Mais de 130 artistas acreanos assinaram, nas últimas horas, um manifesto contra a realização de cultos de qualquer denominação religiosa em espaços públicos da capital voltados à arte. O protesto se deu após 24 igrejas evangélicas usarem a Filmoteca Acreana, no Centro, por 24 horas ininterruptas para celebrações de fé, o que, segundo os manifestantes, descaracteriza a finalidade do espaço.
Uma portaria publicada em março, pela Fundação de Cultura Elias Mansour (FEM), órgão do governo responsável pela gestão dos espaços artísticos, determina que eventos de outra natureza podem ser realizados nesses ambientes, desde que não descaracterizem os aspectos culturais, históricos e curatoriais destes.
“Um culto religioso, realizado no espaço de uma Filmoteca – a única do Estado do Acre – descaracteriza a finalidade do espaço”, conclui o manifesto. Os artistas alegam ainda dificuldades para agendamento de suas atividades nos “poucos espaços em funcionamento”.
“Na própria Filmoteca Acreana, o único projeto de cinema coordenado por jovens cineclubistas, já em atuação há mais de 14 anos, enfrenta frequentemente problemas de agendamento, mesmo que com atividade a cada 15 dias”, justifica a nota.
Atualmente, Rio Branco conta com cerca de 10 espaços culturais, administrados pela FEM, em funcionamento, entre eles a Concha Acústica, Teatro Barracão Matias, O Casarão, Filmoteca Acreana, Memorial dos Autonomistas, Cine e Teatro Recreio, auditório do Museu da Borracha, Usina de Arte, Galeria Juvenal Antunes e Museu dos Povos Acreanos.
Por outro lado, em 2014, o número de igrejas protestantes na capital passava dos 1.300, segundo divulgou, na época, a entidade “Liderança Evangélica”. A reportagem não conseguiu dados atuais sobre a quantidade de templos em Rio Branco, no entanto, o presidente da Associação dos Ministros Evangélicos do Acre (AME-AC), Eldo Gama, garantiu que, nove anos depois, esse número deve ser “um pouco maior, afinal muitas novas igrejas surgiram”.
Gasto de dinheiro público
O manifesto artístico cita ainda o gasto de verba pública para a realização de eventos promovidos por igrejas (que são pessoas jurídicas de direito privado) em ambientes públicos.
“Trata-se de um espaço público climatizado, equipado com áudio e vídeo, segurança, energia elétrica, água, banheiros – tudo pertencente ao patrimônio público – sendo utilizado durante 24 horas para fins privados, para não falarmos dos servidores que têm a função de dar suporte técnico e promover o bom funcionamento do local – nesse caso, trabalhando em horário extra-turno, o que representa mais despesas com direitos trabalhistas”.
Diante disso, os artistas locais recomendam aos conselhos estadual e municipais de Cultura que elaborem, com urgência, diretrizes para o uso de todos os espaços culturais do estado. Além disso, cobra do Ministério Público do Acre (MPAC) providências.
Por fim, o manifesto pede ainda esclarecimentos por parte do diretor-presidente da FEM, Minoru Kinpara, sobre o ocorrido. Procurado pela reportagem, o órgão afirmou, por meio de sua assessoria, que não irá se manifestar.