Eu ia começar dizendo que de minha alegria ao me dar conta de que o primeiro compromisso do primeiro dia útil de meu 2025 tenha sido escrever esse texto. Mas é mentira. Não porque não me alegre, claro que me alegra. Escrever é o que eu mais gosto de fazer na vida e escrever aqui tem sido cada vez melhor. É mentira porque desde a meia noite e 1 do dia 1 de janeiro, cada minuto tem me sido útil.
Esse é um tema que me intriga, a ideia de que há uma vida útil das 8h às 6h da tarde e uma outra que se dá nas horas em que não estamos trabalhando. Seria o que essa outra? Uma vida inútil? Mais ainda, seria o que isso que a gente chama de trabalho? Numa das últimas sessões do ano passado, conversávamos sobre trabalho meu analisando e eu? Trabalho é a própria vida, não é? O mergulho psicanalítico deste analisando, por exemplo, e dos outros todos, é um trabalho, da maior importância inclusive. Cultivar amizades é um trabalho, cultivar os amores, o corpo. Até dormir é trabalho.
Ah, mas aí a vida soa muito trabalhosa, sacrificada. Não? Não, não mesmo. Ou sim, talvez sim também. A discussão é precisamente essa: a da hierarquização do que a gente chama de trabalho e do que a gente chama de vida. O que nos faz colocá-los (os trabalhos todos) em ordem diferente de prioridade. Melhor, o que nos faz colocá-los em gavetas diferentes, chamá-los por outro nome? Dizer que um é vida pessoal e outro não. É tudo vida, minha gente.
Ouvi tantas coisas sobre como se prepararam os analisandos para a virada de ano: “quero estar bem bonita quando der meia noite”, “quero passar perto do mar”, “quero passar com fulana”, “vou vestir azul porque quero ter saúde”. Eu acho tudo tão bonito. Esse parar para pensar o querer. E ao mesmo tempo me vem um desejo louco de dizer, pois vá pro mar, se embeleze, ligue pra fulana, cuide de sua saúde, use o vestido branco, pois vá, vá mesmo, vá trabalhar o querer. Não no sentido da Xuxa “querer, poder e conseguir”, a vida é mais complexa do que isso, a gente sabe. Mas no sentido do trabalho. Trabalhemos. O Maurício Pereira tem uma música tão bonita, chama-se Um dia útil. Minha parte favorita é quando ele diz “e amanhã é mais um grande dia, um dia comum de muito trabalho, um dia grande que nem um diamante”. Todo dia um diamante. Feliz ano novo, queridos. Tomara que brilhe.