O cigarro de palha, o famoso “paieiro”, muito consumido no interior do país, em especial em áreas rurais, tem ganhado cada vez mais espaço nas grandes cidades, entre um público inusitado: os jovens. É cada vez mais comum ver adultos jovens enrolando seu próprio cigarro em papel de seda ou em uma casca de milho nos bares e baladas.
Além do apelo quase ritualístico da prática, os adeptos acreditam que estão consumindo um produto mais natural e menos prejudicial para sua saúde do que o cigarro industrializado comum. Entretanto, especialistas ouvidos pelo GLOBO são categóricos em dizer que isso não é apenas um mito quanto o cigarro de palha pode ser ainda mais prejudicial que o tradicional em muitos aspectos.
— Por ser um fumo de corda picado, considerado natural, existe esse mito. Mas essa crença é completamente inadequada — afirma a pneumologista Milena Tenório Cerezoli, da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo
Devido ao seu processo de preparo, o cigarro de palha possui mais nicotina e mais alcatrão do que o cigarro convencional. Isso torna esse produto mais tóxico por unidade.
— A gente considera que um cigarro de palha equivalente a três cigarros convencionais. As pessoas acham que estão fumando menos, quando estão fumando exatamente a mesma coisa — alerta o pneumologista Paulo Corrêa, coordenador da Comissão de Tabagismo da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT) e professor da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP).
Além de conter uma maior quantidade de monóxido de carbono por unidade, o cigarro de palha não possui substâncias que mantém sua queima enquanto a pessoa não está tragando, como acontece com o cigarro tradicional. Para fator de comparação, o fumante do cigarro industrializado normalmente fuma de dois a três quintos do cigarro porque entre as tragadas, ele continua queimando. Já o cigarro de palha simplesmente apaga e pode ser aceso novamente, o que significa que a pessoa fuma o cigarro inteiro.
Segundo Corrêa, existem vários estudos, inclusive brasileiros, que mostraram que o fumante de cigarro de palha desenvolve doença obstrutiva crônica pulmonar (DPOC) mais cedo que um usuário de cigarro tradicional ou chega a um grau mais elevado da doença fumando um número três a quatro vezes menor de cigarros por dia.
A ausência de filtro é outro ponto que pesa contra o cigarro de palha. Embora o filtro não traga uma grande proteção no que diz respeito a inalação de substâncias tóxicas, sua ausência gera um aquecimento maior na região da boca, o que aumenta ainda mais o risco de outros tipos de tumor, como câncer de boca, laringe, esôfago e faringe.
Quanto à crença de que a fumaça do paiero gera menos substâncias tóxicas, os especialistas garantem que não. É justamente o processo de queima do tabaco, a combustão, que produz essas substâncias. E há combustão tanto no cigarro convencional quanto no de palha.
Portanto, o cigarro de palha carrega os mesmos riscos do cigarro tradicional e de outras formas de consumo de tabaco por combustão, como charuto, cachimbo e narguilé. São elas: aumento do risco de pelo menos 16 tipos de câncer, sendo o principal o câncer de pulmão; aumento do risco de doenças cardiovasculares, como angina, infarto e AVC; de doenças respiratórias, como DPOC, também chamada de bronquite crônica ou enfisema e aumento da suscetibilidade e da mortalidade por tuberculose.
— Tem mais um detalhe que é muito pouco estudado, que são as substâncias geradas pela queima da palha, além de todas as substâncias geradas pela queima do tabaco em si. Então, ao contrário do que se pensa, na realidade você está exposto a um risco maior — avalia Corrêa.
Outro dano apontado pelos especialistas é o alto potencial de vício gerado por esse tipo de cigarro, devido à presença de altos níveis de nicotina.
— Independente da apresentação, todos os tipos de tabaco levam à dependência — afirma a cardiologista Jaqueline Scholz, diretora do Programa de Tratamento do Tabagismo do InCor.
Reportagem do Globo, confira o material completo
O Globo