Quantas vezes na semana você lava sua garrafa d’água? Já parou para pensar no que pode acontecer se ela ficar dias sem ser lavada?
Usar a garrafinha todos os dias sem higienizar corretamente pode levar a um acúmulo de bactérias lá dentro. Esses microrganismos então se aproveitam da água e da temperatura ambiente para se multiplicar.
O Guia de Compras conversou com profissionais de saúde para entender como isso acontece e qual é a melhor forma de lavar as garrafinhas.
Segundo os especialistas, isso não é lá tão perigoso se sua imunidade é boa e se a garrafa não é compartilhada com outras pessoas, mas pode ser uma potencial causa de doenças mais graves para pessoas com deficiência imunológica.
De onde vêm as bactérias?
Elas não “vêm” de algum lugar. Na verdade, elas já estão na nossa boca e no ar. Mas, normalmente, elas vivem em equilíbrio no nosso organismo, controladas pelo nosso sistema imunológico. A água, combinada com a temperatura ambiente, fornece um meio propício para que esses microrganismos se multipliquem.
“Existem alguns momentos em que a quantidade dessas bactérias pode aumentar, provocando um desequilíbrio e causando infecções”, diz Tarcísio Carvalho, biomédico, professor da Faculdade Integrada Brasil Amazônia e autor de pesquisa sobre análise microbiológica em garrafas de água.
“Para a maioria das pessoas que é imunocompetente, isso não vai ser um grande problema. No máximo vai causar uma afta”, explica o pesquisador. “O problema é com crianças, pessoas idosas e pessoas com o sistema imunológico comprometido. Aí pode causar uma infecção mais grave”.
Lavar todos os dias
Sim, o ideal é lavar a garrafinha todo dia para evitar o acúmulo de bactérias, especialmente se o dia estiver quente e se você não é o único que usa o acessório.
“Se a garrafa é de uso individual, não tem tanto essa necessidade; você vai lavar quando perceber que está suja. Mas, quando é compartilhada, deve ser lavada depois de usar”, diz Kléber Luz, infectologista e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia.
Luz também alerta quanto a sujeiras próximas à tampa ou à boca da garrafa: “Se você está na academia e deixa o acessório deitado no chão ou num sofá, vai ficar sujo e deve ser lavado. Isso também vale para quando pegamos a garrafa sem lavar a mão”, explica o médico.
Outra questão é que, se o recipiente ficar sem lavar por muito tempo, pode ficar mais difícil remover os microrganismos depois.
Se, por exemplo, você já deixou um recipiente com líquido parado por alguns dias e depois passou a mão dentro, deve ter tido a impressão de que estava liso, como se houvesse um tipo de “lodo” ali. Esse é o chamado biofilme bacteriano.
“São bactérias que se multiplicaram e formaram essa camada para se proteger. Por isso, aquilo é mais resistente à limpeza”, conta Tarcísio Carvalho. “Um exemplo é o tártaro nos dentes: é um biofilme criado pelas bactérias e, muitas vezes, só dá para tirar fazendo uma raspagem no dentista”.
Não beba o “restinho de ontem”: as bactérias usam o meio aquoso para se multiplicarem, portanto é melhor jogar fora aquela água que você não terminou de beber no dia anterior.
“Não se deve guardar a água de um dia para o outro. Se você não lava a garrafa todos os dias, o mínimo que deve fazer é jogar fora o que sobrou”, afirma Kléber Luz.
“As bactérias se multiplicam a uma taxa de 20 a 30 minutos. Ou seja, a cada 20 minutos, uma bactéria vira duas”, conta Tarcísio Carvalho. “Se a pessoa deixa a garrafa com água ao longo de um dia inteiro, aquela quantidade de bactérias, que já costuma ser grande, estará imensamente maior”.
Mas e se a garrafa for térmica?
Se uma garrafa ou copo térmico consegue conservar a temperatura da água por mais tempo, então é mais “seguro” do que um recipiente comum?
“Em comparação a um material que não for térmico, as chances das bactérias se multiplicarem ali dentro vão ser menores”, responde Carvalho.
“Mas isso vai depender da temperatura do líquido, já que ele vai chegar à temperatura ambiente em algum momento. Quanto mais refrigerado estiver na hora em que for armazenado – inclusive se forem colocados cubos de gelo junto –, mais interessante é o grau de proteção”, completa ele.
Como lavar
Você pode usar água e detergente neutro para fazer a lavagem diária, segundo os especialistas e as fabricantes Pacco e Stanley.
Carvalho avisa ainda que é importante utilizar algum tipo de instrumento que alcance o fundo da garrafa, como, por exemplo, uma escova de dentes. “Apenas chacoalhar não remove microrganismos aderidos ao fundo”, alerta.
Para o pesquisador, é interessante também realizar uma limpeza profunda pelo menos uma vez por semana. “Para isso, você pode usar 8 ml (uma colher de sopa cheia) de água sanitária para cada litro de água potável e limpar com essa mistura”, ensina Carvalho.
A Pacco, no entanto, alerta contra o uso de água sanitária por diminuir a vida útil do produto. “O cloro é um forte agente oxidante, podendo causar manchas. Dependendo da concentração e tempo de exposição, pode até causar a corrosão, mesmo em aço inox de alta qualidade”, diz a marca, em nota.
No lugar da água sanitária, ambas as fabricantes Pacco e Stanley sugerem diluir uma parte de bicarbonato de sódio em uma parte de água morna. “Recomendamos deixar a mistura de molho por até uma hora. Após enxaguar, limpe com detergente neutro”, indica, em nota, a Stanley.
Para o infectologista Kléber Luz, fazer uso dessas receitas não é prejudicial à saúde, mas não é estritamente necessário. “Se você enxágua depois, não faz mal, mas não há necessidade. Água e detergente resolvem tudo”, opina o médico.
“É importante ter em mente que todas as peças que compõem o produto devem ser regularmente higienizadas, como tampas, rolhas, canudos, alças, assim como o corpo metálico”, acrescenta a Stanley.
Mito ou verdade: usar água quente em garrafa de plástico é perigoso?
“É uma verdade parcial”, diz Felipe Coimbra, oncologista líder do Centro de Referência em Tumores do Aparelho Digestivo Alto do A.C. Camargo Cancer Center. “A preocupação com o uso de água quente em garrafas de plástico está relacionada à possibilidade de liberação de substâncias químicas como o bisfenol A (BPA) e os ftalatos”.
Essas substâncias são conhecidas por interferirem no sistema endócrino humano e causarem efeitos adversos, incluindo o potencial risco de desenvolvimento de câncer. O BPA é usado em policarbonatos (plásticos resistentes) e resinas epóxi e os ftalatos são usados para tornar o material PVC macio e flexível.
Ambos são considerados disruptores endócrinos – ou seja, mexem com o equilíbrio hormonal do corpo – e têm sido associados a vários problemas de saúde.
“Contudo, a quantidade liberada em condições normais de uso – como lavar uma garrafa com água quente ocasionalmente – pode não ser suficiente para causar danos significativos à saúde”, explica o médico.
“Mas a cautela é aconselhada”, enfatiza Coimbra. O oncologista faz algumas recomendações para usar e lavar os recipientes de plástico com segurança:
Preferir garrafas livres de BPA e ftalatos. Confira sempre se existe algum selo ou aviso nas especificações do produto ou evite comprar caso isso não seja mencionado.
Evitar exposição prolongada ao calor, como deixar a garrafa em um carro quente ou usar água muito quente para limpeza.
Considerar alternativas mais seguras, como garrafas de vidro ou aço inoxidável, especialmente para uso contínuo e armazenamento de líquidos quentes.
G1