O cérebro humano não segue um roteiro linear de desenvolvimento. Sua estrutura muda, se adapta e se reorganiza ao longo de toda a vida e, agora, cientistas identificaram quatro idades marcantes em que essas transformações passam por viradas significativas: aos 9, 32, 66 e 83 anos. A descoberta foi publicada nesta terça-feira (25) na revista Nature Communications.
Segundo o estudo, tais idades funcionam como “pontos de inflexão” em processos cerebrais que moldam desde a capacidade de aprendizado até o risco de declínio cognitivo. Pesquisas anteriores já tivessem identificado mudanças aceleradas de envelhecimento físico em torno dos 40, 60 e 80 anos, mas a complexidade da organização neural tornava mais difícil mapear o mesmo tipo de curva no cérebro.
Agora, com base em uma análise inédita de mais de 4 mil exames de neuroimagem, os pesquisadores da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, e da Universidade de Pittsburgh, nos EUA, conseguiram traçar pela primeira vez as cinco fases de reorganização topológica – termo que descreve como as conexões entre neurônios se estruturam e se comunicam. Entenda, abaixo, cada uma delas:
Fase 1 – do nascimento aos 9 anos
A primeira infância é marcada por um cenário surpreendente, no qual as conexões de substância branca (fibras que carregam informações entre regiões cerebrais) ficam mais longas e sinuosas, tornando o trânsito de informações menos eficiente. “Leva mais tempo para a informação passar entre as regiões”, explica Alexa Mousley, líder do projeto à revista NewScientist.
Isso acontece porque o cérebro do bebê está repleto de conexões ainda não selecionadas. À medida que a criança cresce, experiências e estímulos promovem a poda sináptica, eliminando ligações pouco usadas e consolidando as essenciais. Nesse processo, o cérebro prioriza abrir um leque amplo de possibilidades, mesmo que isso exija mais energia.
Fase 2 – dos 9 aos 32 anos
A partir dos nove anos, e especialmente com a chegada da puberdade, o padrão muda completamente. As conexões começam a se encurtar, tornando o cérebro mais eficiente e permitindo que a informação circule mais rapidamente. Essa reorganização favorece habilidades cruciais na adolescência e juventude. Isso inclui, por exemplo, planejamento, tomada de decisões, memória de trabalho e desempenho cognitivo geral.
“De repente, o cérebro aumenta a eficiência das conexões. A informação chega de um lugar para outro mais rapidamente”, aponta Mousley. Este período marca o auge do funcionamento neural, culminando por volta dos 30 anos.
Fase 3 – dos 32 aos 66 anos
A fase mais longa identificada pelo estudo vai do início dos 30 até meados dos 60 anos. Aqui, embora o cérebro continue mudando, a transformação se dá de forma muito mais gradual pela maturidade biológica.
Segundo Mousley, as conexões começam a perder eficiência novamente. O motivo ainda é incerto, mas os pesquisadores citam hipóteses, como desgaste natural do organismo, rotina mais estável e mudanças no estilo de vida (criar filhos, trabalhar em ritmo intenso ou lidar com estresse crônico).
Fase 4 – dos 66 aos 83 anos
Ao entrar na terceira idade, o cérebro passa a manter conexões mais estáveis dentro de cada região. Porém, contatou-se que as ligações entre áreas também começam a se enfraquecer.
Esse padrão coincide com o aumento do risco de demência e outras doenças relacionadas ao envelhecimento. A queda na comunicação entre regiões pode explicar por que funções complexas, como atenção dividida ou processamento rápido, tendem a declinar após os 65 anos.
Fase 5 – dos 83 aos 90 anos
Na última fase identificada, as conexões entre áreas diferentes se tornam mais fracas e passam a depender cada vez mais de hubs. Essas regiões estratégicas do cérebro servem como centros de comunicação. Isso sugere, segundo Mousley, que o cérebro idoso dispõe de menos recursos estruturais e precisa otimizar o que lhes resta.
Implicações da descoberta
O estudo ajuda a explicar fenômenos amplamente documentados, como o porquê de os transtornos de saúde mental geralmente aparecerem antes dos 25 anos e como o risco de demência cresce rapidamente após os 65 anos.
“É importante entender os pontos de inflexão normais da estrutura cerebral para que possamos identificar desvios em casos de doenças neurodegenerativas ou distúrbios mentais”, afirmou Rubia à NewScientist. A compreensão desses padrões pode, no futuro, orientar terapias, políticas públicas e tratamentos para preservar a saúde cognitiva.
Apesar de abrangente, o estudo analisou majoritariamente pessoas brancas do Reino Unido e dos EUA. Dessa maneira, os autores enfatizam que os resultados precisam ser testados em grupos mais diversos para verificar se os pontos de inflexão são universais ou influenciados por fatores sociais, genéticos e ambientais. Ainda assim, a equipe considera a descoberta um marco na compreensão do desenvolvimento humano.
Por: Revista Galileu








