O laudo pericial da morte da enfermeira Géssica Melo de Oliveira, de 32 anos, durante uma perseguição policial em dezembro do ano passado, na BR-317, interior do Acre, aponta que a vítima não havia consumido drogas e nem tinha tocado na arma que foi achada próximo ao carro dela.
No documento, enviado ao Ministério Público do Acre (MP-AC), na semana passada, a perícia detalhou em 62 páginas todos os elementos que analisou durante esses meses de trabalho. Entre eles, que a arma achada no matagal perto do carro de Géssica não tinha o DNA da enfermeira e sim traços genéticos masculinos, tanto na estrutura da arma, como no carregador e munições.
No dia 2 de dezembro de 2023, Géssica furou um bloqueio policial em Capixaba, foi seguida por uma viatura da Polícia Militar, que pediu reforço ao Grupo Especial de Fronteira (Gefron) e a Polícia Rodoviária Federal (PRF-AC), até a cidade de Senador Guiomard, onde terminou a perseguição, com a enfermeira morta com tiro de fuzil.
Os sargentos da Polícia Militar (PM-AC) Gleyson Costa de Souza e Cleonizio Marques Vilas Boas, que estavam na equipe policial no dia da morte de Géssica, foram presos em flagrante ao se apresentarem no comando da PM.
Investigação do MP-AC
O Ministério Público instaurou um inquérito para apurar possível crime de homicídio doloso praticado, em tese, por policiais militares, no exercício da função. Conforme o órgão, foi apurado que, até o momento do acompanhamento da vítima, feito por policiais militares pela estrada, não teria havido “excessos”.
No entanto, após a entrada de militares do Gefron, segundo o MP-AC, iniciou-se “uma conduta aparentemente inapropriada, descabida e excessiva por parte desses militares (com disparos de armas de fogo aparentemente de grosso calibre em direção ao veículo da vítima, que culminou com o óbito dela).”
Conforme o órgão, há indícios de que houve tentativa de “mudar a cena do crime”, com a inserção de uma arma de fogo, do tipo pistola, por parte dos autores dos disparos que vitimaram Géssica, alegando-se pertencer a ela, na “aparente tentativa de crime um álibi de legítima defesa.”
O MP destaca que testemunhas e familiares da vítima ouvidos durante a apuração comprovaram que Géssica não possuía arma de fogo, não sabia manusear arma de fogo e era totalmente contra o uso de arma de fogo. Além disso, a enfermeira, segundo as testemunhas, não fazia uso de drogas ilícitas, apenas possuía transtornos psicológicos e/ou mentais, inclusive com acompanhamento em uma URAP por algum período de tempo.
Laudo pericial
No laudo, o perito Aleksandr Lira Barros detalhou os tiros encontrados no carro de Géssica e pontuou que não foram encontrados quaisquer sinais de projéteis de arma de fogo que teriam partido de dentro para fora do veículo.
Na época, os militares envolvidos na ação alegaram que tinham visto uma arma na mão de Géssica e, por isso, teriam atirado contra o carro. Uma arma também foi encontrada perto do carro da enfermeira, mas a perícia entendeu que os exames deram negativo para traços de DNA de Géssica na arma, sendo positivo para presença de traços genéticos masculinos.
“Aponta o perito que a arma em questão (pistola 9mm) foi inserida no local em momento recente e anterior a realização dos exames periciais. Géssica não poderia ter tido contato com a arma de fogo pistola encontrada no local pelo perito quando dos exames periciais, sem impregnar a mesma com seu material genético, seja ele pele, seja suor e muito menos sangue, dada extensão e local dos seus ferimentos, sendo necessário para este feito a utilização de elementos que isolassem o armamento impedindo a impregnação do material genético quando do manuseio da arma”, pontua o laudo.
Ainda conforme o laudo, não houve capotamento e tampouco danos no assoalho que produzissem buracos no veículo.
Os exames laboratoriais de alcoolemia e toxicologia produzidos pelo Instituto de Análises Forenses apontaram negativo para a presença de álcool etílico, cocaína, tetrahidrocanabiniol, anfetamina ou metanfetamina no corpo da vítima Géssica quando da realização dos exames cadavéricos.