No dia 4 de dezembro de 1963, Arnon de Mello (PDC-AL), pai de Fernando Collor de Mello, preparava-se para utilizar o microfone do Senado Federal. A possibilidade de discursar era acompanhada pela ameaça de morte. Poucas horas antes do início da sessão, em um telefonema anônimo, foi alertado de que o senador Silvestre Péricles (PTB-AL) espalhava a notícia na sala do café do Senado de que, caso Arnon decidisse falar naquele dia, “encheria sua boca de balas”.
Conforme relatos, Silvestre planejava assassinar seu adversário caso ele decidisse discursar. Assim, naquele dia, quando Arnon começou a fazer o discurso de abertura da sessão, o ambiente de duelo faroeste dentro do Congresso Nacional se formava.
Moura Andrade declarou que a presidência garantiria ordem e respeito essenciais no Senado, dentro dos limites máximos de sua autoridade. Em seguida, passou a considerar a possibilidade de algum crime iminente. “Se houver qualquer delito, será imediatamente aberto inquérito e lavrado o auto de flagrante”, completou o presidente do Congresso na época.
Logo depois, às 15 horas e 3 minutos, Arnon de Mello solicitou permissão para dirigir suas palavras “ao nobre senador Silvestre Péricles”, que o teria “ameaçado de morte”. Silvestre gritou: “Canalha! Crápula! Cafajeste!” Foi nesse momento que Arnon sacou a arma e efetuou três disparos em plena sessão, atingindo o senador José Kairala, do PTB do Acre, que havia sido recentemente empossado como suplente. Ouça o áudio abaixo:
Silvestre conseguiu desviar dos tiros e se agarrou ao Senador João Agripino. Ele então interveio, impedindo qualquer retaliação armada. Ambos os adversários foram detidos, enquanto o senador inocente, José Kairala, faleceu cinco horas após ser atingido no abdômen, após a sexta parada cardíaca e várias transfusões. Arnon justificou os tiros alegando legítima defesa, argumentando que Péricles o havia ameaçado com um disparo anterior. No entanto, testemunhas contradisseram essa versão, afirmando que Péricles não estava armado
O estoque de plasma do hospital foi completamente utilizado, totalizando mais de 15 litros de sangue no processo. Durante a tarde, vários parlamentares haviam se oferecido para doar sangue na esperança de salvar o colega, que deixou três filhos pequenos e uma viúva grávida de 7 meses.
Kairala José Kairala, de 39 anos, ocupava o mandato por acaso. Natural de Manaus, mudou-se para Brasiléia, na fronteira do Acre com a Bolívia, após um ano atuando como comerciante e prefeito. Ele era suplente de José Guiomard (PSD-AC), licenciado devido a uma pneumonia.
Em 4 de julho daquele ano, ele assumiu o assento no Senado, cheio de entusiasmo pela oportunidade. Segundo o senador Adalberto Sena (PTB-AC), Guiomard planejava retomar seu mandato no mês anterior ao trágico evento. No entanto, a pedido de Kairala, concordou em adiar o retorno ao Congresso.
Em 3 de dezembro, a licença de José Guiomard expirou. Em seu livro de memórias, Auro de Moura Andrade recordou que, naquele mesmo dia, José Kairala o procurou em seu gabinete, solicitando autorização para participar da sessão do dia seguinte. Alegou que o titular só chegaria a Brasília no dia 5 e expressou o desejo de ter sua família presente para testemunhar seu último dia como senador. Auro consentiu com a presença de Kairala no plenário, sob a condição de que ele não tomasse a palavra nem participasse da votação da ordem do dia.
Revista Fórum