Ao longo de toda a temporada 2023, o Flamengo emitiu apenas cinco informes sobre as condições físicas de Gabigol, que alegou esta semana ter atuado boa parte do ano machucado. O jogador disse que a contusão atual se deu no Mundial de Clubes, mais precisamente no dia 11 de fevereiro, contra o Al-Ahly. Pois bem. O clube só informou sobre o problema no adutor da coxa direita em novembro, nove meses depois, quando Gabigol já era reserva e o título brasileiro uma missão bem complicada.
As declarações de Gabigol em alto e bom som ao podcast “Podpah”, depois da confirmação da temporada frustrante, ilustram, contudo, a insatisfação do camisa 10 e de outros jogadores do elenco com a forma como o departamento de futebol do Flamengo conduz esse tipo de assunto no dia a dia. Na prática, o Flamengo minimizou e abafou o desgaste do jogador ao longo dos últimos meses, ainda que o atleta jamais tenha sido forçado a jogar e sempre concordado em entrar em campo.
Incômodo afetou outros atletas
Gabigol não é o primeiro a indicar, publicamente ou não, que os jogadores ficam expostos para que a direção do Flamengo não fique com a imagem negativa de que o clube tem muitas lesões. O último a viver tal situação foi o zagueiro Rodrigo Caio, que conviveu com problemas físicos por dois anos seguidos, e o Flamengo já não contava com o atleta mesmo indicando que ele estava apto para jogar.
Já houve o mesmo tipo de conduta ao longo no último ano com David Luiz. O modus operandi passa pelo departamento médico, mas, no fim das contas, se traduz em uma determinação da cúpula do futebol para o departamento de comunicação, que nos comunicados divulgados ao público costuma atenuar os problemas físicos, o que leva a uma informação pela metade e truncada.
Normalmente, o clube indica que são feitos trabalhos de recondicionamento, quando na verdade muitas vezes o atleta está também em tratamento de lesão, ainda que leve. Internamente, o departamento médico lida com o tema de maneira corriqueira, pois é natural que os atletas joguem com dor. Os próprios jogadores naturalizam esse processo. O clube, não.
“Tratei nas paradas da Data Fifa, mas não consegui estar 100%. Tinha que ter parado em algum momento ali. É tudo em consenso com médico, treinador na época, que era o Vitor Pereira, depois Sampaoli, Tite. É por desgaste, há cinco anos sou o que mais jogo. Isso desgasta e meu corpo pediu: “Calma aí um pouquinho. Foi um risco assumido, eu faço parte disso” emendou Gabi.
Recentemente, o Flamengo recuperou Arrascaeta a tempo de atuar na final da Copa do Brasil sem as condições físicas ideais. O meia conviveu por meses com uma pubalgia que o clube também tratou sem fazer tanto alarde.
Bruno Henrique, que também se recuperou de grave lesão este ano, teve recaída, física e emocional, e foi afastado para tratar os efeitos colaterais do problema no joelho, até voltar em bom nível. Na época, também se mostrou insatisfeito com o fato de o Flamengo não revelar os processos de sua recuperação, parecendo que não voltaria a atingir a sua melhor forma.
Tite ameniza desgaste
O desgaste dos atletas passou, em 2023, pela dificuldade de comunicação dos técnicos Vitor Pereira e Sampaoli. Mas mesmo os dois estrangeiros costumavam revelar, após as partidas, que alguns atletas não eram utilizados por questões físicas que o Flamengo não havia comunicado previamente. A situação passou a mudar um pouco com a chegada de Tite.
O novo comandante tem por hábito tratar os assuntos internos com a maior transparência possível, ainda mais quando isso pode gerar uma repercussão negativa para um de seus atletas. Tanto que costuma levar seus auxiliares para complementar explicações. E fez isso com a preparação física para limpar a barra de Rodrigo Caio e posteriormente de Gabigol e outros jogadores, como David Luiz e Allan. Esses comunicados aconteceram perto do fim do Brasileiro.
Sobre Gabi, o primeiro aconteceu no dia 5 de junho, quando o atacante ficou de fora da partida contra o Vasco por apresentar uma lesão no músculo quadríceps da perna esquerda. Em 11 de junho, o Flamengo informou que Gabigol foi substituído no intervalo pois estava retornando dessa lesão.
Apenas no dia 4 de novembro o Flamengo sinalizou de maneira oficial que dores apresentadas por Gabriel Barbosa levariam à realização de um exame, e que por isso ele ficaria fora da partida contra o Fortaleza, pelo Brasileiro. Eram as dores que confirmariam a lesão atual. Em 8 de novembro, o Gerente de Saúde e Alto Rendimento do Clube, Márcio Tannure, se pronunciou para comunicar o problema físico de Gabigol. Na ocasião, informou sobre a sobrecarga no tendão do músculo adutor da coxa direita, mas o Flamengo não permitiu qualquer questionamento ao profissional.
No dia 5 de dezembro, o Flamengo informou que Gabigol foi submetido a um procedimento regenerativo para reparo na lesão do tendão do adutor direito, e que por isso não foi relacionado para a última rodada do Brasileiro. O atacante já estava sem ser acionado por Tite há alguns jogos, exposto a críticas por ser o único que não tinha chance, em um momento em que o Flamengo ainda brigada pelo título do campeonato. A reportagem tentou contato com a direção do clube para buscar um posicionamento mas não houve resposta.
Fonte: Extra