodoviária”, e completou, “voltaram para as Agulhas Negras”. Soou parecido com a Yana. Orgulho vazando de cada poro.
Gabriel, o filho do motorista, soube que queria a carreira militar desde os três, quando calçou as botas do pai, agora policial aposentado. “Ia até o fim da perninha dele, não tinha força nem pra se mexer, mas fazia cara de profissional paradinho no mesmo canto.” No fim do ensino médio, fez cursinho preparatório e não se inscreveu em nenhum outro vestibular. Só Agulhas Negras fazia sentido. Todos certos de que em poucos meses estaria calçando as próprias botas. Não passou. No ano seguinte, fez de novo, e de novo e de novo. A quarta tentativa seria a última. Há um limite de idade para entrar na formação e Gabriel estava prestes a completar 21.
Já o filho mais velho queria engenharia, e só se fosse numa pública. Passou de primeira na federal, mas em Campina Grande. Quase três mil quilômetros de distância de casa, ele menino ainda, não tinha nem 18. Só tomou coragem pra dizer que já não aguentava a saudade no terceiro ano. Voltou, estudou, fez o Enem de novo e passou na Unesp de Bauru. Gabriel ainda tentando entrar nas Agulhas Negras. No dia da saída do último listão, o mais velho acordou às 4h, não conseguiu dormir mais. Plantou-se diante do computador a apertar o recarregar do site. Foi o primeiro a ver o nome do irmão, ligou pra casa dia clareando. “Gabriel passou, Gabriel passou”.
O motorista contou chorando, imitando a voz do filho que deu a notícia e o grito do que recebeu. Lembrei de Lia, irmã de Luiz, que no vídeo assistia vibrando à conquista num vestidinho voador de mulher maravilha. E também chorei. Pelo motorista, por Gabriel, pelo engenheiro que se forma esse ano, por Lia, por Luiz e por Yana. A vida é bonita, não é? Todo mundo de Passa e Volta. Todo mundo no cai, levanta e vai de novo. Conseguindo ou não. Boa semana queridos.
@robertadalbuquerque