Séculos atrás, Shakespeare advertia que “os homens deviam ser o que parecem ou, pelo menos, não parecerem o que não são”, porém esta frase nunca fez tanto sentido como nos dias atuais, onde praticamente nada é aquilo que realmente parece ser. Todo mundo até continua sendo o que de fato é, mas ninguém é mais aquilo que aparenta ser.
Botox, silicone, photoshop, pro tools, IA, todas ferramentas criadas para enganar os nossos sentidos e assim tentar convencer nosso coração de que o feio é belo, o mau é bom e até mesmo o imbecil é inteligente. Funciona mais ou menos como aquelas fotos de fast foods, que enganam os olhos para convencerem o estômago. Você pede aquele lanche vistoso do cardápio, mas recebe a versão trucidada, já praticamente mastigada por um tubarão, e não tem para quem reclamar.
Algumas vezes a gerente troca por um outro pior ainda, uns até com ingrediente especial orgânico, que é melhor não saber a origem. Gerente este, aliás, que estampa a foto de funcionário do mês, outra enganação, já que na minha humilde opinião, sempre quem sai ali é o pior do mês, por isto, de castigo, botam o infeliz naquele quadro na parede, em seu pior ângulo fotográfico, só para pagar mico e ser zoado pelos consumidores.
O mais bizarro é que cada vez mais o preço de tudo está baseado na imagem e jamais no produto, já notaram?
Existem também sites, digamos assim, de conveniência masculina, que no popular se chama prostituição, que é a mesma coisa. Na foto exibem uma sósia de Gisele Bündchen, porém assim que o necessitado paga por uma hora de prazer com a Mulher Maravilha, acaba tendo a surpresa de ter de passar uma hora com a realidade, trocando fluídos com a XXXXXX.
Vivemos, a era da aparência, onde tudo é disfarçado por maquiagem mecânica criada pelo homem para enganar, mas não é só no Instagram, onde beldades acumulam milhões de seguidores, que a mentira prevalece, pois ágil como é, está em tudo ao mesmo tempo sem percebermos.
Na música, por exemplo, com recursos como ProTools, ferramenta que modifica por completo a voz do “cantor” conseguindo até mesmo afiná-la, geralmente compra-se gralha por lebre. Não vamos citar nomes, mas quem já viu alguém ao vivo, e preferia que tal astro estivesse “ao morto”? A pop star Anitta fez playback no show dos 40 anos da Marquês de Sapucaí.
O fato é que os cisnes cantam antes de morrer, mas ultimamente no Brasil, melhor seria se algumas personalidades da música morressem antes de começarem a cantar, não é mesmo? Admita!
Surgiu agora a onda do photoshop literário, aquele que consegue maquiar até mesmo o passado, levando a alcunha de “autobiografia”. Existe uma febre de livros escritos por astros sobre suas vidas, evidente que elaborado por um host writer, de forma a iludir o leitor, pois tudo não passa de ficção barata. Noventa por cento do que você lê ali é mentira e dez por cento é delírio de quase verdade. Muito parecido com livros de coachs e mentores, gente medíocre, porém esperta, que se utiliza de frases feitas e das mesmas técnicas de mentira, para ludibriar o imbecil coletivo. Mas nesta onda de maquiagens tecnológicas, bem que poderiam criar o photoshop para as palavras que saem de nossa boca. Já pensou? Seria automático. Você diz o que realmente sente, mas no processo, a pessoa ouve o que de fato ela queria ouvir e assim ambos saem felizes. Um photoshop para as relações também seria útil para a vida do faz de conta.
Você está cansado do seu companheiro (a), ela idem, mas por conveniência não se separam, já com o auxílio de tal ferramenta, a relação poderia ser transformada numa comédia romântica de Hollywood passada em NY. A vida sexual já gasta, saturada e sem tempero algum, ganharia traços de um romance do marques de Sade.
Filhos, a mesma coisa, pois aquele moleque mal-educado, ranhento e estúpido na escola, que você até hoje desconfia que não pode ser seu filho, se tornaria a versão da criança perfeita. Você poderia também se tornar a mãe “da hora”.
No meio de tanta tecnologia iludindo nosso cérebro, ainda não se inventou uma Inteligência Artificial para a alma, já que esta insiste em permanecer intacta. Clara e extremamente natural, nos mostrando que num mundo onde se julgam pessoas segundo a aparência, e ninguém segundo a essência, talvez seja esta a simples e direta resposta à nossa pergunta sobre qual a razão do mundo estar tão feio.