À medida que as mudanças climáticas aumentam as temperaturas globais, mais seres vivos são afetados. No caso das tartarugas marinhas, por exemplo, a areia cada vez mais quente, diminui a sobrevivência dos filhotes, atrapalha o crescimento deles, aumenta as chances de deformidades físicas e até influencia no sexo dos répteis.
Pesquisadores norte-americanos investigaram se o clima mais quente também afeta a capacidade cognitiva dos répteis. O estudo foi liderado por cientistas da Universidade Atlântica da Flórida (FAU), nos Estados Unidos, e publicado na revista científica Endangered Species Research em setembro.
A pesquisa é pioneira em tentar entender se a temperatura de incubação afeta a inteligência dos filhotes de tartaruga-cabeçuda (Caretta caretta). Outros estudos já haviam revelado que o calor exacerbado antes do nascimento atrapalhava a proporção sexual, produzindo mais fêmeas do que machos.
Avaliação da inteligência das tartarugas
Para avaliar o novo quesito, os pesquisadores coletaram ovos em praias com ninhos para abrigo e reprodução de tartarugas no Condado de Palm Beach, na Flórida, entre 2019 e 2020. Em seguida, eles foram incubados em laboratório em duas temperaturas: 31°C e 33ºC. A primeira é considerada ideal para a eclosão dos ovos, a segunda, mais alta, porém ainda não tão prejudicial.
Um mês após o nascimento, era a hora de testar a inteligência dos filhotes. Utilizando um labirinto em formato de Y, os pesquisadores treinaram as tartarugas para associar uma recompensa alimentar a padrões específicos, como listras ou alvos presentes nas pontas do labirinto.
Na sequência, tudo mudou e as tartarugas entraram no treinamento de reversão. Ao invés de ganharem petiscos ao se posicionarem nas listras ou em alvos, a recompensa vinha quando elas estavam em outros lugares do labirinto.
Além da capacidade cognitiva, as tarefas mediam a adaptação comportamental dos filhotes a novas informações, fator que pode ser importante na sobrevivência em ambientes dinâmicos como os oceanos.

Para a surpresa dos avaliadores, não foram identificadas diferenças significativas no desempenho dos dois grupos. Nos dois anos de estudo, as tartarugas cumpriram os treinamentos com perfeição, sendo que em 2020, a performance na fase de reversão foi até melhor.
“Os filhotes pós-eclosão não só foram capazes de suprimir comportamentos previamente aprendidos para formar novas associações mais vantajosas, como também conseguiram fazê-lo com uma velocidade notável — muitas vezes exigindo menos tentativas do que a fase inicial de aprendizagem”, destaca uma das autoras do artigo, Sarah L. Milton, professora da FAU, em comunicado.
De acordo com Sarah, os resultados mostram que os filhotes de tartarugas estão mais preparados para os desafios ambientais atuais do que se imaginava. “Tal adaptabilidade pode ser crucial para sua sobrevivência em um mundo cada vez mais imprevisível”, diz a pesquisadora.
Eclosão e deformações
Apesar da notícia animadora, nem todas as descobertas foram positivas. Filhotes colocados a 33ºC tiveram períodos de incubação mais curtos, menor sucesso de eclosão dos ovos, crescimento mais lento e mais anomalias presentes no casco. Também foi identificado que os filhotes eram menores, fator que poderia prejudicar a sobrevivência na natureza.
“A preocupação continua muito real. Temperaturas elevadas de incubação são conhecidas por produzir filhotes menores e menos resistentes fisicamente, além de causar um declínio significativo no sucesso geral da eclosão.
Juntos, esses fatores podem representar sérios riscos à sobrevivência da população”, ressalta a autora principal do estudo, Ivana J. Lezcano, professora da FAU.
Os pesquisadores lembram que as temperaturas testadas durante o estudo não prejudicam gravemente o sucesso de eclosão dos ovos. Contudo, outras praias norte-americanas já registraram temperaturas acima de 34ºC, que impactam muito esse processo.

A equipe defende a adoção de medidas para a conservação das tartarugas, visto que são animais diretamente dependentes das condições térmicas de seus ninhos.
“Os esforços de conservação devem priorizar não apenas a preservação das populações de filhotes, mas também as condições ambientais que sustentam seu desenvolvimento cognitivo e resiliência contínuos”, finaliza Ivana.
Por: Metrópoles