Em média 4 mil pessoas são internadas por mês no Brasil com quadros de dengue clássica ou hemorrágica em unidades do Sistema Único de Saúde (SUS), de acordo com dados do Ministério da Saúde consolidados até dezembro de 2023. As internações devido à doença no ano passado causaram um custo de R$ 19,7 milhões ao Poder Público e, junto com o aumento de casos neste início de ano, preocupa a União e os governos estaduais e municipais.
As internações até o fim do ano passado ainda não refletem, porém, a explosão de casos neste início de 2024. Nas duas primeiras semanas do ano, o número de casos de dengue no país mais que dobrou em relação ao mesmo período em 2023: foram 120,8 mil casos agora ante 44,7 mil no ano passado. Em 2023, o Brasil registrou 1,6 milhão de diagnósticos de dengue e 1.094 óbitos — foi o ano com maior número de mortes por conta da doença. Até então, 2022 era o que tinha registrado mais vítimas: 1.079.
Em hospitais da Rede D’Or pelo país, por exemplo, os casos da doença dispararam 307% neste janeiro em relação ao mesmo período do ano passado.
Desde o início deste ano, a doença causou 12 mortes, de acordo com dados do Ministério da Saúde.
Para frear o avanço da doença, gestões estaduais e municipais em todo o país passaram a adotar medidas emergenciais de prevenção enquanto ainda não dispõem da vacina contra a dengue, como intensificação de mutirões de limpeza e fumacê, tendas improvisadas de atendimento aos doentes e campanhas de incentivo ao combate.
O Brasil é o primeiro país no mundo a oferecer o imunizante na rede pública, mas enfrenta o desafio da baixa quantidade de doses. Quem pode tem recorrido à rede privada. Entre novembro e janeiro, a procura pela vacina contra a dengue nas grandes redes de farmácia aumentou em até 400%. Já a procura por testes rápidos subiu 500%.
Membro da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), o médico Julival Ribeiro explica que as alterações climáticas provocadas pelo fenômeno El Niño facilitam a infestação do mosquito transmissor da doença, o Aedes aegypti, e são uma das causas para a explosão de casos no país.
— Calor e chuva intermitente são a combinação perfeita para a dengue. A reprodução do mosquito fica muito mais propícia nesse ambiente. Quanto mais alta a temperatura, mais mosquitos (nascem) e mais longo é o tempo de vida deles — diz.
O especialista explica que não somente há crescimento no número de casos, como também uma expansão geográfica das regiões afetadas pela doença. É o caso do Sul: antes “praticamente sem casos”, nas palavras de Ribeiro, tornou-se a segunda região com mais ocorrências da doença em 2023.
— Estávamos com um prognóstico de aumento de casos nesses meses que tem se confirmado. Esse aumento não se dá de forma uniforme e acontece principalmente nas regiões Centro-Oeste e Sudeste. Neste momento temos que continuar a fazer o controle e organizar a rede (do SUS) — avaliou a ministra da Saúde, Nísia Trindade, na entrevista coletiva realizada na última quinta-feira, onde anunciou a estratégia de vacinação contra a dengue no SUS.
O governo prevê começar a aplicar a vacina no início de fevereiro, mas o número de doses é suficiente apenas para atender o público de 10 a 14 anos em regiões com alta transmissão da doença — 521 municípios em 16 estados serão contemplados.
Foram selecionadas cidades de mais de 100 mil habitantes com alta transmissão de dengue, com predominância do sorotipo dois. A vacinação irá abranger todas as regiões do país. As doses adquiridas dão conta de vacinar 3,2 milhões de pessoas neste ano. Para 2025, segundo o ministério, estão asseguradas 9 milhões de doses.
Para crianças abaixo de 10 anos, adolescentes acima de 14 anos, adultos e idosos, ainda não há previsão do início da vacinação gratuita.
O surto da doença no Distrito Federal levou a Justiça a autorizar agentes de saúde a entrar em imóveis sem permissão e abandonados para combater criadouros do mosquito. Com mais de 16 mil casos de dengue confirmados, o governo do DF decretou situação de emergência na saúde pública.
A capital do país ainda pediu ajuda do Ministério da Defesa para conter o avanço da doença. As Forças Armadas irão dar apoio aos agentes nas ações de campo para combater o mosquito.
— A vacina vem nos dar um alento. Porém, não temos quantidade suficiente. Então temos de fazer nosso dever de casa, nossa parte. Vamos conversar com o Ministério da Defesa e pedir apoio — afirma a secretária de Saúde do DF, Lucilene Florêncio.
Após o anúncio do DF, os estados do Acre e de Minas Gerais também decretaram emergência por dengue. O status, segundo o Ministério da Saúde, define “o emprego urgente de medidas de prevenção, de controle e de contenção de riscos, de danos e de agravos à saúde pública em situações que podem ser epidemiológicas (surtos e epidemias), de desastres, ou de desassistência à população”.
A primeira remessa de vacinas, de 750 mil doses, já chegou no país, mas precisa passar ainda pelo processo de liberação da Alfândega e da Anvisa para, depois, ser enviada para o Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS).
O Ministério da Saúde afirma aguardar a liberação da Anvisa e do INCQS para iniciar a distribuição. De acordo com o diretor do Programa Nacional de Imunizações (PNI), Eder Gatti, o processo leva de uma a duas semanas.
O Globo