Que calor é esse?? Que tempos são esses? Tem algo estranho acontecendo? Que falta de sentido é essa? Que tristeza é essa? Não sei o que quero… Que indecisão é essa? Não é normal. Essas são algumas demandas que ouço, diariamente. É como se o “inferno” já estivesse aqui. Fico imaginando, então, o poema de Manuel Bandeira: “Vou-me embora pra Pasárgada. Lá sou amigo do rei. Lá tenho a mulher que quero. Na cama que escolherei.”
O advérbio – lá – me traz a sensação de que nós, incluo todos nós da era contemporânea, estamos vivendo um eterno “lá”, em algum lugar em que tudo é perfeito e do jeito que quero. E aí me questiono: como conviver melhor com essa demanda, da melhor forma e, assim, não vivermos um eterno : “vou-me embora pra Pasárgada. Aqui não sou feliz. Lá a existência é uma aventura. De tal modo inconsequente. Que Joana a Louca de Espanha. Rainha e falsa demente. Vem a ser contraparente. Da nora que nunca tive”…?
A anedonia que vai se instalando, pouco a pouco, em todos os que de, forma triste, relatam que não tem mais prazer e satisfação, nas coisas corriqueiras e simples da vida, nas quais, um dia, foram felizes, é latente e recorrente, assim como o verso que fala: “E como farei ginástica. Andarei de bicicleta. Montarei em burro brabo. Subirei no pau-de-sebo. Tomarei banhos de mar! E quando estiver cansado. Deito na beira do rio. Mando chamar a mãe-d’água. Pra me contar as histórias. Que no tempo de eu menino. Rosa vinha me contar. Vou-me embora pra Pársagada”. Ou seja, ficamos, eternamente, num ir e vir do excesso de passado e aflitiva preocupação com o futuro. Não é à toa que os transtornos mais comuns na nossa sociedade sejam a depressão e a ansiedade.
Porém, de alguma maneira, vêm lampejos de esperança para qualquer um que tem um “refúgio” para chamar de seu. Um lugar interno, no qual tudo é possível do nosso jeito, na nossa forma, e de acordo com o que acreditamos. ALERTA DE PERIGO. E aí, nós, de fato, acreditamos que: “Em Pasárgada tem tudo. É outra civilização. Tem um processo seguro. De impedir a concepção. Tem telefone automático. Tem alcaloide à vontade. Tem prostitutas bonitas. Para a gente namorar.” Caramba, risos, até eu quero ir embora pra Pasárgada.
Ocorre, que deixando as brincadeiras de lado, não podemos trabalhar com a hipótese de que teremos esse lugar onde nenhuma contrariedade existe, e aí vem uma das coisas que mais me aflige atualmente: a ideia presente para as novas gerações de acharem que tudo, tudo mesmo tem que ser do nosso jeito, porque a nossa “bolha” nos convence, diariamente, de que é assim que as coisas devem ser….Aí mora o PERIGO, e, temos assim, a última estrofe do poema supracitado: “E quando eu estiver mais triste. Mas triste de não ter jeito. Quando de noite me der. VONTADE DE ME MATAR – LÁ SOU AMIGO DO REI – Terei a mulher que quero. Na cama que escolherei. Vou-me embora pra Pasárgada.”
No mês que estamos, exaustivamente, falando sobre suicídio, o “SETEMBRO AMARELO”, quero esclarecer que essa vontade de atentar contra a própria vida, ideação suicida, não tem somente a causa exclusiva relacionada às demandas existenciais, mas pode ser também decorrentes de alguns outros transtornos, porém temos por dever moral e ético estarmos atentos e com verdadeiros olhos “clínicos” para o nosso entorno e, quando perceber qualquer vestígio de possibilidade de sofrimento em demasia, com característica bem peculiares de “vontade de sumir” literalmente, procuremos os devidos caminhos seguros e indispensáveis para o devido tratamento dessas pessoas.
É um comportamento político-social também zelarmos pelas pessoas que não estão conseguindo lidar com suas mais íntimas questões. Sociedade feliz com satisfação e bem-estar passa pela interação social e preocupação com o outro.
Podendo, assim, vivermos verdadeiramente os 7 pilares da saúde e bem-estar, e fazer ginástica, andar de bicicleta, montar num burro brabo, subir num pau-de-sebo, tomar banhos de mar, e quando o cansaço bater; deitar numa atitude contemplativa, na beira do rio, chamar a mãe-d’água, para recordar histórias que, no tempo de menino, eram contadas por Rosa (figura de apego) e, então, a minha “Parságada” está no aqui e agora.
A minha gratidão a Manuel Bandeira, que me inspirou a fazer uso de seus versos e prosas.