No mundo em que mais de 1 bilhão de pessoas já ultrapassaram os 60 anos e, no Brasil com 32 milhões de homens e mulheres acima dessa idade, pensar em uma vida longeva com qualidade passou a ser prioridade. Uma equipe de cientistas europeus acaba de publicar um estudo em que alerta o quanto é urgente adotar políticas públicas que programem a velhice e previnam as doenças “típicas” dessa faixa etária, além da emergência nas mudanças de hábitos, incluindo alimentação saudável, exercícios físicos e redução de situações de estresse. Artistas, como o multi-instrumentista Hermeto Pascoal, de 89 anos, provam isso ao deixar que a sensibilidade e a leveza os guiem. De forma semelhante, age Dona Onete, de 86 anos, que sugere abandonar os maus pensamentos para viver bem.
Porém, os cientistas preferem ir pela razão. A programação para um envelhecimento com qualidade de vida e a prevenção também são as premissas defendidas pelos profissionais de distintas áreas da saúde que lidam com idosos. O Correio ouviu médicos, fisioterapeutas e psicólogos que atuam diretamente com pessoas acima dos 60 anos. Todos foram unânimes na defesa da adoção de medidas de políticas públicas para o tema e das alterações cotidianas para a longevidade. Recomendações que os cientistas europeus ratificaram no estudo recém-publicado.
Publicado na revista científica Agim, o estudo “Repensando os cuidados de saúde por meio da biologia do envelhecimento” envolveu pesquisadores do Instituto Europeu de Pesquisa para Biologia do Envelhecimento (ERIBA), da Universidade Médica de Groningen (UMCG) e da Universidade de Groningen (RUG). A proposta é adotar medidas preventivas, por meio da biologia do envelhecimento, e assim, estender a expectativa de vida, garantindo saúde às pessoas e menos despesas aos cofres públicos com atendimentos e tratamentos para quem sofre de comorbidades “preveníveis”.
Batalha
Para o pesquisador Marco Demaria, do Instituto Europeu de Pesquisa para Biologia do Envelhecimento (ERIBA), primeiro autor do estudo, trata-se de uma batalha em que é preciso “atacar” o processo biológico do envelhecimento, prevenindo as doenças crônicas e, paralelamente, colocando em prática políticas de atendimento à saúde que corroborem com esse esforço. Segundo ele, ao incentivar essas mudanças, casos de câncer, doenças cardíacas e diabetes tipo 2 diminuirão.
De acordo com o cientista, os cuidados para o envelhecer bem passam por três pilares: identificar eventuais problemas de saúde e tratá-los; utilizar novas ferramentas de prevenção, como senolíticos (medicamentos que eliminam células envelhecidas e danificadas que podem contribuir para o envelhecimento e doenças relacionadas) e células senescentes prejudiciais, e rapalogs (medicamentos preventivos de doenças relacionadas ao envelhecimento que regulam o metabolismo celular e previnem futuros problemas), além de mudanças de estilo de vida e adoção de políticas públicas efetivas.
No estudo, os pesquisadores observaram que as queixas mais comuns entre os idosos passam por doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2, osteoartrite, neurodegeneração e câncer. Também há a chamada “polifarmácia” , que é o uso de múltiplos medicamentos para tratar doenças coexistentes que acabam causando complicações adicionais, como efeitos colaterais e aumento de hospitalizações. “A prevenção de danos relacionados ao envelhecimento exige uma mudança sistêmica em direção à pesquisa preditiva e preventiva, com ênfase em dados multiômicos, intervenções no estilo de vida e intervenções no início da vida”, ressaltou Demaria.
Prevenção
No estudo e na prática, pesquisadores e profissionais de saúde defendem que a prevenção é fundamental para assegurar um envelhecimento com qualidade. São escolhas cotidianas que mudam a perspectiva futura, ressaltam os cientistas e os médicos, fisioterapeutas e psicólogos, como a adoção de exercícios físicos, alimentação saudável, sono de qualidade e redução do estresse.
Para Marco Túlio Cintra, médico, presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG) e professor adjunto do Departamento de Clínica Médica da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o processo vai além das escolhas individuais, é preciso adotar políticas públicas urgentes. “Temos de mudar muito a realidade brasileira”, ressaltou. “(É preciso) modificar com mais mobilidade, mais acesso à educação e à saúde, melhoria de diagnóstico precoce, fora os próprios idosos que precisam ter mais oportunidade para viverem ativos.”
A psicóloga Marcelle Passarinho Maia, coordenadora da Psicologia do Hospital Anchieta Ceilândia, acrescentou que a atenção com o envelhecimento deve começar muito antes da idade madura. “É recomendável que a reflexão comece na juventude, mas, idealmente, deve se intensificar na meia-idade. A partir dos 40 anos, é preciso ter mais consciência dos riscos de saúde associados ao envelhecimento e buscar implementar mudanças em seus estilos de vida”, reiterou.
Priscilla Mussi, geriatra e coordenadora de Geriatria do Hospital Santa Lúcia, de Brasília, e do programa Cuidar Idoso, relembrou a sabedoria popular para ratificar a urgência desses cuidados. “É aquele velho ditado ‘a gente colhe o que planta’. Se você fizer atividade física, alimentar bem, controlar o estresse, ter um bom propósito de vida e dormir bem, a chance de alcançar 90-100 anos com qualidade é muito alta. Meus pacientes centenários dizem que o maior segredo é não ficar parado física, mental e emocionalmente.”
Hudson Azevedo Pinheiro, presidente de Gerontologia da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG) seção DF, fisioterapeuta especialista em gerontologia com doutorado em ciências e tecnologias em saúde pela Universidade de Brasília (UnB), ressalta: “Desde o nascimento, a gente envelhece. Então o processo de envelhecimento é dinâmico, acontece desde o momento que a gente é concebido porque vão acontecendo essas mudanças. Os comportamentos sedentários, como muito tempo em tela. É preciso prestar atenção sobre casos de família, como as situações de hipertensão e diabetes. Então, bons hábitos.”
Por Correio Braziliense