Paris foi libertada da dominação nazista em 25 de agosto de 1944. O que poucos sabem é que a data é – ou pelo menos, deveria ser – tão importante para os acreanos quanto é para os franceses, porém, não pelo mesmo motivo. É que no mesmíssimo dia, uma sexta-feira, nascia na floresta amazônica algo que levaria comunicação a todos: a Rádio Difusora Acreana, a “Voz das Selvas”, que, assim como a libertação da capital da França, completou 80 anos em 2024.
Em um tempo que parece longínquo, mas não tão distante no que diz respeito à própria História, era pela emissora que muitos mandavam mensagens aos parentes distantes. Os acreanos sequer pensavam que, em menos de 100 anos, as conversas estariam literalmente nas palmas das mãos, mas, em 1944, ainda era necessário dar notícias pelas ondas radiofônicas. Todos os dias, cartas e mais cartas com as mais diversas declarações chegavam, e quem desempenhava a função de “carteiro” à época era a Difusora.
De acordo com o servidor público José Costa, responsável pelo o que hoje é o museu da rádio, a existência da emissora era extremamente importante, vez que fazia o elo entre zona rural e cidade. Era em um tempo, afinal de contas, que não existia comunicação nos ramais. “As pessoas vinham de Sena Madureira andando, no inverno, justamente para este serviço de mensagem. Já recebemos mais de 30 pessoas em um mesmo dia”. A explicação é digna, vez que, nas décadas de 1940 e 1950, a rádio era o maior – para não dizer único – meio de comunicação existente no Acre.
E quem pensa que esse serviço acabou se engana. A pedagoga Luana Silva, moradora da Estrada Transacreana e que, em 2014, atuava em uma escola rural, usava os serviços da rádio.
”Até hoje é ‘sagrado’ nos seringais que não têm acesso à internet o envio de mensagens pela Difusora. A notícia ainda é pelo ‘rádiozinho’. Era assim que, até bem bem pouco tempo, meus alunos recebiam informações sobre a escola, caso houvesse alguma intercorrência, por exemplo”, explicou.
Veja algumas imagens do museu da Difusora:
Revitalização
Na última terça-feira, 22, o governador do Acre, Gladson Cameli, entregou a sede da Difusora Acreana completamente revitalizada, aumentando a autoestima dos servidores daquela que é a emissora radiofônica mais antiga do Estado. A obra contou com investimentos que somam R$ 850.630, sendo R$ 250 mil destinados pela deputada federal Socorro Neri e, R$ 600 mil, de emendas da então senadora Mailza Assis. Ainda hoje, as ondas chegam a mais de 700 comunidades de difícil acesso.
A jornalista Célis Fabrícia diz que é uma honra fazer parte deste momento do jornalismo acreano. “Estou feliz por duas histórias: a minha, por completar 20 anos de Sistema Público de Comunicação; e a da Difusora, que completa 80 anos. É algo excepcional”, reforçou, durante uma pausa do programa Gente em Debate, transmitido ao vivo.
O também jornalista Damião Viana reiterou que é uma vitória para toda a sociedade. “Algo que não tem preço: fazer parte disto, dos 80 anos, é gratificante”, reforçou. Damião é um dos talentos que surgiram na rádio, já que começou a trabalhar no local como office boy. A voz grave e de radialista, no entanto, não passou desapercebida e, hoje, Damião Viana compõe o grupo de servidores.
O diretor da Rádio Difusora, Raimundo Fernandes, relembrou que emissora fez surgir uma geração de locutores, cantores e jornalistas, além de enaltecer atletas acreanos. “E, agora, fomos premiados com esta revitalização: temos um estúdio de excelência, um museu com um acervo maravilhoso. Foi um presente do governador [Gladson Cameli], por meio da secretária [de Estado de Comunicação] Nayara Lessa. Viva a Difusora, 80 anos de existência!”.
A secretária de Estado de Comunicação, Nayara Lessa, fez uma bonita fala durante a entrega da sede. Para a jornalista, a Difusora é como uma grande mãe para todas as outras emissoras, e este é um presente para todos. “Porque é uma rádio que há tantos anos nunca saiu do ar e continua cumprindo o seu papel democrático diante da sociedade. É só orgulho e alegria de poder fazer parte desse momento histórico da comunicação pública”.
Já Gladson Cameli, também no dia de entrega da revitalização, disse que ‘passou um filme na cabeça até chegar esta hora’. “Principalmente olhando para esse lugar tão bonito, organizado, com equipamentos modernos e excelentes condições de trabalho para os seus servidores”, reiterou.
O estado conta, atualmente, com outras emissoras de rádio, televisão, sites, todos com excelência no trabalho. Mas há de se reverenciar a nossa primeira. Toda história tem um começo, e enquanto Paris renascia na liberdade, a Difusora chegava aos lugares mais distantes, sendo ouvida por ribeirinhos, pescadores, pessoas do campo. Talvez a “Voz das Selvas” não seja tão conhecida quanto a Torre Eiffel, mas, com certeza, tem a mesma importância: afinal, nem todo acreano consegue ir a Paris, mas todo acreano pode ouvir, se emocionar e se reencontrar na Rádio Difusora.